Por Juarez Baldoino da Costa (*)
Com a invasão de seus territórios a partir de 1987 quando houve a detecção de minérios no local, foi iniciado o processo que culmina neste janeiro de 2023 com novas imagens divulgadas na mídia sobre o estado físico indigno e desumano em geral de sua população, imagens na verdade repetitivas para quem acompanha o assunto há décadas.
A Reserva Indígena Yanomami foi homologada em 1992 (Collor) com o que se imaginava proteger o território, mas não houve êxito.
Há quem divirja do motivo de sua criação, e considere que a reserva foi feita para proteger interesses sobre os minérios, e, portanto, se prevalecer esta tese, é forçoso concluir que teria sido então obra de acordo político entre exploradores e o Presidente da República.
Independentemente do motivo da homologação, em todos os governos desde Figueiredo, passando por Sarney, Collor, Itamar, 2 FHC, 2 Lula, 2 Dilma/Temer e Bolsonaro, não tem sido possível impedir o morticínio e a degradação daquele povo.
Os eventos de Paapiú em 1988, de Haximu em 1993 e Alto Alegre em 2013 e Palimiú em 2021 são alguns dos vários exemplos. A recente decretação de emergência na saúde da região pelo Ministério da Saúde é a oficialização de uma realidade acumulada pela inação dos vários governos anteriores que permitiram um massacre mais lento do que a bala ou o facão.
O avanço exploratório não se detém mesmo com a região sendo inóspita pelo relevo acidentado, umidade elevada e com acesso restrito pela floresta. Há sacrifício e desconforto que são superados pelo resultado obtido, situação, porém, que desanima as ações de coibição do ilícito que seriam obrigatórias.
Os yanomami não têm noção de comércio, a língua é restrita, tem organismos adaptados ao ambiente incluindo à convivência com malária endógena, diferente das cepas fora da região, e sistema imunológico delicado e eficiente em seu ambiente, mas incompatível com os sistemas de não indígenas.
Se nas cidades há grande facilidade de se enganar a população local com as várias artimanhas dos golpistas via contas bancárias pela internet, da casa própria, dos carros roubados, etc…, enganar os yanomamis em suas terras é tão mais fácil quanto maior for a sua inocência.
Se espera que as pessoas se indignem e busquem a justiça e o reparo quando lhes adentram suas propriedades e lhes causem prejuízo ou algum tipo de mal, à si ou à sua família.
Os yanomamis não sabem o que é justiça, nem propriedade, nem direito, e sem a tutela do Estado é um povo à mercê da sorte.
Deixá-los ao abandono voluntário e isolados como sempre estiveram até o século passado foi o que lhes permitia viver saudáveis, em paz e ao seu modo há milênios. Decidir cuidar deles na forma de violação e integrá-los à revelia de sua consciência têm sido o seu martírio.
A FUNAI enquanto não tiver antropólogos em sua direção vai continuar sem cumprir sua função, e continuará permitindo a existência de um vácuo em seu comando, que vem sendo preenchido pelos processos criminosos que se alimentam de sua omissão.
O ouro é a principal causa da situação.
Com alguma ironia, yanomami quer dizer “ser humano”.
(*) Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Professor de Pós-Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.