23 de novembro de 2024

Escolhas

Anderson F. Fonseca. Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM. 

IG: @anderson.f.fonseca    

Mês de Maio iniciando, novos desafios pela frente e alguns dilemas não tão novos assim no panorama político, econômico e jurídico de nosa terrae brasilis, isto feito pensei em refletirmos então sobre algo que nestes primeiros meses de governo federal e Estadual tem estado presente, noticiado mas quem sabe ainda desapercebido, falo das escolhas feitas pelos nossos chefes do Executivo.

É verdade que o tema comporta um sem número de variações, afinal, que escolhas seriam estas? Seriam as escolhas dos rumos econômicos? Da taxa de juros? De investimentos, planos e projetos? Não caro leitor, falo das escolhas que nos saltaram aos olhos sobre os dirigentes de alguns setores de nosso vasto serviço público.

Neste momento não é novidade que o presidente escolheu para chefiar o NBD (Novo Banco do Desenvolvimento), chamado popularmente de Banco dos BRICs sediado em Xangai na China, a ex-presidente Dilma Rousseff, dentro de suas justificativas para o preenchimento do cargo apontou que “ela é uma mulher extraordinária, digna de muito respeito, e o PT adora ela”.

Seu antecessor teria mandato até 2025, o diplomata de carreira Marcos Troyjo, antes de assumir a função foi Secretário Especial de Comércio Exterior e Relações Internacionais do Ministério da Economia, conduziu o processo de expansão do banco e a entrada de Emirados Árabes, Egito, Bangladesh e Uruguai, manteve a nota elevada da instituição junto as agências de classificação de risco, rating AA+ (superior ao dos quatro maiores bancos norte-americanos), além de ter quintuplicado os empréstimos aprovados para o Brasil, no que perde no quesito “extraordinário” mencionado pelo presidente ganha em experiência como governador suplente do Brasil no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), membro do Comitê de Desenvolvimento do Banco Mundial, além de representante em nível de diretoria em muitas outras instituições multilaterais de desenvolvimento.

Segundo informações do Ministério das Relações Exteriores o capital subscrito inicial do banco era de US$50 bilhões, atualmente chegando na cifra de US$100 bilhões, além deste aporte financeiro, a nova presidência do banco terá pela frente a tarefa de procurar a adesão e aporte dos demais parceiros para o seu funcionamento, esperamos para ver os “extraordinários” resultados.

Em giro outro mas ainda na área de Comércio Internacional, para Apex-Brasil (Agência de Promoção de Exportações do Brasil), responsável pela promoção dos produtos e serviços brasileiros no exterior e atrair investimentos estrangeiros para setores estratégicos de nossa economia, foi escolhido para ocupar o cargo máximo do órgão o ex-senador Jorge Viana (PT-AC), segundo informações do próprio órgão além de não possuir qualquer experiência prévia na área de comércio exterior, operou uma mudança no estatuto em benefício próprio ao eliminar a exigência de inglês fluente para ocupar o cargo de dirigente.

O ex-senador foi escolhido e nomeado em janeiro pelo presidente Lula, em março (ou seja já na presidência do órgão) removeu o artigo 23, parágrafo 4º do estatuto que exigia o inglês como “requisito mínimo” para ocupar a vaga, é dizer ficou três meses de forma irregular no cargo que lhe garante um salário de R$65 mil. 

Com este óbice levantado, aproveitou o ensejo e escolheu aliados sem qualquer experiência em comércio exterior para sua assessoria, casos mais intrigantes: um advogado-mochileiro, um jornalista-cantor e um arquiteto, em comum o fato de serem todos do grupo político do ex-senador no Acre.

A fim de perceber vencimentos que variam entre aproximadamente R$18 mil e R$28 mil, além da fluência na língua bretã a Apex-Brasil estabelece como pré-requisito para o cargo de assessor, pós-graduação completa ou graduação com experiência de no mínimo três anos nas áreas de atuação da agência o que, segundo apurado, nenhum deles possui.

Digno de nota o fato de que no histórico da Agência não ser fluente em inglês já ocasionou demissões, no governo antecessor ao atual o nome escolhido de Alecxandro Carreiro foi derrubado justamente por não ter passado neste critério.

Para demonstrar que os métodos de escolhas não são exclusividade de esquerda ou direita o último caso aqui mencionado diz respeito a Petrobras, tal qual o antecessor o atual governo desconsiderou recomendações das áreas de governança da empresa e no final de abril elegeu três membros para o conselho de administração que haviam sido considerados inelegíveis, dois por conflito de interesses entre suas funções governamentais e participação no órgão que define a estratégia da estatal, e o terceiro esbarrou em vedação a indicação de dirigentes partidários.

Mesmo com o alerta feito durante a assembleia de que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) poderá eventualmente entender que a escolha de candidatos considerados inelegíveis ao conselho pode ser considerada abusiva e em flagrante irregularidade, todos os três foram eleitos conselheiros da companhia.

Longe de serem os únicos exemplos de escolhas governamentais desta natureza, esta amostra já dá uma ideia a quantas andam as nomeações para posições estratégicas e chaves de nossa estrutura de Estado, critérios meramente políticos, por vezes nada técnicos, dívidas de campanha, “pagamento” de apoio, dentre outros motivos nada republicanos.

Exemplos estes que dificultam e muito não somente o avanço das instituições, mas o próprio desenvolvimento de uma política de Estado voltado para os seus próprios objetivos, levando-se em conta o mérito, o nível de estudo e a desenvoltura dos servidores ou aspirantes a servidores.

Quando muito servem somente de exemplo negativo, afinal como explicar isto para milhares de alunos que hoje sonham em entrar no serviço público nacional? aqueles que se dedicam dia e noite em estudos, com sacrifício muitas vezes financeiros, pessoais, de saúde, sabendo que a despeito de seus maiores esforços os mais altos cargos são reservados para os “amigos do rei” sem qualquer preocupação com formação, conhecimento técnico ou mesmo anos de experiência dedicados àquela específica área de atividade?

Algo muito errado não está certo nisso, desestímulo enorme ao aprimoramento, a escolha dos melhores porque são os melhores e não porque conhecem alguém que conhece alguém que pode lhes favorecer, há algo de muito sério com a perda ou fuga de “inteligências”, sim porque jovens hoje ao se depararem com esta realidade tendem a fazer uma de duas coisas, procurar seus “padrinhos”políticos ou simplesmente desistir e procurar outra opção de carreira.

Lembro-me de uma época em que ouvíamos lições de nossos pais dizendo: estude, se capacite, procure dar o seu melhor, certamente você será recompensado por seus esforços, na medida em que a atual geração imediatista permite procuro reproduzir ainda hoje estas lições em salas de aula por onde passo, contudo, tem sido cada vez mais difícil encontrar exemplos para demonstrar que há esperança e esta é uma realidade que parece cada vez mais distante.

  Há que lutar contra a “mediocracia”, há de prevalecer a “meritocracia”, havemos de nos revoltar, insurgir, ser resistentes e resilientes quando encontramos situações tais como as aqui trazidas, reclamar com nossos ditos representantes, combater o ar de “normalidade”com que essas situações são tratadas, evitar o “é assim mesmo”, mas isto, ah isto, depende em grande parte de nossas escolhas, o que temos nós escolhido? Fica a reflexão.

Anderson Fonseca

Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM

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