23 de novembro de 2024

Administrar é chegar antes

Daniel Borges Nava*

*Geólogo, Analista Ambiental, Professor Doutor em Ciências Ambientais e Sustentabilidade na Amazônia e Pesquisador do Grupo de Pesquisa Química Aplicada à Tecnologia da UEA.

Administrar é chegar antes ”, Paiva Netto

Em meu artigo MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O DESPERTAR DA SOLIDARIEDADE HUMANA ressalto que, como geólogo, no tempo geológico da Terra, identificamos inúmeras mudanças no clima. Mas o fato ímpar é que nunca estivemos com tantos indivíduos da espécie homo sapiens vivendo ou sobrevivendo juntos num período planetário de mudanças climáticas. 

Mesmo com tantos alertas científicos, não temos sido capazes de minimizar a intensidade das emissões de gases do efeito estufa provenientes da queima de combustíveis fósseis, incêndios florestais, desmatamentos ilegais, entre tantas atividades humanas que contribuem diretamente com o crescimento da crise climática.

Nossas cidades não foram construídas respeitando a natureza e o conceito do Ciclo da Água. Assim, o evento crítico do Rio Grande do Sul, que não acontecia há 83 anos, mostra que na agenda municipal do próximo pleito eleitoral de outubro precisamos discutir o conceito de resiliência urbana. 

No caso de Manaus, a semelhança do que vimos nas cidades do Sul do Brasil, debater o tema passa por ações de: recuperação das matas ciliares dos igarapés e rios; retirada das populações das áreas de inundações e de risco geológico; preservação da cobertura florestal nativa e do seu papel ecossistêmico nos Planos Diretores; uma comunicação inteligente, na velocidade das redes sociais, que permita o acesso nos celulares dos cidadãos de previsões de chuvas intensas, em tempo real, para a prevenção e minimização dos prejuízos naturais causados pelos fenômenos extremos que vivemos e viveremos.

Nossa SOLIDARIEDADE ao povo do Rio Grande do Sul!

Na Amazônia, nosso território hídrico nacional, a força das águas nos move a pensar o quão vulneráveis estamos, pois, como estradas, a logística dos rios requer monitoramento, sinalização e dragagem nas vazantes, como necessitamos em 2023; e, monitoramento e adaptação nas cheias, como presenciamos em 2021. 

A falta de uma política nacional logística para a Amazônia torna o que deveriam ser hidrovias, meros canais de navegação, sem governança e estruturas mínimas que suportem nosso principal meio de transporte de pessoas e mercadorias. O isolamento geográfico não é pior que o isolamento político.

O tema é tão estratégico que deveríamos aprender com os norte-americanos: a hidrovia do rio Mississipi é gerida pelo Exército dos Estados Unidos. Não é sem motivo que a economia deles é tão pujante. Eles não brincam quando o tema é infraestrutura logística.

Considerando a dinâmica de nossas várzeas, onde o rio é um importante agente geológico de erosão e deposição, a segurança operacional dos nossos portos, notadamente em tempos de guerra climática, passa pelo necessário monitoramento geotécnico das margens, estudos nem sempre desenvolvidos nos orçamentos públicos e privados. A Amazônia requer, acima de tudo, uma Engenharia anfíbia, pois a subida e descida das águas dita a estabilidade dos taludes.   

Ainda me é fresco na memória o grave escorregamento no porto Chibatão, ocorrido em outubro de 2010, que vitimou duas pessoas, com o afundamento de dezenas de containers e baús, numa área equivalente a dez campos de futebol. 

Enquanto esperamos a chegada do fenômeno La Niña, trazendo para nossa região concentrações de chuvas mais generosas, o 2º Alerta do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) indicou que os rios Negro, Solimões e Amazonas terão baixa probabilidade de enfrentar cheias severas em 2024. Segundo as previsões (com 80% de intervalo de confiança), o rio Negro deve atingir 27,14m em Manaus, com possibilidade de chegar à máxima de 27,70m. A probabilidade de que o rio venha a atingir a cota de inundação (27,50m) é de 20%. No caso da cota de inundação severa (29m), essa probabilidade é de 1%, e para a cota máxima (30,02 m em 2021) é de 0,01%.

A luz amarela está acesa, portanto, para o segundo semestre, pois a previsão reforça que é preciso estar atento ao período de vazante deste ano, considerando a baixa recuperação, até então, das cotas dos nossos principais rios no Amazonas. 

Como administrar é chegar antes, e, para se evitar os problemas ocorridos na vazante de 2023, estiveram reunidos na última semana de abril, representantes do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) e do Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) discutindo o licenciamento ambiental de obras preventivas de dragagem nos principais cursos de água no Estado.

O Plano de Dragagem de Manutenção Aquaviária e o Plano de Sinalização Náutica proposto pelo Dnit contemplarão como prioridades em 2024: a hidrovia Amazonas, no trecho entre Itacoatiara e Manaus; e a hidrovia Solimões, nos trechos entre as cidades de Codajás e Coari, Benjamin Constant e São Paulo de Olivença, e entre Tabatinga e Benjamin Constant. 

Diante da estiagem que se avizinha, quero ressaltar também, o importante trabalho iniciado pela equipe da Defesa Civil atuando de forma coordenada na comunicação e planejamento das diversas ações dos órgãos da administração direta e indireta do Estado do Amazonas, das representações municipais, das instituições Públicas Federais e das empresas privadas afins. 

Sob o lema A DEFESA CIVIL SOMOS TODOS NÓS, pratica-se a união de esforços e da cooperação mútua no enfrentamento dos desafios da vazante, de maneira efetiva, tendo pelo espírito de solidariedade e engajamento o necessário objetivo de proteção da nossa população e dos recursos naturais. 

Daniel Nava

Pesquisador Doutor em Ciências Ambientais e Sustentabilidade da Amazônia do Grupo de Pesquisa Química Aplicada à Tecnologia da UEA, Analista Ambiental e Gerente de Recursos Hídricos do IPAAM

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