Por Victor Salviati
No mês de março tivemos duas notícias animadoras: retomada da relevância da participação da agricultura no Produto Interno Bruto (PIB) e a queda do desmatamento, no mesmo período. Essas notícias se desdobram em fatos relevantes para o Brasil e para a Amazônia.
É notória a importância da agricultura para a riqueza do Brasil, a geração de emprego e renda, e a produção de alimentos. Infelizmente, em termos históricos, a agricultura gerou riquezas para o país degradando as florestas. Isto contribuiu com a concentração de renda, a pobreza e a perda de biodiversidade.
A riqueza e a prosperidade do Brasil passam por uma agricultura mais sustentável, com tecnologia e respeito às boas práticas socioambientais. E pudemos testemunhar a viabilidade disso: o PIB aumentou 2,9%, a contribuição da agricultura representou 15,1%, e o desmatamento caiu 62% na Amazônia. Isto comprova algo que o Brasil já tinha demonstrado ao mundo: produzir alimentos protegendo as florestas.
A agricultura brasileira sempre foi vanguardista em tecnologias verdes, inovação e produtividade.
Mas há muito o que melhorar em nossa agricultura, como a altíssima concentração de renda, o uso intenso de agrotóxicos, má aplicação de crédito rural, assistência técnica defasada, e taxas absolutas de desmatamento e degradação florestal inaceitáveis.
Outro ponto, e mais grave, é que falhamos em não tratar as atividades econômicas florestais com a mesma importância e investimento das agropecuárias. Imagine como seria o PIB da Amazônia se tivéssemos investimentos similares à economia de base florestal ao que temos para a agropecuária.
Não temos ainda arcabouços financeiro e institucional que apoiem o açaí com a mesma intensidade que temos para soja. O crédito rural privilegia o óleo de palma em detrimento do óleo de copaíba. É mais fácil conseguir investimentos para criar gado do que para o manejo sustentável de pirarucu.
Enquanto a Amazônia tem a oferecer uma bioeconomia nativa, diversa, inclusiva e próspera, os incentivos e aparatos institucionais e financeiros priorizam o boi e a soja. E é possível verificar isso em qualquer interior da Amazônia: a terra “limpa” (sem floresta) vale mais que a terra “suja” (com floresta). Isto representa o quanto ainda temos que avançar na sofisticação de nossos instrumentos econômicos para medir, de fato, como a bioeconomia Amazônica pode, e deve, contribuir para o desenvolvimento sustentável e a prosperidade regional.
E esta é a oportunidade de reflexão: a bioeconomia Amazônica pode contribuir com o crescimento do PIB e com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Temos uma importante janela de oportunidade para construir e consolidar arcabouços institucionais e financeiros para incentivar a bioeconomia Amazônica, incluindo populações tradicionais, quilombolas e povos indígenas, contabilizando ganhos de carbono e serviços ambientais, criando áreas protegidas produtivas, e atrelando o aumento do PIB com o do IDH.
A solução não é diminuir os incentivos para a agricultura; é criar e intensificar oportunidades para que o “PIB da bioeconomia” também tenha impactos positivos no IDH, no combate à pobreza, na proteção das florestas e na prosperidade dos povos da floresta.