A greve da Receita Federal começou na segunda (20) e não sai do radar do comércio e indústria do Amazonas. De olho nos já aguardados efeitos negativos do movimento, em uma economia com dificuldades de ser reativada, a AGU (Advocacia-Geral da União) entrou com uma “ação inibitória de greve”, no mesmo dia. Mas, acabou tendo seu pedido indeferido pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), nesta quarta (22). O temor das lideranças empresariais é que, ao optar pela litigância, o governo federal tenha estendido inadvertidamente a duração do movimento, que tende a intensificar perdas já impostas pela vazante histórica.
Em ação solicitada pelo Ministério da Fazenda, a AGU afirmou que o impacto sobre “serviços essenciais” pode prejudicar o alcance da meta fiscal zero para 2024. Alegou também que a greve afetaria julgamentos do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) “em valores bilionários”. A relatora da petição, e ministra do STJ, Regina Helena Costa, optou por não conceder a tutela provisória e assinalou que a documentação fornecida não é suficiente para constituir prova de “efetiva deflagração de ato paredista”. E deu cindo dias para o requerente a apresentar documentos que comprovem as alegações.
Em texto postado em seu site, o Sindifisco Nacional comemorou a vitória inicial e reforçou que a greve só termina quando o governo federal apresentar uma proposta que atenda aos pleitos dos auditores. A lista inclui cumprimento integral do Plano de Aplicação do Fundaf e alterações no texto do Decreto 11.545/2023 para garantir o pagamento do bônus de eficiência nos termos do acordo salarial firmado em 2016. A entidade acrescenta que continua “vigilante” e estudando alternativas para que o direito da categoria seja “definitivamente assegurado” pelo Judiciário.
“Chamando para briga”
O 1° vice-presidente da DS (Delegacia Sindical) Amazonas, e coordenador do CRM02 (Comando Nacional de Mobilização da Segunda Região Fiscal), Marcos José de Souza Neto, informou à reportagem do Jornal do Commercio que “quase 70%” dos quadros locais da Receita já cruzaram os braços. E informa que a adesão não é maior porque todo movimento grevista precisa garantir um mínimo de 30% do contingente trabalhando nas questões “mais urgentes”.
“No despacho de mercadorias, estamos liberando tudo o que é mais perecível, como alimentos e remédios, além de produtos perigosos. Por outro lado, são poucos os casos de colegas que não estão aderindo, sendo que a maioria estão alocados em funções e trabalhos que estão em decadência e que precisam ser encerrados ainda neste ano”, destacou, sem entrar em mais detalhes.
Marcos José de Souza Neto informa que, no caso dos funcionários dos setores internos, como análise de Imposto de Renda, a paralisação está sendo total e sem assinatura de ponto. Já os que trabalham nos terminais alfandegários do estão fazendo a chamada “operação padrão”. “Estão fazendo o máximo de exigências que a lei permite para a verificação das cargas. Com isso, a maioria dos contêineres cai no canal vermelho e há um atraso maior na análise das declarações de importações”, reforçou.
De acordo com o representante do Sindifisco do Amazonas, até o momento, não há nenhuma abertura nas negociações com o Ministério da Fazenda. “O governo nos pede para esperar e demos até um prazo, que acabou no dia 20. Agora, está pedindo mais um prazo, até 4 e dezembro. Enquanto isso, a Secretaria da Receita solicita que a AGU entre com pedido de liminar contra nossa greve. Em vez de termos sinalizações de conversas, o governo está chamando para a briga. Essa situação não vai se resolver tão rápido assim”, lamentou.
“Necessidade de sensibilidade”
O presidente em exercício da Fecomercio-AM, Aderson Frota, aponta que já se tornou frequente os funcionários da Receita “paralisarem a economia”, em virtude de reivindicações e “demandas por melhoria salarial”. O dirigente frisa que os empresários do comércio não estão constando a “veracidade do pleito dos auditores fiscais”, mas ressalva que estes deveriam pensar também na “grandeza dos problemas que hoje estão afetando a população”, antes de qualquer atitude.
“Infelizmente, essas coisas continuam e nós, que dependemos da atuação do órgão, em função de nossa burocracia fiscal, ficamos sem poder receber ou liberar mercadorias. Isso é lamentável. É muito bom que eles avaliem essas necessidades e não só olhem para isso como um assunto de natureza privada. Que tenham a sensibilidade de dizer que vão fazer greve, mas que também vão funcionar esporadicamente com um número maior [de funcionários], para que a economia não saia prejudicada”, sugeriu.
Aderson Frota reforça seu argumento, ao lembrar que a estiagem histórica de 2023 já estava fazendo o comércio do Amazonas “sofrer demais”, antes mesmo da greve. “Isso tudo nos obriga a dizer que é necessário ter sensibilidade quanto aos problemas das empresas com o baixo calado dos rios. E, acima de tudo, deve ser considerada a necessidade de abastecimento das populações. Tenho certeza de que os fiscais poderão conduzir isso da melhor forma possível, sem muitas dores e sem muitos problemas”, afiançou.
“Momento indesejado”
O presidente da Fieam e vice-presidente executivo da CNI, Antonio Silva, disse que ainda é cedo para mensurar o efeito da greve. Ele destacou, entretanto, que o PIM acompanha e observa “atentamente” o índice de adesão do movimento e o desenrolar da operação padrão. “A AGU ingressou com ação inibitória e isso pode dificultar as negociações em curso. Como o movimento não tem previsão de acabar, fica difícil estimar o impacto. Nosso objetivo principal é tentar conciliar os pontos de divergências entre o governo federal e os auditores, a fim de mitigar o impacto sobre o Polo Industrial de Manaus”, ressaltou.
Vice-presidente da Fieam e presidente do Sindicato da Indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, Nelson Azevedo, reforça que a paralisação veio “na pior época” para o setor, em função dos efeitos da vazante. “As empresas já estão sendo penalizadas pela falta de insumos. Agora, que os rios começam a dar sinais de subida, somos penalizados novamente. Esperamos que o governo dialogue com os auditores para equacionar as reivindicações e manter a continuidade dos serviços, para que a sociedade não seja penalizada. É preciso bom senso das partes”, frisou.
O Cieam respondeu, por meio de sua assessoria de imprensa, que mantém o mesmo posicionamento sobre a questão, informado há três semanas. Na ocasião, o presidente-executivo da entidade, Lúcio Flávio Morais de Oliveira, foi procurado por uma delegação do Sindifisco, pedindo apoio no diálogo com o governo. “Dadas às estatísticas atuais, este é um momento indesejado para qualquer movimento grevista. Isso pioraria ainda mais a situação que estamos vivendo com a seca. Vamos mobilizar as lideranças da indústria, mas também contamos com a atenção da categoria para amenizar essa situação toda, em virtude da crise hídrica que as indústrias do Amazonas enfrentam”, finalizou.