Bosco Jackmonth*
Sabe-se que embora a duração média de vida se tenha duplicado nos últimos cem anos, desarrazoado pensar mais além e concluir que é possível duplicá-la novamente para esbarrar nos 150 anos do próximo século. Tenha-se que a expectativa de vida global em 1900, não excedia os quarenta anos porque jovens morriam de subnutrição, doenças infecciosas e violência. Sucede, quem escapava à fome, à peste e à guerra poderia chegar a viver até os setenta ou oitenta anos, que é a duração de vida natural do Homo sapiens. Ao contrário do que em geral se supunha, em séculos anteriores os septuagenários não eram considerados aberrações da natureza. Galileu Galilei morreu com 77 anos, Isaac Newton com 84, e Michelangelo viveu 88 anos, sem ajuda de antibióticos, vacinas ou transplante de órgãos. De fato, mesmo os chimpanzés na selva podem ter seis décadas de vida.
Dá-se na verdade, até o presente a medicina não prolongou o tempo de vida natural do ser humano em um ano sequer. A grande conquista foi nos salvar da morte prematura e possibilitar que usufruamos da plenitude da existência. Ainda que o câncer, a diabetes e outros grandes assassinos possam ser vencidos, poderíamos nos estender até os noventa anos – mas isso não seria suficiente para nos levar aos 150, muito menos aos quinhentos anos. Para isso a medicina terá não só de realizar a reengenharia das estruturas e dos processos fundamentais do corpo humano como também descobrir a regeneração de órgãos e tecidos. Não resta claro se seremos capazes de fazer isso até 2100.
Contudo, toda tentativa frustrada de vencer a morte nos aproxima um passo do alvo, e isso vai nos dar esperança e encorajar esforços ainda maiores. Embora provavelmente a Calico, do Google, não vá “resolver a morte” a tempo de tornar imortais Sergey Brin e Larry Page (cofundadores do Google), decerto descobertas significativas em biologia celular, medicina genética e saúde humana serão realizadas. A próxima geração de googlers poderá iniciar seu ataque à morte a partir de posições mais recentes e mais efetivas. Os cientistas que gritam imortalidade” são como o garoto que gritou “lobo”: mais cedo ou mais tarde, o lobo realmente aparece.
Durante a nossa existência ainda que não conquistemos a imortalidade, a luta contra a morte será ainda o projeto emblemático do próximo século. Conjugue-se à nossa crença na santidade da vida humana a dinâmica do estamento científico e a esta as necessidades da economia capitalista, e a guerra implacável contra a morte parece inevitável. Nosso compromisso ideológico com a vida humana nunca permitirá que simplesmente aceitemos a morte. Enquanto a morte for motivada por alguma coisa, estaremos empenhados em superar suas causas.
Entendimentos como o estado científico e a economia capitalista ficarão mais do que felizes em endossar esse empenho. A maior parte de cientistas e banqueiros não se importa com o que estão trabalhando, contanto que isso lhes ofereça oportunidade de fazer novas descobertas e obter maiores lucros. Pode imaginar alguém um desafio maior do que driblar a morte – um mercado mais promissor do que o da juventude eterna? Se você tem mais de quarenta anos, feche os olhos por um minuto e tente se lembrar do corpo que tinha aos 25. Não se concentre em sua aparência, mas acima de tudo em como era senti-lo. Você estaria disposto a pagar quanto pela oportunidade de ter aquele corpo de volta? Sem dúvida, algumas pessoas não se importariam com isso, mas muitas outras estariam dispostas a pagar grandes quantias, constituindo um mercado quase infinito. (Continua)
Advogado de empresas (OAB/AM 436). Ex-funcionário do Banco do Brasil, designado como Fiscal Cambial junto a agências bancárias locais, comissionado a ordem do Banco Central. Cursou Comunicação Social (Jornalismo); Contabilidade e Lecionou História Geral.