ABORDAGEM HISTÓRICA SOBRE O PORVIR (XVI)

Em: 5 de outubro de 2022

Bosco Jackmonth*

Sequenciando os dizeres anteriores postos nesta estação de escritos semanais, a rigor quase liturgicamente em volta da publicação de outro livro, ora cabe a presente manifestação que gira em sintonia com o texto inventariado. Assim.

Acreditar que poderíamos viver para sempre! E se tivéssemos um começo melhor tipo adotarmos metas mais modestas, como duplicar a expectativa de vida?  Sabe-se, no século XX quase a duplicamos — a expectativa de vida passou de quarenta para setenta anos –; logo, no século XXI, poderíamos ao menos tornar possível uma nova duplicação e chegar aos 150. Ainda que o algarismo esteja muito aquém da imortalidade, seria uma conquista a revolucionar a sociedade humana. Sucede, de saída, estrutura familiar, matrimonio e relações entre pais e filhos seriam transformados. É consabido que as pessoas, hoje em dia, ainda esperam ficar casadas “até que a morte as separe”, e boa parte da vida gira em torno de ter e criar filhos.

Tentemos, agora, imaginar uma pessoa com 150 anos de idade. Se se casasse aos quarenta, ela ainda teria 110 anos pela frente. Seria realista esperar que um casamento durasse 110 anos?  Até mesmo os fundamentalistas católicos veriam isso como um obstáculo. Em decorrência, a tendência atual de casamentos em série provavelmente se intensificaria. Uma pessoa que tem dois filhos aos quarenta anos, quando completar 120, é lhe apenas uma remota lembrança dos anos que dedicou à sua criação – um episódio menor em sua longa vida. Logo, difícil considerar que tipo de relação pais-filhos poderia se desenvolver em tais circunstâncias. Não, ou não? Carreiras profissionais, quanto a elas! Sim?  De plano, atualmente, estuda-se para se ter uma profissão da adolescência até pouco mais de 20 anos; depois, passa-se o resto da vida atuando nessa atividade. Obviamente existe um aprendizado mesmo quando se está com quarenta ou cinquenta anos, mas a vida costuma-se dividir-se em um período de aprendizagem seguido de um período de trabalho. Isso não vai funcionar se as pessoas começarem a viver os 150 anos, sobretudo em um mundo constantemente sacudido por novas tecnologias. As carreiras serão muito mais longas e será preciso se reinventar de novo e de novo, mesmo aos noventa anos. Que coisa, não?

A propósito, ao mesmo tempo as pessoas não vão se aposentar aos 65 anos nem vão abrir caminho para a nova geração trazendo ideias inovadoras e suas aspirações. Consta que numa citação famosa, o físico Max Planck afirmou que a ciência avança de funeral em funeral. Ele quis dizer que somente quando uma geração desaparece é que surgem novas teorias com uma chance de erradicar as antigas. Isso se aplica não somente às ciências.  Pense por um momento em seu lugar de trabalho. Não importa se você é um acadêmico, um jornalista, um cozinheiro ou um jogador de futebol. Como você se sentiria se seu chefe tivesse 120 anos, suas ideias tivessem sido formuladas quando a rainha Vitória ainda governava, e sabendo que ele provavelmente permaneceria como chefe por mais algumas décadas?

Os resultados, na esfera política, poderiam ser ainda mais sinistros. Será se gostaria de se ver Vladimir Putin circulando por aí por mais noventa anos? Melhor pensando, se as pessoas tivessem os 150 anos, Stálin ainda estaria em Moscou, em 2016, governando firme e forte aos 138 anos; o presidente Mao estaria na meia-idade, com 123, e a Princesa Elizabeth estaria sentada esperando para herdar o trono de um Jorge VI com 121 anos. Seu filho, o príncipe Charles não chegaria a reinar antes de 2076.      

Voltando ao domínio da realidade, estamos muito longe de qualquer certeza de que as profecias de Kurzweil e de Grey, citadas no estudo anterior, se realizarão em 2050 ou em 2100. Opine-se de que as esperanças da juventude eterna no século XXI são prematuras, e quem as leve demasiado a sério está sujeito a sofrer um amargo desapontamento. Por fim, não é fácil viver com a consciência de que vamos morrer, mas é muito pior acreditar na imortalidade e constatar que tudo se tratava de um equívoco. Tem mais… (Continua). 

Advogado de empresas (OAB/AM 436). Ex-funcionário do Banco do Brasil, designado como Fiscal Cambial junto a agências bancárias locais, comissionado a ordem do Banco Central. Cursou Comunicação Social (Jornalismo); Contabilidade e Lecionou História Geral.

Bosco Jackmonth

* É advogado de empresas (OAB/AM 436). Contato: [email protected]
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