Breno Rodrigo de Messias Leite*
O acrônimo BRICS, a abreviação das iniciais de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, é o maior tijolo da globalização e um desafio sistêmico na nova ordem internacional. Como um órgão de cúpula de coordenação estratégica e de ajuda multilateral, o BRICS representa a inserção de novos países na inovadora geografia comercial, diplomática e militar no século XXI. Dentre os propósitos internacionais do grupo está a coordenação de encontros anuais de cúpula entre os chefes de Estado e as equipes ministeriais, ampliação das agendas nas organizações internacionais e regionais, bem como a cooperação técnica em setores estratégicos das economias dos países membros do bloco.
Por não se trata, contudo, de um organismo de integração regional, tal como o MERCOSUL, a União Europeia ou o NAFTA, por exemplo, o BRICS tem toda a mobilidade diplomática necessária para promover acordos de natureza bilateral e multilateral entre os países membros e seus parceiros estratégicos, sobretudo os parceiros do Sul Global.
Os países do BRICS criam sofisticados mecanismos diplomáticos que favorecem o diálogo e os processos de governança financeira e econômica, o que inclui a reforma das regras do Fundo Monetário Internacional (FMI) e as negociações mais enérgicas com o G-20 (os vinte países mais ricos do mundo) e o G-7 (o núcleo econômico da OTAN). Assim, as ações efetivas do BRICS dizem respeito, sobretudo, aos processos de cooperação no setor financeiro, suspensão de entraves à importação e à exportação de mercadorias e de investimento internacionais de monta. Mas não só. A governança diplomática prioriza também mudar as regras dos organismos internacionais e expandir o poder de agenda dos países no Conselho de Segurança das Nações Unidas, hoje constituída pelas potências vencedoras da Segunda Guerra.
Vale lembrar que a presença brasileira no BRICS traz evidentes vantagens para a economia nacional, bem como para as projeções regionais e internacionais do país em um mundo com mercados cada vez mais diversificados e competitivos.
Vejamos, portanto, algumas vantagens:
- Acesso a mercados internacionais localizados estrategicamente em diferentes continentes (África, Ásia, Oriente Médio, Eurásia), ampliando ainda mais o alcance comercial e geopolítico do país;
- Parceria financeira, comercial e política com as economias emergentes mais importantes no mundo de hoje;
- Estreitamento de parcerias setoriais com a China que, segundo muitos analistas, se tornará, em alguns anos, a maior economia do mundo.
De sorte que já não resta mais dúvida de que o Brasil, além de ser um natural líder regional, sobretudo na América do Sul, tornou-se verdadeiramente um global player, introduzido nos principais fóruns internacionais, e um ator internacional capaz de moldar o novo mapa da globalização, em especial a globalização do Sul Global e das economias emergentes.
Diante de tais fatos, destaco algumas iniciativas na área comercial que considero importantes: encontros de autoridades ligadas à agricultura, à cooperação de bancos de fomento e desenvolvimento, aos fóruns empresariais, à saúde, à ciência e tecnologia, entre outros. Os acordos na área financeira são importantes à medida que melhoram o clima de circulação de investimentos internacionais. Criação de Bancos de Desenvolvimento, acordos para negociação coletivas na Rodada de Doha, estratégias comuns nas áreas de infraestrutura, matriz energética, logística, aeroportos, turismo e educação.
Os acordos político-diplomáticos com a China são muito importantes para a economia brasileira e para as relações internacionais do país. A China já é a segunda maior economia do mundo, com forte poder de demanda de recursos naturais (expansão exponencial do mercado consumidor), em especial das commodities agrícolas. Com esta abertura internacional, o Brasil pode demandar cada vez mais commodities agrícolas, minerais, petróleo, entre outros produtos para o mercado chinês.
Mas esta aproximação com a China poderia causar ou incentivar a desindustrialização do Brasil?
Em termos econômicos, um país em si não causa diretamente a desindustrialização de outro. A opção pela industrialização, de fato, cabe à estratégia nacional de desenvolvimento de cada Estado, que procura maximizar seus interesses nas arenas nacional e internacional. Vale lembrar que a desindustrialização brasileira é provocada fundamentalmente por políticas nacionais – variáveis adversas internas superam largamente as externalidades – equivocadas causadas por:
- Custo Brasil;
- Infraestrutura precária;
- Carga tributária desproporcional;
- Assimetrias no desenho federativo;
- Investimentos ineficientes em educação técnica;
- Barreiras alfandegárias protecionistas.
A despeito de seu regime político amplamente autoritário e centralizado – regime de partido único –, pautado naquilo que os analistas chamam de Consenso de Pequim, a China tem obtido sucessos econômicos extraordinários nas últimas décadas, o que a credencia a ser a maior economia do mundo nos próximos anos, ao passo que o Brasil tem consolidado paulatinamente uma democracia constitucional, mas ainda patina em agendas macroeconômicas atrasadas, incapazes de superar a persistente desigualdade social.
*é cientista político