O Dia Internacional da Mulher, segundo uma versão, é originário do protesto de 8 de março de 1917, onde as mulheres russas não mais queriam jornadas de trabalho que, por vezes, se estendiam até 16 horas. Alguns anos antes, mulheres trancadas no trabalho foram queimadas em Nova Iorque, num incêndio criminoso, por motivos semelhantes. Se foi um ou se foram os dois acontecimentos que marcaram a data, não é tão importante, porém o trabalho das mulheres começou a ser visto com outros olhos e, passado mais de um século, a igualdade de direitos, embora conseguida legalmente, na prática não está tão consolidada.
Em 27 de janeiro de 2013 aconteceu um incêndio na Boate Kiss em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, onde morreram 242 jovens que foram se divertir. Dez anos se passaram até que os culpados fossem julgados.
No dia 8 de janeiro de 2023, mais de 1.000 pessoas foram presas porque protestavam pacificamente contra a falta de transparência nas eleições e o flagrante ativismo do Tribunal Superior Eleitoral a favor de um candidato. Passados mais de 30 dias, a maioria continua presa sem julgamento e sem defesa.
Assim como o dia da Mulher é para lembrar que tragédias nunca mais aconteçam por reivindicações de direitos, o dia dessas desgraças deveria ser lembrado para que jamais se repita. A tragédia de Santa Maria aconteceu por uma série de negligências e da conivência de autoridades responsáveis pela fiscalização que poderia garantir uma diversão segura. Seria legal estabelecer o Dia da Diversão Segura, para lembrar que brincadeira é uma coisa muito séria.
O dia da prisão de inocentes ativistas acusados de criminosas depredações, onde se fecha os olhos para não ver que foram causados por profissionais infiltrados, provavelmente pagos por aqueles que não queriam as manifestações. A inoperância das autoridades, que insistem em culpar inocentes, não parece levar em conta os vídeos que mostram os verdadeiros culpados. Quem derrubou o relógio foram duas mãos e não duas mil. Apenas para citar a acusação mais flagrantemente errônea do caso. A mordaça imposta aos meios de comunicação, a “proibição” de uma CPI para clarear os fatos visa mostrar o óbvio: é proibido questionar os deuses do Olimpo.
A permanência das prisões por um período ilegal é tão flagrante que causa espanto ver o silêncio da grande imprensa, a pusilanimidade da Ordem dos Advogados do Brasil e o marasmo da ONU. O que também provoca revolta é a inércia da maioria dos membros do Congresso Nacional para quem as prisões parecem fatos normais.
Como poderíamos marcar esta data que atropela a tudo que foi conquistado após a Constituição de 1988? Dia Nacional da Intolerância? Quando o Estado esmaga ao cidadão esquecendo todos os direitos deste em nome do Estado Democrático de Direito não poderíamos chamar de o Dia da Distorção dos Valores? Se a palavra “democracia” significa poder do povo, de que maneira o povo pode ser punido por tentar pacificamente exercer este poder?
Se por um lado, a baderna não é tolerada, por outro liberar criminosos comprovados para abrir espaço para (im)prováveis baderneiros apenas revela um Estado Ditatorial da Distorção, jamais o Estado de Direito.( Luiz Lauschner)