Amazônia: desafios da complexidade

Em: 17 de setembro de 2023

Fico apreensivo quando alguns debates importantes se tornam reducionistas. Lembrando o que nos ensina o filósofo francês Edgar Morin, para questões complexas não existem soluções simples, ou melhor dizendo, simplórias. A Amazônia não é uma região em que se possa padronizar as atividades econômicas como se um tipo ou dois de “solução” pudessem resolver os problemas de um ecossistema imenso e tão diversificado. A Amazônia é como se fosse um outro país dentro do Brasil do ponto de vista social, geográfico e logístico. A evolução da economia, especialmente nos grandes centros como Manaus e Belém, não ocorreu de modo que incrementasse, de fato, o imenso potencial da biodiversidade amazônica, salvo algumas exceções. Do extrativismo à indústria 4.0 há um itinerário errático, às vezes com resultados de curto prazo, mas desconexos da possível construção de um novo sistema econômico, que combine modelos diversos, mas que estejam integrados sob a égide comum do binômio de desenvolvimento com sustentabilidade. 

A discussão “simplista” desta temática pode representar um discurso fácil, mas enganoso e mistificador. Há que compreender a importância do capital humano da Amazônia. Trata-se dos pesquisadores e cientistas das nossas universidades e institutos de pesquisa, os técnicos de gestão e de planejamento do poder público, os profissionais da educação, saúde e inclusão social, as lideranças comprometidas com algo mais do que o poder e/ou o lucro imediato, os empreendedores que também se voltam para o futuro das novas gerações e tantas outras pessoas que podem e desejem contribuir. É preciso que estejam dispostas a colaborar no propósito comum de apresentar as perguntas certas, para obtermos respostas adequadas. Um debate que deve estar acima das divisões partidárias, religiosas e culturais.

A compreensão do tamanho do desafio é o primeiro desafio. Escamotear a verdade não ajuda, atrapalha. Ficar somente no diagnóstico do desalento, seja da destruição ambiental, seja dos escandalosos indicadores de desigualdade social e exclusão dos mais vulneráveis, também não é suficiente. No entanto, a indignação sincera contra esta situação de descalabro pode servir para desencadear uma reação em cadeia na direção de um processo de mudança deste vergonhoso status quo da maior parte da região, incluindo as grandes capitais. Metrópoles como Manaus e Belém, que são recordistas de violência, abismo social entre os mais ricos e os mais pobres, com o  desemprego, subemprego, marginalização, déficit habitacional e destruição ambiental, como a dos igarapés e florestas urbanas, dentre outras mazelas.

Quando me refiro ao “simplismo” de soluções “fáceis” também coloco em evidência algumas questões postas como  grandes discussões temáticas para responder aos dilemas de um futuro digno para as populações da Amazônia, a região com maior biodiversidade de recursos hídricos e minerais e de flora e de fauna do planeta! Ou seja, a região potencialmente mais rica da Terra, a que mais presta serviços ambientais para a pluviosidade no Centro, Sudeste e Sul do Brasil e que é fundamental no sequestro de carbono, diante da enorme ameaça das mudanças climáticas em nível mundial. Ou seja, a Amazônia, por si, apesar de todos seus graves problemas sociais e ambientais, é muito importante para o Brasil e para o mundo. Mas infelizmente, a maioria absoluta dos brasileiros ignora o óbvio: Amazônia não é um problema para o país, e sim uma solução. 

Ser a priori a favor ou contra as ongs, a favor ou contra a agricultura e a pecuária, a favor ou contra os investimentos em infraestrutura, a favor ou contra o extrativismo, a favor ou contra as novas tecnologias…. Essas questões podem ser importantes, se levadas à sério, mas caso contrário servem apenas para escamotear a realidade. Senso comum pode ser bem diferente do bom senso. Aliás, bom senso parece estar se tornando raro nos debates políticos e sociais do Brasil.

Penso que primeiro é necessário conhecer os diferentes ecossistemas da Amazonia… Conhecer inclusive as experiências exitosas, mas ainda esparsas e rarefeitas, por conta de dificuldades logísticas, ausência de atratividade empresarial, educação deficiente. O que se constata é a óbvia   inexistência de uma verdadeira política pública nacional e regional para o desenvolvimento sustentável da Amazônia.

Pretendo explorar esta temática desafiadora nos próximos artigos. Por enquanto sugiro que se relembre Edgar Morin, como também o saudoso Professor Samuel Benchimol. São pensadores, dentre outros, que podem nos instigar a ir além das respostas fáceis para problemas difíceis. Reconhecer a complexidade da Amazônia pode ser o primeiro passo para que se comece a decifrá-la, valorizá-la e desenvolvê-la de modo sustentável.

Luiz Castro

Advogado, professor e consultor
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