TRANSIÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS:
A transição dos benefícios fiscais, incluindo os incentivos regionais como os da Zona Franca de Manaus (ZFM), é tratada principalmente no artigo 371 do PLP n. 68/2024. Esta transição não se confunde com a transição integral da reforma tributária, prevista para várias etapas até o ano de 2073, com a extinção total do IPI. Assim, os principais pontos sobre o tema são:
Artigo 371: O artigo estabelece a possibilidade de compensação de benefícios de ICMS pelo Fundo de compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais (criado pela reforma tributária) até 31/12/2032, para titulares de benefícios fiscais – relativos ao ICMS – regularmente concedidos até 31/05/2023, sem prejuízo de prorrogações ou renovações. Aplica-se a programas ou benefícios que tenham migrado devido a mudanças na legislação estadual entre 31/05/2023 e a promulgação da Emenda Constitucional nº 132, de 2023, o que não se refere especificamente a benefícios derivados da ZFM, mas presentes na legislação estadual de todo o país.
CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS:
Como a maioria dos dispositivos acerca de benefícios fiscais tratam de situações genéricas, aplicáveis a todo o país, desatrelados, então, da necessária ênfase à competitividade loca da ZFM, o aproveitamento de créditos tributários derivados da incidência não cumulativa dos novos tributos segue o mesmo caminho, atingindo a ZFM da mesma forma que outros benefícios fiscais existentes nas demais regiões do Brasil. Neste tocante, porém, alguns dispositivos chave tratam de benefícios específicos atribuídos à ZFM:
- Artigos 83 a 99: Relacionam-se aos regimes aduaneiros especiais, como o regime aduaneiro especial de trânsito aduaneiro, depósito, permanência temporária e aperfeiçoamento, prevendo a suspensão da incidência da CBS e do IBS em certas operações. Isso impacta positivamente a ZFM, ao permitir que empresas se beneficiem desses regimes sem incidência imediata dos tributos, aproveitando créditos em operações futuras. Mas, como a ZFM, todas as outras regiões beneficiadas hoje por regimes aduaneiros especiais, seguirão sendo beneficiadas em relação aos novos tributos, não havendo qualquer diferencial para a ZFM.
Estes dispositivos também tratam da manutenção de regimes aduaneiros especiais, como admissão temporária e drawback, que são relevantes para as operações da ZFM, permitindo a suspensão da incidência da CBS e do IBS sobre tais operações.
- Artigo 80: Em particular, o projeto menciona que as exportações de bens e serviços da ZFM para o exterior serão imunes ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), assegurando a esses contribuintes a apropriação e utilização dos créditos relativos às operações nas quais sejam adquirentes de bens ou serviços.
- Artigos 431 e seguintes: O projeto prevê a manutenção de crédito presumido do IBS para empresas instaladas na ZFM. Esses créditos podem ser utilizados para compensar débitos do mesmo imposto. Porém, as alíquotas de cálculo dos créditos presumidos serão determinadas pelo Comitê Gestor do IBS (art. 433, §3º). A bancada amazonense na Câmara pleiteou alteração no PLP, para que estas alíquotas já estivessem dispostas na própria Lei Complementar oriunda do projeto de forma específica, o que conferiria a necessária previsibilidade ao sistema, mas esta emenda não foi acatada, estabelecendo, o PLP n. 69/2024, que o crédito presumido será definido de forma a equivaler ao benefício concedido pelo Estado do Amazonas ao ICMS.
- Artigos 428 e 430: Nestes dispositivos, o PLP 68/2024 aborda benefícios fiscais específicos para a empresas regularmente inscritas na ZFM como incentivadas, especialmente quanto à incidência de alíquota zero do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) nas operações originadas fora da ZFM e para esta se destinem. Além disso, o projeto prevê crédito presumido de IBS na aquisição de bens industrializados de origem nacional (art. 430) por empresas do Polo Industrial de Manaus. Se os bens não forem utilizados no processo de industrialização na ZFM, o contribuinte deverá recolher o IBS e a CBS com os acréscimos legais cabíveis, visando evitar a sonegação de tributos.
- Artigo 446: Em relação a crédito estímulo de IBS, o PLP 68/2024 estabelece apenas que as indústrias incentivadas pela ZFM terão direito a um crédito presumido (e não crédito estímulo) de IBS sobre as vendas de produtos fabricados na região, equivalente a 6% do valor da operação. A bancada amazonense na Câmara pretendeu que o crédito estímulo de IBS estivesse consignado expressamente no PLP 68/2024, sendo equivalente ao benefício concedido atualmente pelo Estado do Amazonas sobre o ICMS, variando entre 55% a 100% sobre o valor do imposto apurado, dependendo do tipo de mercadoria, o que conferiria maior grau de previsibilidade e segurança jurídica para as operações realizadas na região. A emenda, no entanto, não teve sucesso na Câmara Federal.
Para mitigar os inegáveis impactos negativos da reforma tributária para a Zona Franca de Manaus, especialmente aqueles já trazidos pela Emenda Constitucional n. 132/2023 e com Projeto de Lei Complementar (PLP) n. 68/2024, agora, em trâmite no Senado Federal, algumas medidas de proteção às operações regionais podem ser consideradas para a votação nesta Casa.
Cláusulas de Transição: Implementação de cláusulas de transição além dos prazos consignados pela EC n. 132/2023, que garantam a manutenção de benefícios fiscais exclusivos por um período determinado até que sobrevenham novos caminhos econômicos para o desenvolvimento da região.
Incentivos Regionais Específicos: Criação de mecanismos específicos, regionalizados, para concessão de incentivos fiscais para empresas do Polo Industrial de Manaus, ou mesmo para manter os incentivos fiscais na ZFM dentro do novo sistema tributário, com vistas a proporcionar o equilíbrio entre as regiões do Brasil.
Políticas de Desenvolvimento Regional: Fortalecimento de políticas internas de desenvolvimento regional para compensar a perda de competitividade da ZFM e o consequente estancamento do desenvolvimento da região.
Os dispositivos aqui abordados são relevantes para a compreensão de como os incentivos regionais – nestes, inclusos os da Zona Franca de Manaus – poderão ser mantidos, ajustados ou até mesmo extintos com a nova legislação tributária. Em quaisquer dos casos, necessário perquirir os verdadeiros reflexos para a região em relação à competitividade no mercado nacional e estrangeiro, considerando uma certa universalidade de incentivos ou benefícios fiscais, pretendida pela reforma tributária, que infelizmente não considera regionalismos, nem as dificuldades de realização de operações comerciais de uma ou outra região do país, menos ainda o próprio desenvolvimento irregular destas regiões, sendo marcante o elevado fluxo econômico de alguns Estados em comparação aos parcos recursos experimentados por outros, o que decorre da má distribuição de riqueza, característica brasileira.
Por fim, a implementação do PLP 68/2024 deve ser acompanhada de perto para garantir que os interesses da ZFM sejam concretamente protegidos além da sua previsão constitucional de existência. É importante que os detalhes específicos sobre a manutenção e adaptação dos incentivos fiscais sejam claramente definidos para evitar qualquer prejuízo ao desenvolvimento econômico da região. Imprescindível, portanto, que a população acompanhe de perto a evolução das propostas de lei e participe ativamente dos debates, para garantir que os interesses da região sejam considerados, e não haja perda real de competitividade da região.