7 de setembro de 2024

Cidades amazônicas em chamas 

O desmatamento e as queimadas na Amazônia em 2023 são recorrentes e geram uma crise sem precedentes, com céu encoberto, ar irrespirável e calor sufocante. Este artigo, primeira parte de uma série, investiga as origens desses focos de destruição e poluição ambiental.

Há décadas, os cientistas e organizações respeitáveis chamam a atenção sobre os perigos das mudanças climáticas, convocando governos para trabalhar com planos sustentáveis visando acelerar o uso de combustíveis e tecnologias limpas, promover o transporte mais limpo, construções com eficiência energética e planejamento urbano.

Essas ações são urgentes pois as estatísticas são assustadoras. Por exemplo, em relação à poluição do ar:

a) Segundo a OPAS, mais de 90% das crianças do mundo respiram ar tóxico todos os dias. Em 2016, cerca de 600 mil crianças e menores de 15 anos faleceram por conta da poluição do ar exterior e interior <https://tinyurl.com/326nkym8>. Além disso, em 2022, a OPAS alertou que quase toda a população do mundo (99%) está respirando ar que excede os limites de qualidade recomendados pela OMS <https://tinyurl.com/mwt6fvus>;

b) Segundo a ONU, a poluição do ar é um “assassino silencioso” que mata cerca de 7 milhões de pessoas por ano, incluindo as 600 mil vítimas citadas acima. A cada hora, cerca de 800 pessoas morrem de câncer e de doenças respiratórias e cardíacas, causadas diretamente pela inalação de ar poluído <https://tinyurl.com/mr3kb4f7>.

Tanto a OPAS quanto a ONU e a OMS têm lançado previsões e recomendações para que os países se preparem para ondas de calor <https://tinyurl.com/38fvdu2p> e para combater a poluição do ar <https://tinyurl.com/3kke6j6d>. 

No Brasil, depois dos familiares, os nossos profissionais da saúde são os que mais sofrem com o aumento de casos envolvendo pacientes com problemas respiratórios, especialmente crianças <https://tinyurl.com/mv7eht28>. A situação é tão séria que desde 2021 a Associação Médica Brasileira e parceiros estão trabalhando pela iniciativa “Médicos pelo Ar Limpo” <https://tinyurl.com/mt3ffp23>, a fim de combater as mudanças climáticas e lutar pela melhoria da qualidade do ar atmosférico.

Além disso, estudo realizado pela Fiocruz e WWF-Brasil, publicado em 2021, revelou que em 10 anos o nosso país gastou quase um bilhão de reais com doenças causadas pela fumaça das queimadas na Amazônia, responsáveis pela elevação dos índices de internações hospitalares envolvendo pacientes com problemas respiratórios entre 2010 e 2020 <https://tinyurl.com/5bhyzy5e>.

Apesar de todos esses fatos e dos inúmeros prejuízos, mais uma vez o entorno da cidade de Manaus tem sofrido com calor excessivo e muita fumaça, cujos índices de qualidade do ar (em PM2.5) têm ficado acima de 150 μg/m3, considerados insalubres (151-200), muito prejudiciais (201-300) ou até mesmo perigosos (acima de 300 μg/m3) à saúde, como foi o caso do dia 11/10/23, quando registrou-se PM2.5 igual a 329 μg/m3.

Quase todos os dias de outubro e novembro de 2023 amanhecemos e anoitecemos com muita fumaça, com exceção de quando chove, e a população de Manaus fica sem saber onde estão acontecendo as queimadas e se os responsáveis estão sendo severamente punidos conforme a lei.

O Governo do Estado do Amazonas criou o Painel do Clima <https://www.paineldoclima.am.gov.br/> com informações sobre as ações de monitoramento, combate e prevenção às ações de fatores climáticos. Segundo o painel de queimadas, entre 01/08 e 31/10/23, período em que o verão amazônico é considerado forte, foram registrados 16.323 focos de calor no Amazonas, tendo como os maiores vilões os municípios de Lábrea (2209), Novo Aripuanã (1535), Apuí (1360), Boca do Acre (1107) e Humaitá (979).

Apesar da iniciativa ser boa, esse painel não dá detalhes das localizações onde esse calor é gerado, nem é transparente sobre as multas aplicadas e quem as recebeu, dificultando para a sociedade o real monitoramento dos agentes transgressores.

Diante do exposto, está sendo realizado um amplo estudo para identificar as cidades do entorno de Manaus que mais geraram fontes de calor e anomalias térmicas, a geolocalização desses emissores e o perfil do local onde a ação está acontecendo: em solo perto de rio, área desmatada, área verde perto de área desmatada, área verde perto de rio ou em área desmatada perto de rio. 

O estudo envolve as seguintes fontes e premissas.

Fonte 1) Sistema de Informações sobre Incêndio para gerenciamento de recursos da NASA <https://tinyurl.com/39t2xwp7>, um dos mais avançados do mundo, tem cerca de 12 satélites (cinco de órbita polar e sete geoestacionários) que detectam os valores de longitude e latitude de fogos ativos e anomalias térmicas em tempo quase real.

Cada satélite registra duas imagens por dia, mas por limitação de espaço, explicações técnicas sobre o Nível de Confiança (NC), a Resolução Espacial, a Temperatura de Brilho (TB) e Potência Radioativa do Fogo (PRF) medidos por cada um dos satélites sejam lidos no link <https://firms.modaps.eosdis.nasa.gov/>.

Fontes 2 e 3) Dois sistemas de geolocalização do Google, um chamado Reverse Geocoding <https://tinyurl.com/3j3k4hz4> usado para identificar no mapa a localização aproximada da latitude e longitude, e outro chamado GPS Coordinate que calcula a distância entre dois pontos <https://www.gps-coordinates.net/distance>.

Premissas) Período de análise entre 15/09 e 31/10/23; área observada dentro do raio de 300 km do Centro de Manaus; apenas imagens com fogos ativos e anomalias térmicas com média de Temperatura de Brilho (TB) do Pixel do Fogo acima de 300 Kelvin e Potência Radioativa do Fogo acima de 3 MW.

Para evitar um falso positivo, foram descartadas todas as imagens cujo marcador do pixel ficou sobre nuvens, superfícies líquidas ou que tinham Nível de Confiança abaixo de 30%.

Baseado nessas premissas, foram analisadas 2750 imagens cujo resultado apontou que o Careiro foi o campeão com 664 (24,1%) focos de fogos e anomalias térmicas, seguido por Autazes (650; 23,6%), Itacoatiara (340; 12,36%), Manaquiri (256; 9,3%), Careiro da Várzea (175; 6,36%), Manacapuru (129; 4,7%), Rio Preto da Eva (126; 4,5%), Nova Olinda do Norte (95; 3,4%), Borba (94; 3,4%), Iranduba (71; 2,58%), Manaus (69; 2,5%), São Sebastião do Uatumã (27; 0,98%), Maués (17; 0,62%), Novo Airão (17; 0,62%), Caapiranga (12; 0,43%), Presidente Figueiredo (5; 0,18%) e Silves (3; 0,10%).

Entre essas cidades, as que mais queimaram e geraram anomalias térmicas foram Nova Olinda do Norte, Autazes, Itacoatiara, Careiro, Manaquiri, São Sebastião do Uatumã e Rio Preto da Eva. Os próximos artigos revelarão mais detalhes sobre o perfil dos locais que mais emitiram calor e fumaças no entorno de Manaus. Aguardem.

Jonas Gomes

Prof. Dr. Jonas Gomes da Silva - Professor Associado do Dep. de Engenharia de Produção com Pós Doutorado iniciado no ano de 2020 em Inovação pela Escola de Negócios da Universidade de Manchester. E-mail: [email protected].

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