19 de setembro de 2024

Quem não se comunica…

audosista que sou dos bons programas de auditório dos anos 80, resolvi brevemente apropriar-me para coluna de hoje de uma frase dita e repetida pelo velho guerreiro, o comunicador Abelardo Barbosa Figueiredo carinhosamente chamado de Chacrinha, em seu semanal encontro com a audiência brasileira: “quem não se comunica se trumbica”. Falo portanto desta premissa importantíssima para o mundo globalizado em que vivemos, qual seja, a comunicação.

Como mencionado em nosso artigo da semana passada (Zona Franca de Maués), continuando com minha andança e pesquisa empírico-experimental, vivência direta acerca do objeto de estudo, doravante tratando deste importante tema que é a comunicação.

Partindo para vivenciar a realidade do interior, logo na chegada deparei-me com o infortúnio de não ter resolvido todas as minhas particulares e profissionais pendências antes de alçar voo para Maués, imaginando que ao chegar bastaria religar meu aparelho celular e entrar em contato com Manaus e o mundo através da internet, podendo assim dar andamento em reuniões online, conversas com clientes, receber e enviar documentos além de trivialidades como postagens em redes sociais e outros.  

Digo infortúnio pois logo ao desembarcar fui surpreendido com o fato de que as redes móveis daquela municipalidade são praticamente inexistentes, não que não haja operadoras presentes, todas elas Tim, Vivo, Claro, Oi estão com seus negócios por ali, contudo, destas, em minha particular experiência, somente duas operam com alguma cobertura, em horários e locais específicos, dificultando e muito os negócios e as comunicações de todos.  

Posso dizer que nesta experiência tive a oportunidade de voltar ao passado, na época em que não existia telefonia móvel ou mesmo internet pois os pontos fixos (via cabo) que encontrei são igualmente deficitários, para se ter uma ideia em um estabelecimento do comércio local o proprietário me passou a informação de que para poder funcionar com o mínimo de cobertura há em todas as suas lojas três provedores de internet diferentes e mesmo assim o serviço não funciona a contento.

Dito comerciante é um dos exportadores locais de algumas matérias-primas, imagine-se então a dificuldade para fechar negócios com seus principais compradores, em sua maioria do mercado europeu e asiático,não bastasse as dificuldades locais com infraestrutura para beneficiamento e escoamento de produção, a própria venda não se realiza ou é realizada de maneira muito mais custosa em vista dos problemas de comunicação.

Não para por aí, se de um lado há dificuldade em vender, do lado do consumidor a história não é muito diferente, principalmente no que diz respeito à rede bancária, embora servida de agências próprias de bancos oficiais, Banco do Brasil e Caixa Econômica, além de outros como Itaú e Bradesco, todos da cidade já sabem que não é possível resolver qualquer assunto via remota e ironicamente a rede bancária se recusa a atender pessoalmente, quem vai a agência resolver suas pendências sai com a informação de que deve baixar o App do banco e resolver tudo online!! 

Conclusão disto, dinheiro não circula pela cidade, impossibilitados de sacar ou resolver qualquer outro assunto o que vi foram filas quilométricas em praticamente todas as agências, população se aglomerando para tentar resolver desde o mais simples assunto de conferência de saldo aos saques para fazer a economia girar.

O mais espantoso disto é a aparente resignação dos locais com tamanho descaso, conversando com pessoas aleatórias nas filas dos bancos, no comércio local, padarias e supermercados, vi e ouvi histórias que parecem absurdas demais para serem verdadeiras, em plena era da informática e dos avanços nas telecomunicações nossos irmãos do interior aparentemente estão alijados desta realidade.

Difícil crer no discurso de que temos que reforçar um modelo exportador de matérias-primas ou produtos beneficiados pelo modelo Zona Franca para se ter uma alternativa ao sistema vigente, amplamente concentrado na capital do Estado, quando o mínimo que se espera é que haja viabilidade nesta alternância, não somente da infraestrutura desejável para produção, beneficiamento e escoamento de produtos mas para que se possa minimamente alcançar os mercados consumidores por meio de um sistema de comunicação estável e decente.

Comecei o texto deste artigo falando do saudoso Chacrinha e com ele termino fazendo alusão a outra de suas famosas frases, bem propícia ao que ora tratamos, dizia ele ao final de cada programa: “Eu não vim para explicar, eu vim para confundir”. Ao que parece o sistema de comunicação móvel e de internet que encontrei nesta pequena experiência serve para exatamente isto, confundir. 

Da mesma maneira que a gerência dos bancos de Maués orientam seus clientes a resolver tudo online em uma cidade desprovida de rede de internet compatível com esta realidade, não se pode alardear a todo instante em que o atual modelo ZFM é atacado que se tem que procurar matrizes outras de suporte econômico se não há a menor possibilidade disso ocorrer sem que primeiro se façam investimentos maciços em coisas básicas como comunicação.   

Já fomos o único Estado brasileiro em seus tempos áureos com ligação direta a Europa por um cabo submarino a fim de justamente facilitar o comércio de nossa commodite mais conhecida, a borracha, de lá até hoje não é crível que tenhamos que viver somente de história e não viabilizar essa importante e quiçá fundamental estrutura para nossa Economia. O Amazonas é o nosso país.

Anderson Fonseca

Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM

Veja também

Pesquisar