19 de setembro de 2024

Fecomercio-AM reúne Grupo de Trabalho de enfrentamento à vazante dos rios amazônicos

Assim como a indústria, o comércio do Amazonas também está se mobilizando para minimizar uma nova rodada de perdas neste ano, diante de uma vazante que já se espera ser tão ou mais severa do que a de 2023. Na quinta (4), a Fecomércio-AM (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Amazonas) reuniu empresários, presidentes de sindicatos patronais, entidades de classe e representantes do governo estadual para tratar sobre a criação de um Grupo de Trabalho de Logística e Estiagem. A meta é desenvolver estratégias de enfrentamento e garantir a continuidade das operações comerciais durante a seca.

Durante o encontro, Dnit e Defesa Civil fizeram um diagnóstico preocupante do quadro climático atual. “O aquecimento global persiste e temos o fenômeno El Niño ainda atuando. O aquecimento do Oceano Pacífico Equatorial persiste e isso é uma anomalia que remete a temperaturas elevadas e baixo volume de precipitação. Se não bastasse isso, o Atlântico está aquecido ao Sul e, principalmente, ao Norte. Por isso, estamos tendo muitos problemas de chuvas no Nordeste e Sudeste do país”, apontou o secretário executivo da Defesa Civil do Amazonas, coronel Francisco Máximo.

Conforme o militar, do ponto de vista hidrológico e climatológico, dificilmente o Estado escapará de uma nova estiagem severa em 2024, e não há como impedir a ação da natureza. “Nossa preocupação é trabalhar em ações que possam permitir que os danos econômicos e sociais sejam minimizados em todas as instâncias, desde a indústria e o comércio, até a manutenção dos serviços essenciais. Razão pela qual, estamos trabalhando com todos os poderes, empresas, prefeitos e agências federais”, resumiu.

Francisco Máximo destacou que essa não foi a primeira reunião do gênero no qual o órgão participa e que sua participação configura em uma “ação complementar” para verificar os “pontos ainda não tratados” e reforçar ações preventivas. “O Estado, de forma bastante providente, vem tomando iniciativa, através do Sistema de Proteção da Defesa Civil, de difundir informações importantes para que haja de fato uma preparação”, sublinhou. 

“Dever de casa”

O especialista de infraestrutura do Dnit/AM, Evailton Arantes de Oliveira, garantiu que o órgão está fazendo o “dever de casa”. “Fizemos diversas contratações. A dragagem emergencial entre o rio Madeira e o Tabocal já está sendo realizada e deve ser concluída em 23 de abril. Temos também a contratação de um plano de dragagem e manutenção do rio Madeira até 2025; e o plano de dragagem e manutenção na travessia da BR-230 [rodovia Transamazônica] no rio Madeira até 2027”, listou, explicando que os planos são contratos em que a empresa fica responsável pela dragagem de manutenção das hidrovias, sempre que necessário.

Oliveira acrescentou que o Dnit também está em processo de contratação para o rio Amazonas nos trechos entre Codajás e Coari, e entre Manaus e Itacoatiara. Segundo o especialista, a empresa selecionada ficará responsável pela manutenção dos trechos em questão durante cinco anos, e também pela sinalização das hidrovias – um pleito antigo do empresariado amazonense. “Estamos apenas aguardando o licenciamento ambiental desses trechos, pelo Ipaam e pelo Ibama, para poder homologar a licitação e celebrar os contratos”, sintetizou, garantindo que a “barreira dos recursos financeiros” foi vencida.

Sangria nos orçamentos

O presidente em exercício da Fecomércio-AM, Aderson Frota, disse que a reunião visou antecipar uma nova rodada de problemas em 2024. Ele lembrou que a seca de 2023 foi a pior em 121 anos, gerando prejuízos para a navegação, abastecimento e arrecadação tributária. De acordo com o comerciante, os fretes sofreram reajuste de 300%, “sangrando” os orçamentos familiares do Amazonas. E o setor, que estava acostumado a receber mercadorias em um prazo de 30 a 35 dias, passou a ter de esperar 150 dias.

“Lamentavelmente, o comércio tem um sistema fiscal um pouco mais austero: temos de pagar o ICMS em até 45 dias da entrada da mercadoria, com valor agregado. Ou seja, mesmo em tempo de crise, o comerciante continuou pagando todos os tributos muito antes de colocar a mão na mercadoria, com um prazo superior para receber o produto. Isso é muito grave, porque descapitaliza as empresas e gera desemprego”, desabafou.

Na entrevista coletiva que concedeu após o evento, o presidente da Fecomercio-AM explicou que o encontro foi realizado para que o Amazonas não volte a ser pego de surpresa, como no ano passado. “Esse ano, a tendência mostrada pelos estudos do Dnit e da Defesa Civil mostram que vamos ter muito mais dificuldades. Tudo isso me levou a antecipar essa reunião, para a gente poder elencar todas as providências e ver quais órgãos do governo vão estar envolvidos nesse processo. E, acima de tudo, não permitir que a situação chegue à gravidade do ano passado”, ressaltou.

“Diálogo intenso”

O titular da Sedecti (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação do Amazonas), Serafim Corrêa, disse que logística é uma “preocupação constante” do governo estadual e que está havendo um “diálogo intenso” com a sociedade amazonense. Ele lembra que dois pontos ficaram intrafegáveis durante a vazante histórica: a Costa do Tabocal e a Enseada do Rio Madeira. “Há necessidade não apenas de dragagem, mas de muitas providências em termos de logística na nossa região”, asseverou, acrescentando que o governo federal é “quem administra o rio”.

O secretário estadual conta que, no dia anterior, o governador Wilson Lima se reuniu com os ministros Silvio Costa (Portos e Aeroportos), Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional) e o secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco, para buscar apoio federal. “Foi anunciada a disponibilidade de R$ 400 milhões para avançar nesses serviços básicos. Quanto mais cedo começarem a ser feitos, melhor. Para evitar, ou pelo menos para diminuir, os impactos da seca que tivemos no ano passado e que, ao que tudo indica, teremos de novo”, frisou.

Serafim Corrêa também enfatizou que o governo já participou de encontros com armadores e operadores de logística, entre outros segmentos e atores preocupados com uma repetição da crise da vazante. “Todos perderam e principalmente a população. Houve um aumento de preços com a estiagem, e nem todos os valores voltaram ao que eram. Algumas empresas estão adotando medidas preventivas, como antecipar a venda de insumos”, lamentou.

Indagado sobre a BR-319 durante a coletiva pós-reunião, o titular da Sedecti reforçou que a revitalização da rodovia não configuraria uma solução para todos os problemas logísticos do Amazonas. “Os navios que vêm do exterior têm de vir pelos rios. É como dizia [o escritor e jornalista] Leandro Tocantins: ‘na Amazônia, o rio comanda a vida’. Temos de resgatar o rio. A BR-319 é outra pauta na qual o governo do Estado está empenhado. O que sabemos é que está perto de sair o relatório final da área técnica do Dnit. E que a sinalização é que se faça uma Estrada Parque – a mesma tese do ex-governador José Melo, de nove anos atrás”, arrematou.

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio

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