A publicação em 21 de maio último, do Decreto nº 42.306 pelo Governo do Amazonas, que dispõe sobre a decretação de emergência ambiental na Região Metropolitana de Manaus e nos municípios integrantes da Região Sul do Estado, ressalta outra crise silenciosa – a do controle ambiental, que há tempos o Amazonas não encara de frente.
O silêncio e abandono das autoridades políticas, há pelo menos uma década, evidenciam o compadrio e a solidariedade delas com o impacto negativo do desmatamento ilegal, das queimadas não autorizadas e demais crimes correlatos que, mais uma vez, evidenciamos no primeiro trimestre de 2020. E olha que, sendo o chuvoso, nem é o período do ano onde tais crimes encontram facilidades logístico-operacionais.
“E daí? Meio ambiente é tema de comunistas…” diriam os desenvolvimentistas. “Vamos aproveitar o momento da pandemia para desregulamentar e passar a boiada do progresso de interesses difusos…”, diria o ministro de Meio Ambiente Ricardo Sales.
Afinal, para que um Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA? Para que orçamento às atividades de controle ambiental que exigem licenciamento, monitoramento e fiscalização ambientais?
Em um dos artigos de fevereiro neste jornal, transcrevi o apelo dos servidores públicos do IPAAM, manifesto na abertura dos trabalhos legislativos da Assembleia em 2020: IPAAM – 06 ANOS SEM DATA BASE SALARIAL; 11 ANOS SEM PROGRESSÃO FUNCIONAL; 40 ANOS SEM APOSENTADORIA JUSTA!
Muito mais que um movimento reivindicatório, aqueles que estão na linha de frente do controle ambiental no Amazonas nos alertavam sobre o apagão que se avizinhava e que hoje vivemos no Estado, em nosso sistema e política ambientais.
Sem concursos públicos, com salários defasados e condições de trabalho, administrativas e de campo, insalubres e penosas, o Governo vem empurrando com a barriga sua função constitucional de promover o controle ambiental das atividades econômicas, prevista em todo o Capítulo XI – do Meio Ambiente – da Constituição Estadual, artigos de 229 a 241.
Com processos de licenciamento anacrônicos, a história e o protagonismo da política de meio ambiente no Amazonas vêm se perdendo entre traças, armazenamentos obsoletos, sistemas e banco de dados contratados e recontratados que nunca operaram, e unidades de conservação instituídas e desprotegidas.
Mas, nada é mais grave que a aposentadoria e morte de funcionários públicos de carreira, sem a devida transferência do conhecimento e expertise aos novos, que os deveriam substituir, em interesse do Estado, mas, nunca chegaram, por interesse de governos.
É dessa forma que o Estado do Amazonas vem exterminando, definitivamente, sua inteligência ambiental. Incapaz, como vimos no combate a pandemia e na promoção de saúde, o governo vê passivo e sem políticas efetivas, os números de crimes ambientais crescerem.
E por que crescem?
Sem planejamento, orçamento e recursos humanos competentes ao exercício do controle ambiental, não há fiscalização e monitoramento ambiental. O Sistema Estadual de Meio Ambiente vem sendo tocado no Amazonas como um contrato de empreitada.
Há mais cargos comissionados, terceirizados e estagiários na Secretaria de Meio Ambiente e no IPAAM que funcionários públicos. Ao que se sabe, na Secretaria, desde que se chamava SDS, parece nunca ter havido concurso público.
Ressalta-se que o artigo 5º do Decreto nº42.306 perpetua este crime administrativo, infelizmente, com a anuência do nosso Tribunal de Contas e Ministério Público Estadual.
É importante estar de olho quando se decreta ‘emergência’ ambiental por fato que, repetidamente, a cada ano, vem acontecendo, resultado da falta de competência administrativa. Ou será que buscam com o decreto o oportunismo das justificativas/facilidades aos procedimentos burocráticos públicos?
Talvez esteja na hora da Assembleia Legislativa pensar o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas – IPAAM como único, forte e eficaz órgão regulador do meio ambiente do estado: aprovando um concurso público que absorva o passivo de recursos humanos que se avoluma; instituindo um plano de cargos e carreiras que prevejam salários dignos ou, pelo menos, paritários às condições dos servidores públicos federais; e, exigindo o desenvolvimento de um controle ambiental transparente, em plataformas tecnológicas disponíveis a todos, empresários, gestores e ao cidadão comum, que agilize o licenciamento e fomente uma inteligência remota na fiscalização dos crimes ambientais e monitoramento das atividades econômicas.
Há de se enaltecer o recente trabalho do IPAAM, com todas as suas limitações orçamentárias e administrativas, na busca de uma competência digital. Participei, como analista ambiental do Órgão, nesta segunda feira (25) da apresentação operacional dos sistemas informatizados de licenciamento e análise ambiental. Quero parabenizar o esforço coletivo do Instituto, em nome do coordenador do trabalho e Servidor Público, Sheron Vittorino da Silva, em buscar soluções tecnológicas internas ao aperfeiçoamento do papel do Estado no controle ambiental.
Contudo, não podemos esquecer que, por detrás das máquinas, computadores e imagens de satélite, existem pessoas que acreditam, por seus trabalhos, na conservação do meio ambiente e na sustentabilidade nas atividades econômicas no Amazonas. Sem o devido respeito aos nossos Servidores Públicos caminhamos ao caos nos setores da saúde e ambiental em pleno desgoverno.
*Daniel Borges Nava é geólogo, analista ambiental e professor doutor em Ciências Ambientais e Sustentabilidade na Amazônia
Fonte: Daniel Nava