Dom Helder Câmara, ícone dos direitos humanos no Brasil e no mundo desde 1960, comemorou cem anos de vida há 6 anos.Tornou-se bispo aos 43anos. Arcebispo de Olinda e Recife aos 55 anos de idade. Apresenta-se hoje como figura admirável por ter sido o articulador da C.N.B.B.(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), idealizador da fundação do CELAM, planejador da Campanha da Fraternidade (vigorando no país desde os anos sessenta) além de constar no seu ideário de sacerdote o de criador da Associação São Sebastião (especificamente destinada ao atendimento dos favelados) e do Banco da Providência (atuante na faixa da miséria). Lembro bem de suas atitudes enérgicas em favor dos menos favorecidos quando eram feitas reportagens com suas fotos na revista Cruzeiro e Manchete de circulação nacional. Sempre pugnando por causas nobres, mais precisamente, dos excluídos. Não possuíamos televisão em Manaus e as únicas imagens eram aquelas que se gravaram em minha mente de criança. Um padre de estatura pequena, um pouco calvo, magro e com cara de “tô aqui pra toda obra”. As mãos. Chamavam-me atenção principalmente suas mãos. Na maioria das fotos com elas levantadas como que exortando à mobilização de forças para uma justiça social digna e condizente aos brasileiros. A batina. Geralmente num tom cáqui (bege) ou cinza, quase sempre suada (viam-se marcas de suor) e algo amassada. Era algo habitual e sempre rodeado dos pobres e marginalizados fosse em favelas, fosse em praças públicas.Com o traje episcopal o vi raramente Alegrei-me em saber que a Igreja Católica abriu os festejos de seu ano centenário no dia 7de Fevereiro (dia de seu nascimento, no ano de 1909). Alegrei-me porque ele realmente acreditou no poder do Evangelho. Tachado de anarquista, instigador de massas e proibidas as notícias sobre sua pessoa pela censura da ditadura militar de 1964 encetou palestras pelo mundo afora sobre a problemática de exclusão humana e social em nosso país. Isso rendeu-lhe à época, no exterior muitos prêmios e títulos e indicações para o prêmio Nobel da Paz por 3 vezes. Quero aqui deixar registrado que ele não foi só o mentor de grandes causas mas foi sobretudo um poeta. E poeta da Virgem. E foi em plena época ditatorial, em Julho de 1971 que disse: “Com o Magnificat/ o teu hino incomparável/de louvor e ação de graças/ Vão gravar-te/ palavras isoladas e provar/ que és subversiva, agitadora, /comunista!” A Campanha da Fraternidade evocou anos atrás a segurança pública. Problema social enfrentado pelo nosso país em especial Manaus a deparar-se com a violência como se fosse sua inquilina diuturnamente. Mulheres, crianças violentadas e exploradas em todos os aspectos. Violência familiar Vergonha! Pais, agressores de filhos e… covardia! Filhos adultos agredindo seus pais. Essa campanha é fruto do semeador Helder Câmara. O que acreditou no poder do Evangelho. Dizia João Paulo II aos jovens: “ Para FAZER na Igreja é preciso aprender a SER”. Dar testemunho. Bom exemplo de conduta moral e cristã, pois a “palavra convence, mas só o exemplo arrasta”. Essa foi a ação evangelizadora de D. Helder. Numa época marcada por ódios, egoísmos, desejos de falsas felicidades, decadência dos costumes, ânsia do poder, da inversão de valores, da desvalorização da família, aviva às mentes mais sensíveis a precisão da pacificidade e da solidariedade. Dar nitidez à paisagem policrômica de perdidos paraísos. Gente com cadeiras à porta. E em noites escuras à luz de velas ou candeeiros. Só temíamos as estórias fantásticas da cobra-grande e de almas penadas contadas pelos mais velhos. Tudo era paz. Pedimos emprestado de D. Helder Câmara sua poesia de 1962 que dizia: “Onde estão Virgem Mãe/ as palmas de tuas mãos amigas/ que tinham o dom de serenar/ a cabeça de teu Filho?…”
CARMEN NOVOA SILVA, é Teóloga e membro da Academia Amazonense de Letras e da Academia Marial do Santuário de Aparecida-SP