“Este exercício, de quebra, nos empurraria a ver como funcionam os esforços de “guerra” enfrentados por país e professores para assegurar o processo social da educação de qualidade, condição sagrada da transformação e da evolução. E mais: poderíamos integrar, assim, o mutirão dos responsáveis, isto é, todos nós, pela compreensão e superação da agonia em que estamos mergulhados, hoje, agora, aqui e acolá, sem saber aonde tudo isso vai desaguar.”
Por Alfredo Lopes – BrasilAmazoniaAgora- COLUNA FOLLOW-UP
Qual a necessidade do estabelecimento compartilhado e participativo de um código de condutas num contexto civil tão conturbado em seus costumes e padrões comportamentais? O que era verdade ontem já se transformou em enganação ou ideologia de um novo dia, em tempos de fake news. Nunca foi tão descartada a busca da verdade – facilmente confundida com a pós-verdade – nem tão difícil confirmar a consistência de uma informação. Em temporada de disseminação da desinformação, ficamos distantes anos luz de um consenso nas relações sociais que confirmam a especulação profética de Jean-Paul Sartre: “ O inferno são os outros”. E o que é mais irônico: achamos que as redes sociais nos interligaram como nunca, entretanto, as conversações que distribuem podem ser facilmente identificadas como imposição de formas ideológicas e facciosas, que escondem interesses e escamoteiam o que realmente importa. De sobra, estão restando pessoas solitárias, ansiosas e deprimidas…
Adiado com frequência e em vias de arquivamento no Congresso Nacional, vemos protelado o estabelecimento de jurisprudência constitucional para controle da enxurrada incontrolável de conteúdos falaciosos. Ou seja, a banalização/naturalização das notícias falsas que espalham teorias conspiratórios e desinformação como imposição de pseudo valores desprovidos de fundamentação e sentido. Trata-se de um movimento, essencialmente deletério, com roupagem despretensiosa e também descabida, que reúne os mais diversos propósitos de desconstrução e da desordem social. Alguns tratam o tema como um dos sinais dos tempos e de suas crises de valores, tão comuns na História da Humanidade, e que costumam anteceder as grandes transformações? Há controvérsias a respeito.
Com níveis insustentáveis de desesperança, país, professores, alunos, gestores públicos, governanças corporativas, entre outros segmentos do tecido social, buscam uma saída que possa nortear condutas e apontar uma luz nesta noite eterna de agonia generalizada. Para alguns pensadores – como Rousseau, Comte, Bauman, ou os integrantes da Escola de Frankfurt, que fugiram do Nazismo para os Estados Unidos durante a II Guerra, Adorno, Horkheimer, Walter Benjamin – estes movimentos permeiam a luta pelo poder em seus vários níveis e configurações. E para alguns deles, momentos de conflito incontornáveis como este reclamam mudanças radicais, ou, pelo menos, a revisão das leis, a formulação indicativa de códigos de condutas e de reafirmação dos valores de que o tecido social precisa para resguardar a ética baseada na dignidade humana. Ou seja, o estabelecimento dos princípios éticos e morais de amparo e referências da ordem, da justiça e da equidade social.
É sintomático considerar que a União Europeia, neste início de maio de 2023, apresentou um conjunto de leis e princípios éticos para apreciação do poder público e da chamada sociedade civil. A proposta tem por objetivo implantar uma rede de autoridades públicas e a sociedade civil para monitorar áreas de contravenção, violência e corrupção no bloco. A preocupação de base é “harmonizar”, no sentido da universalização, as leis de toda União Europeia e respectivos mecanismos de monitoramento e fiscalização.
O desafio é atualizar a definição detalhada dos crimes relacionados à corrupção, pressupostos, ocorrências e desconstrução, ou seja, suas respectivas penalidades, conferindo poder às autoridades constituídas de identificar e punir os criminosos, sejam eles do setor público ou privado. E mais: as fronteiras da UE, de acordo com os responsáveis pela iniciativa, estarão fechadas para quem não se submeter ao aparato legal que vai referenciar as condutas daqui por diante.
Como se vê, a formatação de um rigoroso Código de Condutas tem dimensões e implicações destinadas a uma quebra de paradigmas que fracassaram. É imperativo revisar para enfrentar e não dar espaço para ambiguidades nem improvisações. No caso da UE, as novas leis vão precisar da aprovação de 27 países-membros do bloco, assim como pelo Parlamento Europeu e seu respectivo Conselho. Uma tarefa espinhosa e de extensão imensurável.
E como se aplicaria esse conjunto de preocupações e medidas no nosso cotidiano, ou mesmo no universo não tão complexo como o das entidades de classe, que atuam na direção objetiva dos interesses de seus representados? As dimensões e os problemas de um Código de Condutas de um conglomerado geopolítico como a UE – é muito importante acentuar – são infinitamente maiores e mais complexos do que a gestão institucional de um Código de Ética planejado e executado num formato participativo numa entidade de classe. Entretanto, a ética é a mesma para os dois ambientes, posto que seus pilares e sua linguagem são decodificados e decodificáveis em âmbito universal. Ou seja, aquilo que pertence ao caráter, e que norteia a conduta moral e os costumes e respalda a formulação das leis, são premissas de qualquer iniciativa de enfrentamento da desordem social e da desconstrução de valores e princípios.
Caberia, pois, às entidades representativas formatar e detalhar quais são os preceitos necessários à sua estruturação e funcionamento como representantes do setor empresarial/laboral/ e sua inserção no tecido social, a ética que move e norteia seus comportamentos para assegurar qualidade e relevância de seu assessoramento. São regras, condutas, valores, prioridades, desafios e premissas de expansão, crescimento e consolidação das empresas. E o Código de Condutas de uma entidade de classe representativa tem que ser debatido e decidido pelo colegiado de conselheiros sob a animação de suas lideranças, a quem compete resguardar a consolidação do mais alto nível de referenciais de condutas, transparentes, universais e morais, na perspectiva dos interesses dos representados.
De quebra, ao levar adiante este exercício ético e metafísico de alinhamento moral e de bons costumes, estaríamos nos habilitando a entender as forças em litígio, as razões mais encobertas que levam à desarticulação da harmonia ou, ao menos, dos esforços para sua manutenção. Este exercício, de quebra, nos empurraria a ver como funcionam os esforços de “guerra” enfrentados por país e professores para assegurar o processo social da educação de qualidade, condição sagrada da transformação e da evolução. E mais: poderíamos integrar, assim, o mutirão dos responsáveis, isto é, todos nós, pela compreensão e superação da agonia em que estamos mergulhados, hoje, agora, aqui e acolá, sem saber aonde tudo isso vai desaguar.
(*) Alfredo é filósofo e escritor, editor do portal BrasilAmazoniaAgora e consultor do CIEAM.