18 de outubro de 2024

Perspectivas e desafios da alfabetização científica em Manaus

Em conversa com o professor Jonas Araújo Pereira Júnior da Secretaria Municipal de Educação de Manaus (SEMED), Licenciado em História pela Universidade Federal do Amazonas (UFA), Especialista em Ética e Política pelo Sares/Unicap, Cientista na Escola da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (FAPEAM), sobre os desafios da alfabetização científica em Manaus, ele me escreveu dizendo, como segue o seu texto na integra:

“O ano de 2020 foi desafiador em vários aspectos da vida, na educação não foi diferente, tivemos de nos adaptar a um ensino remoto que marginalizou muitos estudantes e depois a um ensino híbrido que não conseguiu estabelecer uma relação pedagógica capaz de responder aos desafios desse período. Em meio a tantas incertezas criadas pelos efeitos da pandemia em uma cidade onde o poder público não seguiu à risca as orientações dos epidemiologistas do INPA foi que aprovei junto ao Programa Ciência na Escola (PCE) da FAPEAM um projeto de alfabetização científica com o título “Patrimônio Cultural: Encontro das águas”.

O projeto foi planejado para ocorrer de maneira presencial, na época em que submeti não contava com o efeito da pandemia, dito isso, ao sair a publicação com a aprovação foi necessária uma adaptação. Lembro que o primeiro desafio foi estabelecer um critério de seleção de estudantes bolsistas. Para quem não conhece, o PCE é um programa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas que disponibiliza bolsas de estudo para o professor que submeteu a proposta e para mais 3 estudantes da educação básica. Foi então que ativei a pedagoga Fernanda Farias e a gestora Mariana Tavares, da EMEF Francisco Nunes da Silva, para que juntos pudéssemos selecionar estudantes que tivessem disposição para a pesquisa e estrutura adequada em suas residências para o trabalho remoto. 

Esse desafio trouxe à tona o quanto a desigualdade social se torna um limitante no processo de inserção de estudantes de baixa renda nos mais variados processos de ensino aprendizagem. Por isso, ao formar a equipe, nosso primeiro diálogo foi uma roda de conversa sobre o papel da “alfabetização científica” na educação básica. Nesse diálogo falamos de uma aula incrível que tive com Áttico Chassot, uma das grandes referências no tema, e que conversando com professores pesquisadores de Manaus falava que a alfabetização científica é a linguagem da ciência e seu principal papel é fazer entendermos o mundo à nossa volta. Em seguida, joguei a provocação: “Do que adianta uma ciência acrítica? Como devemos enxergar a produção científica que não analisa os impactos de suas criações?”. 

Aquela provocação gerou uma troca de olhares entre os estudantes, um certo ar de cumplicidade pairou no ambiente, de repente um bolsista responde com uma outra questão: “O senhor está dizendo que existe ciência ruim?”. Recebi a pergunta com um sorriso enigmático e comentei que conhecer a ciência é conhecer a história da desigualdade em nossa sociedade, dizer se ela é boa ou ruim vai depender do ângulo que você enxerga. Pelas expressões estampadas em cada olhar ficou perceptível que uma série de conexões fervilhavam nas mentes a minha frente, continuei o diálogo usando como exemplo o nosso objeto de estudo, o tombamento do encontro das águas, foi aprovado pelo IPHAN em novembro de 2010, contudo, por uma série de recursos judiciais, interesses políticos e econômicos até hoje não foi homologado. 

Assim iniciamos nossa jornada, buscando a partir do olhar atento de estudantes do ensino fundamental, desvendar os motivos que levaram o poder público brasileiro a não homologar o tombamento do maior encontro de águas doces do Brasil. Foi uma largada cheia de desafios, mas ficou leve com a parceria do instituto Soka Amazônia, do Prof. Dr. Ademir Ramos, da Profª Ayene Nobre e do Profº Maurício Braga. Em 2021 estamos planejando uma nova etapa que já conta com a disponibilidade da Prof. Drª. Eglê Wanzeler do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Experiências Transdisciplinares em educação – LEPETE/UEA, mas esse é um assunto para uma próxima conversa”. Vamos refletir sobre isto?

Luís Lemos

É filósofo, professor universitário e escritor, autor, entre outras obras, de "Filhos da Quarentena: A esperança de viver novamente", Editora Viseu, 2021.

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