16 de setembro de 2024

A hipocrisia dos famosos diante da destruição da Amazônia

A Amazônia brasileira tem sido alvo de exploração ilegal por séculos. Autoridades e formadores de opinião, incluindo celebridades, frequentemente desviam o foco das causas reais dos problemas, alternando entre silêncio, negação, mudanças de narrativas ou manifestações ruidosas, conforme o poder vigente. Este artigo relata os problemas ambientais, suas possíveis causas e os comportamentos contraditórios que desviam a atenção da preservação genuína da Amazônia.

Para começar, precisamos reconhecer que temos um problema secular que levará gerações para ser corrigido: o mau uso de nossas terras e florestas. Entre 1850 e 2021, o Brasil emitiu 113 Gt de CO2 (4º maior emissor), com 86% dessas emissões causadas pelo manuseio da terra e florestas, e 14% pela produção de cimento e uso de combustíveis fósseis <https://peerj.com/articles/cs-1694/ p. 9)>.

Também temos que reconhecer que  a situação está piorando: até 1985, 20% das áreas naturais do Brasil foram perdidas; entre 1985 e 2023, esse número aumentou para 33%, com 1/2 da área devastada na Amazônia <https://tinyurl.com/5327pn4w>. Além disso, sofremos de forma mais intensa com os efeitos das atividades humanas realizadas de forma irracional e que estão envolvidas com o desmatamento, as queimadas, a grilagem de terra, exploração de madeira ilegal, mineração ilegal, expansão pecuária, poluição dos rios e igarapés, caça e pesca ilegal,  construção de hidrelétricas etc. Esses problemas agravam os efeitos das mudanças climáticas, como secas, inundações, aumento do calor, poluição do ar e pandemias. As causas incluem a expansão descontrolada da agropecuária, enfraquecimento da gestão ambiental, fiscalização insuficiente, baixa taxa de reciclagem, desperdícios, baixa inovação, alta impunidade e corrupção. O lobby dos poluidores, aliado à falta de um plano sustentável de longo prazo, perpetua essa crise.

Em vez de abordar as causas reais, parte de nossas autoridades e formadores de opinião frequentemente adotam comportamentos que apenas mascaram os problemas, conforme ilustrado nos exemplos a seguir.

  • Período do Governo Bolsonaro (2019-2022)

Esse período foi marcado por retrocessos em áreas como meio ambiente, educação, saúde, direitos humanos e combate às desigualdades que estão custando caro ao contribuinte (INESC, 2023 – https://tinyurl.com/yc2p5fhd).

O desmatamento da Amazônia aumentou 73% nos primeiros três anos, com queimadas e desmatamentos intensos no Pantanal e na Amazônia. Neste período, testemunhamos comportamentos com narrativas e atitudes que dariam inveja ao Maquiavel e ao Dante, a saber:

Em vez de enfrentar os problemas, o então Presidente Bolsonaro e seus aliados negaram os fatos, retaliaram funcionários públicos, atacaram a imprensa e culparam terceiros, incluindo indígenas e ONGs, protegendo infratores que atuam na ilegalidade como invasores de terras, desmatadores, garimpeiros, madeireiros, charlatões (divulgadores da cloroquina, ivermectina) etc.

Neste enredo, ficou bem conhecido o caso do General Mourão, vice-presidente, e o Salles, então Ministro do meio ambiente, o compartilhamento de um vídeo fake em 09/09/20, com imagens e mensagens em que negavam que a floresta Amazônica estivesse queimando <https://tinyurl.com/mrxe3n25> com o detalhe de que o vídeo continha imagens do acervo do Greenpeace que foram gravadas em 2015.  A malandragem foi tão grande que o vídeo foi tirado do ar e isto nos faz questionar “Como pode um general do Exército brasileiro, ocupante do 2º maior posto do governo federal mentir tão descaradamente para a população?”

Por outro lado, entre 2020 e 2022, foram vários artigos científicos e reportagens publicados por cientistas, artistas, jornalistas, professores e formadores de opinião denunciando os problemas ambientais na Amazônia.

Em 2020, Lula (PT) questionou a ausência das forças armadas para tentar combater os incêndios na Amazônia e Pantanal. Em seu programa de governo apresentado em 2022, Lula e sua tropa prometeram nos itens 93, 94 e 95 “É imperativo defender a Amazônia da política de devastação posta em prática pelo atual governo… Combateremos o crime ambiental promovido por milícias, grileiros, madeireiros e qualquer organização econômica que aja ao arrepio da lei… É nosso dever conservar a Amazônia, o cerrado, a mata atlântica, a caatinga, o pantanal, os pampas e os outros biomas e ambientes”.

E quem não lembra da música “Canção pra Amazônia” <https://tinyurl.com/2kfdmeyz>, organizada pelo Greenpeace em 2021 e 30 artistas, vários dos quais com histórico de apoio ao Lula/PT (Camila Pitanga, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Nando Reis, Criolo, dentre outros)?

  • Período do terceiro Governo Lula (2023-)

Um ano e oito meses se passaram e as promessas não saíram do papel, pois os problemas ambientais não retrocedem. Segundo o WWF-Brasil e o INPE, os biomas do país bateram recordes de queimadas no primeiro semestre de 2024, com 12696 focos na Amazônia entre 01/01 e 23/06/24, e 3262 focos no Pantanal, 22 vezes maior que o mesmo período do ano anterior, o pior recorde da região <https://tinyurl.com/4ynj55pd>

Acuada, a ministra do Meio Ambiente, Marina, antes crítica feroz do Governo Bolsonaro por sua inação diante da destruição dos biomas, agora culpa as mudanças climáticas, o El Niño e as ações humanas. Enquanto isso, os “intelectuais”, os artistas, cantores, companheiros e camaradas que ecoavam suas críticas simplesmente sumiram, enquanto os patriotas saem do silêncio, ressurgem das cinzas para atacar os rivais, parecendo até que estamos vivendo em um hospício a céu aberto.

Finalmente, em meio a tantos problemas graves, vivemos em um ciclo vicioso de hipocrisia, onde políticos e seguidores, presos na teia da polarização, agem como marionetes ao sabor dos interesses privados e das flutuações do poder. Para mudar esta realidade, precisamos reconhecer os problemas, transcender narrativas vazias e interesses individuais, fugir da polarização, cobrar das autoridades e dar o bom exemplo, nos engajando local e ativamente na resolução das causas profundas desses problemas.

Jonas Gomes

Prof. Dr. Jonas Gomes da Silva - Professor Associado do Dep. de Engenharia de Produção com Pós Doutorado iniciado no ano de 2020 em Inovação pela Escola de Negócios da Universidade de Manchester. E-mail: [email protected].

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