As bases da gestão emocional (parte 1)

Em: 17 de abril de 2025

Bosco Jackmonth Eu e o fenômeno RAM; os limites para a gestão da emoção. Sucede, somos condenados a ser livres, tal como defendia o existencialista Jean-Paul Sartre? Sartre foi um brilhante pensador do comportamento humano, mas não teve a oportunidade de estudar a gestão da emoção, o processo de construção de pensamentos e seu sofisticado registro.
Diante do cardápio da liberdade, temos muitas opções, mas precisamos saber que, na base do funcionamento da mente, jamais seremos plenamente livres. Só há liberdade dentro de certos limites. Por exemplo, você não tem liberdade de querer ou não que uma história seja arquivada em seu córtex cerebral, e muito menos de deletá-la ou apagá-la.
Quem estudar os bastidores da construção de pensamentos à luz da Teoria da Inteligência Multifocal, entenderá clara e convictamente que o Eu, que representa a consciência crítica e a capacidade de escolha, não consegue impedir o registro dos pensamentos e emoções nem apagar o lixo psíquico que já foi arquivado. Os processos de arquivamento cerebral são inconscientes e involuntários. E só podem ser deletados através de injúria física, como um acidente vascular cerebral, trauma craniano, tumor cerebral, degeneração do córtex.
Assegura o autor que ao analisar seus pacientes, em milhares de sesões de psioterapia e consultas psiquiátricas, bem como avaliar o movimento dos construtores da própria mente, convenceu-se de que o registro dos pensamentos, sejam lúcidos ou estúpidos, e das emoções, sejam prazerosas ou dolorosas, não depende da vontade consciente do Eu. É, portanto, um processo automático e invonluntário, realizado por um fenômeno inconsciente,que, como já vimos, chamou-se de RAN. Somente esse fenômeno é capaz de mudar quase tudo o que pensamos sobre nossa espécie.
Se você não gosta de alguém, esse alguém provavelmente irá “dormir” com você. É alta a chance de ele ser registrado em sua memória como uma janela traumáutica poderosa, killer duplo P. As relações sociais são tão complexas que frequentemente produzem injúrias, calúnias, traições, decepções. E a maneira mais eficiente de trazer um desafeto para a nossa convivência diária é querer anulá-lo em nossa história.
Cada vez que pensar nele, voce estimulará uma nova ação do fenômen RAM, que o registrará de novo, formando um conjunto de janelas killer, um núcleo traumático de habitação do Eu. Nós adoecemos não apenas pelo trauma original, como Freud imaginava, mas, e principalmente , pela retroalimentação do trauma. Você não tem o poder de evitar o registro das experiências traumáticas — portanto, não está condenado a ser livre como Sartre pensava nem a ser autônomo como Paulo Freire sonhava –, porém tem o poder de decidir nutri-las ou não.
Você não tem o poder de evitar alguns “inimigos”, contudo tem o poder de encorpá-los ou emagrecê-los, torná-los monstros ou simples seres humanos que o feriram porque são pessoas feridas. Um algoz ou carrasco pode machucar um ser humano por meio de abusos, abandono, privações,ofensas públicas, humilhação, mas a construção de um núcleo de habitação do Eu só ocorre se o Eu for passivo em vez de atuar como gestor da emoção, uma das mais importantes ferramentas da gestão da emoçãoé saber que o trauma primordial, a primeira janela killer, depende do algoz, entretanto as demais dependem da omissão ou permissão do Eu.
Como a educação clássica não treina o Eu para ser gestor da mente humana, centenas de milhões de pessoas adoecem psiquicamente. Suicídios são cometidos, assassinatos são promovidos, mágoas são cultivadas, guerras são deflagradas diante de um Eu omisso, que não sabe se proteger, que é um péssimo consumidor emocional. Trilhões de dólares são gastos em consequência de acidentes de trabalho, baixa produtividade, conflitos socioprofissionais, absenteísmo, tratamentos médicos — tudo por conta da deficiência na gestão emocional do Eu. E isso sem contar o débito mais importante: o sofrimento humano, das crianças aos adultos.
Você pode achar péssima a falta de liberdade de ter ou não uma história. Mas, sem a colcha de retalhos dessa história arquivada no córtex cerebral, você não teria conxciência existencial, não saberia quem é, não teria uma personalidade ou uma identidade. São milhões de estímulos anuais. A única possibilidade de impedir a ação desse fenômeno é desviar o foco do sistem sensorial, tapar os ouvidos, fechar os olhos ou sair de sena. No entanto não dá para fugir da realidade social. Não é possível mudar de planeta nem viver completamente isolado. Os eremitas podem escapar do teatro social, mas não do teatro psíquico; podem fugir de desafetos sociais, mas não dos inimigos construidos em sua mente.(Continua).

É advogado (OAB/AM 436). Cursou Direito, Contabilidade, Comunicação Social (Jornalismo).Ex-func.BEA e Bco,Brasil. Lecionou História. Articulista.Contato: [email protected]

Bosco Jackmonth

* É advogado de empresas (OAB/AM 436). Contato: [email protected]
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