ABORDAGEM HISTÓRICA SOBRE O PORVIR (XIV)

Em: 18 de setembro de 2022

Bosco Jackmonth*

Linhas anteriores, precisamente no texto XVIII desta mesma estação de escritos semanais, colhidos da fonte indicada no início desta série, concluiu-se dizeres sobre a figura da morte apresentando-se às pessoas para dar cabo da sua tarefa que tal, indiferente aos apelos do escolhido para que não se se dê o desfecho de imediato. Por certo, contudo, humanos não morrem porque uma figura envolta em um manto negro bate em seu ombro, ou porque Deus assim decretou, ou ainda porque a mortalidade é parte essencial de algum grande plano cósmico.

Sucede, humanos morrem devido a alguma falha técnica. O coração para de bombear o sangue porque não chega bastante oxigênio no músculo cardíaco. Espalham-se células cancerosas porque uma mutação genética acidental reescreve suas instruções. Germes se instalaram nos pulmões de quem estava próximo de alguém que espirrou no metrô. Nada metafísico. Somente problemas técnicos.

A propósito, todo problema técnico tem uma solução técnica. Não carece esperar pela volta de Cristo à Terra para superar a morte. Alguns nerds num laboratório podem fazer isso. Dá-se que se a morte era tradicionalmente a especialidade de sacerdotes e teólogos, hoje são os engenheiros que estão assumindo o caso. As células podem ser mortas por meio de quimioterapia ou por nanorrobôs. Os germes nos pulmões podem ser extintos com o uso de antibióticos. Se o coração parar de bater, é possível fortificá-lo com medicamentos e choques elétricos – e, se isso não funcionar, pode-se realizar o implante de um coração novo. É verdade que no momento não dispomos de solução para todos os problemas técnicos. Mas é exatamente por causa disso que investimos tanto tempo e dinheiro em pesquisas sobre o câncer, germes, a genética e a nanotecnologia.

Mesmos os leigos, que não estão envolvidos em pesquisas científicas, acostumaram-se a pensar na morte como um problema técnico. Assim, quando uma mulher vai ao médico e pergunta. “Doutor, o que há de errada comigo?”, ele poderá responder “Bem, você está com uma gripe” ou “Você tem tuberculose”, ou “Você tem câncer”. Mas nunca dirá “Você tem morte”. E é generalizada a percepção de que uma gripe, a tuberculose e o câncer são problemas técnicos, para os quais algum dia vai se encontrar a solução técnica.

Quando pessoas morrem mesmo num furacão, num acidente de carro ou numa guerra, tendemos a tratar esse evento como uma falha técnica que poderia e deveria ser evitada. Se o governo tivesse adotado uma política melhor; se a municipalidade tivesse feito adequadamente seu trabalho; se o comandante militar tivesse tomado uma decisão mais sensata, a morte poderia ter sido evitada. A morte tornou-se uma motivo quase automático para processos legais e investigações. “Como é possível que tenha morrido? Alguém, em algum lugar, meteu os pés pelas mãos”.

A grande maioria dos cientistas, médicos e estudiosos ainda se distancia de sonhos explícitos com a imortalidade sob a alegação de que estão tentando superar este ou aquele problema específico. No entanto, como a velhice e a morte são o resultado de problemas específicos, e nada além disso, não existe um ponto no qual médicos e cientistas irão se deter e declarar:”Até aqui, e nenhum passo a mais. Já superamos a tuberculose e o câncer, mas não vamos erguer um só dedo para combater o Alzheimer.  As pessoas poderão continuar a morrer desse mal.” Não se afirma na Declaração Universal dos Direitos do Homem que os humanos têm direito à vida até os noventa anos”. O que se diz é que todo ser humano tem direito à vida. Ponto. Esse direito não é limitado por um data de vencimento.

Nesta altura, uma minoria crescente de cientistas e pensadores segue falando mais abertamente sobre o assunto nos dias correntes e declara que a principal empreitada da ciência moderna é derrotar a morte e garantir aos humanos a juventude eterna. Exemplos notáveis são o gerontologista Aubrey de Grey e o polímata e inventor Ray Kurzweil (ganhador da Medalha Nacional dos Estados Unidos para Tecnologia e Inovação em 1999).  Em 2012, Kurzweil foi nomeado diretor de engenharia no Google, e um ano depois o Google lançou uma subcompanhia chamada Calico, cuja missão declarada é “resolver a morte”.  Recentemente o Google nomeou outro verdadeiro crente na imortalidade, Bill Maris, para presidir o fundo de investimento Google Ventures. Em uma entrevista concedida em janeiro de 2015, Maris disse: “Se vocês me perguntarem hoje se é possível viver até os quinhentos anos, a resposta é sim.” (Continua)            

Advogado de empresas (OAB/AM 436). Ex-funcionário do Banco do Brasil, designado como Fiscal Cambial junto a agências bancárias locais, comissionado a ordem do Banco Central. Cursou Comunicação Social (Jornalismo); Contabilidade e Lecionou História Geral.  

Bosco Jackmonth

* É advogado de empresas (OAB/AM 436). Contato: [email protected]
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