|No primeiro artigo sobre a temática do título abordei a necessidade dos brasileiros, de modo geral, escolherem melhor nossos representantes para o Legislativo. Não importa se em nível municipal, estadual ou federal, representantes honestos, comprometidos com as causas coletivas, bem-preparados e motivados, podem fazer uma grande diferença para o Brasil deixar de ser perpetuamente o “país do futuro” e se tornar uma verdadeira Nação no presente. No texto de hoje abordo sinteticamente o conceito prático de Consciência Política, que não se resume aos processos partidários e eleitorais, mas os engloba. Melhor dizendo, uma Consciência Política Coletiva voltada para o bem comum e a defesa de causas importantes, alimentará o processo político-partidário de nutrientes saudáveis para a tão almejada Boa Política. Num breve retrospecto, as raízes de nossa cultura política antiquada, expressas pelo individualismo, o corporativismo, o patrimonialismo, o clientelismo, o paternalismo e outros condicionantes do atraso, são oriundos dos primórdios da Terra de Santa Cruz. Trata-se de herança de nossa colonização lusitana. Mas isso não nos impede de mudar e evoluir, para alcançar um nível mais avançado de organização política, com uma gestão governamental que priorize as causas coletivas acima dos interesses privados.
No livro “Raízes do Brasil”, do saudoso sociólogo e historiador Sérgio Buarque de Holanda, encontramos características típicas dos brasileiros, como expressões de comportamentos adquiridos na nossa cultura patriarcal, de origem rural dos latifúndios escravistas, transplantada e adaptada para as cidades após a Abolição da Escravidão, no fim do século XIX. O modo das elites de protegerem – e privilegiarem – integrantes dos círculos íntimos, especialmente familiares e asseclas, em detrimento dos interesses coletivos é uma característica proveniente dos velhos tempos do Brasil-Colônia, acentuada durante o período do Império e que sobreviveu no período republicano. E pode ser destacada a influência tão perniciosa da escravidão, que deixou marcas profundas de injustiças, discriminações e desrespeito aos direitos humanos. Essas e outras características, ao longo da história do Brasil, parecem predominar sobre diversas qualidades genuínas de nossa gente, como a espontaneidade, a cordialidade, a criatividade e a adaptabilidade, dentre outras.
À título de exemplo basta observar como a maioria dos partidos políticos, embora ditos “nacionais”, estão sob o comando de clãs regionais, como capitanias hereditárias, nos diversos estados do Brasil. Outro fato é o de que mesmo com os louváveis esforços legais de enfrentamento do nepotismo e do clientelismo, estes ainda resistem em muitos campos de atuação pública, em detrimento do mérito individual, que enfrenta os mais difíceis obstáculos para ser reconhecido. Outros fatos exemplares deste protecionismo em favor de parentes e amigos, se expressam no nepotismo cruzado, nos negócios escusos e no excesso de cargos comissionados de livre nomeação. São sintomas do atraso brasileiro. E persistem, apesar dos “vernizes” de modernidade. Assim, mesmo possamos reconhecer que houve alguns avanços, fica evidente que não foram suficientes para prevenir e combater essas mazelas. Cito alguns destes avanços bem intencionados, como concursos públicos mais sérios para acesso à carreiras no Estado e regras eleitorais mais rígidas, embora muitas vezes desrespeitadas.
Nesse sentido, penso que leis mais rígidas podem até ser necessárias, mas terão pouca serventia, se não forem acompanhadas por uma mudança geral de mentalidade. A atitude corriqueira de só criticar e condenar as práticas erradas dos outros, mas exercer o protecionismo exacerbado em relação às falhas de familiares, amigos e correligionários, demonstra que grande parte de nossas elites prefere a aplicação seletiva das leis, em detrimento dos mais fracos e vulneráveis. Esta lógica fere profundamente os princípios da República e os fundamentos da Democracia, frequentemente solapados por quem exerce o poder em causa própria. A mentalidade de defender privilégios como se fossem direitos, solapa a autoridade moral de quem governa e também mina as práticas de respeito de todos os cidadãos, de qualquer segmento social. Além disso, contribui muito para manter o escandaloso quadro de desigualdade, injustiças, ignorância e violência em nosso país.