Por Juarez Baldoino da Costa(*)
Os povos indígenas caminham para não mais dependerem de seus territórios para viver.
Este afastamento do território ao mesmo tempo em que se integram ao novo modo de vida, evidenciam o colapso de sua estrutura social de até então, ao mesmo tempo em que os transporta para um plano que os levará a abrir uma nova identidade social, agora sem necessariamente haver um vínculo territorial.
O secular processo de seu envolvimento com os não indígenas iniciado com o espelho e culminado com a internet, vem consolidando este previsto e inexorável colapso representado principalmente pela assistência externa em alimentação, saúde e educação.
A extensão do colapso varia entre as diversas nações e entre elas próprias conforme o seu local, tendo atingido inclusive as tribos chamadas de Isoladas, como é o caso deste grupo entre os Yanomami, que também receberam cestas básicas em março último pela operação Catrimani das Forças Armadas.
Povos isolados seriam auto suficientes em seu modo de vida, sem contato com não índios e sem utilização de qualquer recurso não originário da floresta. A realidade, entretanto, tem revelado que o isolamento não está resistindo, e é uma questão de tempo para esta categoria desaparecer.
Ao serem atendidos pela Funasa – Fundação Nacional da Saúde para se tratarem da malária, da tuberculose ou da verminose, pelas Forças Armadas para apoio logístico e para receber suprimentos, e pelo MEC – Ministério da Educação e Cultura para organizar seu sistema de ensino, interrompem o contato com a floresta não mais obtendo alimentos ou medicação, e na questão cultural passam a transmitir a língua, os costumes e os saberes aos seus descendentes no formato meritocrático, e que deixa para trás os que menos se desempenharem no aprendizado.
A cesta básica distribuída pelos programas sociais substitui o cultivo, a caça, a pesca e a coleta, deixando sem função os grandes territórios, e tornando os atributos físicos de seus membros igualmente sem utilidade na sociedade não indígena.
O culto de suas crenças em locais fechados também os afasta da selva e de seus costumes, gerando mais um fator de colapso.
O mercúrio proveniente do garimpo em terras indígenas é por eles absorvido, cujos efeitos tornarão seus corpos ainda mais doentes e improdutivos, aumentando a dependência dos não índios. Estes indivíduos contaminados procriarão descendentes que continuarão ampliando o colapso, num ciclo de degradação continua de sua saúde e de sua subsistência, demandando dependência crescente da ajuda externa.
Este contexto, fruto de um processo de décadas, fragiliza a discussão sobre o marco temporal que define territórios indígenas a partir de uma determinada data.
Como o território é a base do sistema indígena em razão das funções e das utilidades que disponibiliza a estes povos, e o colapso instalado eliminou o uso dos territórios e consequentemente o uso de suas funções e utilidades, como definir uma data?
Mais ainda, porque definir uma data?
Antes do marco temporal o Brasil precisa reconstruir o marco indígena, uma atribuição exclusiva da FUNAI que se perdeu no tempo.
(*) Amazonólogo, MSc em Sociedade e Cultura da Amazônia – UFAM, Economista, Contabilista, Professor de Pós-Graduação e Consultor de empresas especializado em ZFM.