18 de outubro de 2024

Estados Unidos do Brazil

Até Breve Amazonino

Anderson F. Fonseca. Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM. 

IG: @anderson.f.fonseca    

Em uma semana com vários fatos relevantes a serem objeto de reflexão torna-se difícil ao articulista dedicar espaço e tempo a todos, contudo, premido pelo tempo e espaço escolhe-se aqueles que em sua visão mais chamam a atenção, sem demérito de qualquer outro,haja vista ser consenso que nesta quadra histórica em que vivemos no Brasil a cada dia temos um assunto novo e por vezes escandaloso para refletir.

Nesta semana dedicamos este espaço a tratar da recente e primeira visita do Presidente Brasileiro ao seu colega Norte-Americano e da partida do sempre Governador Amazonino Mendes, um dos maiores ícones e referências, ao lado de Gilberto Mestrinho, da política do Estado do Amazonas.

Lula e Biden se encontraram oficialmente nos dias 9 e 10 de fevereiro, em torno de muita especulação retorna nosso país ao panorama internacional, após visita a Argentina e Uruguai, presidente Lula deu passos importantes para reatar as relações com nosso irmão mais ao Norte, relações estas que em 2024 completam 200 anos de existência.

Nos quatro últimos anos o relacionamento de Brasil e EUA refletiam um certo distanciamento em vista das políticas adotadas pela extrema-direita em nosso País em contrapasso ao modelo Democrata, mais a esquerda, do governo Biden, vimos assim o espectro diametralmente oposto daquele já encontrado em nossa política externa.

A título de lembrança, no período de 1964–1969, o governo Castelo Branco abandonou a política de terceiro-mundismo, o multilateralismo e a dimensão mundial da Política Externa Independente, regredindo para uma aliança automática com os Estados Unidos e para uma diplomacia de âmbito hemisférico e bilateral.

Embasou em grande parte esta postura nacional a geopolítica típica do período de Guerra Fria, teorizada sobretudo pela Escola Superior de Guerra, com seu discurso centrado nas fronteiras ideológicas e no perigo comunista. Em troca da subordinação a Washington e do abandono da diplomacia desenvolvimentista, o Brasil esperava receber apoio econômico, ficou à época famosa a frase do chanceler Juracy Magalhães “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”, como prova desta “lealdade” nosso país rompeu relações com Cuba em maio de 1964, um gesto carregado de simbolismo a eliminar qualquer traço de “esquerdismo” de nossa política.

A fim de afastar, pelo menos do plano interno este subimperialismo, em janeiro de 1967 promulga-se a nova Constituição incorporando novas diretrizes de governo, centralizando as estruturas político-administrativas e alterando o nome do país de Estados Unidos do Brasil para o que adotados até os dias de hoje República Federativa do Brasil.

Este alinhamento somente viria a ser refeito nas décadas de 1980-1990 com o rompimento da visão diplomática do pragmatismo responsável e do universalismo, Brasil doravante passa a se identificar como país ocidental que deveria maximizar suas oportunidades individuais, em cooperação com os EUA, para chegar ao patamar do chamado primeiro mundo.

Com a implantação da visão neoliberal na “era dos Fernandos” (de Collor a FHC) tivemos uma guinada de expansão de relações levada a efeito embora de maneira mais tímida no período de governo do PT (Lula, Dilma), além do interregno de Michel Temer, sendo praticamente abandonado após a derrota de Donald Trump em sua reeleição a Casa Branca.

Hoje Brasil e Estados Unidos mantêm uma relação bilateral prestes a completar dois séculos de existência, em números divulgados pelo próprio Itamaraty o valor do comércio bilateral entre os dois países gira em torno de R$88 bilhões, recorde histórico, com aumento de 25,8% em relação a 2021, R$123 bilhões é o valor dos investimentos diretos do EUA no Brasil, sendo a maior fonte de investimento estrangeiro em nosso país, os EUA representam 11,2% das exportações brasileiras, sendo o principal destino de nossos produtos manufaturados, atualmente 1,9 milhão de brasileiros vivem nos Estados Unidos, maior contingente de nacionais fora do país.

Com todos estes números, é de se esperar que a visita feita pelo presidente Lula venha estreitar nossos laços de cooperação, sem o fantasma do “esquerdismo”, avançando a nossa balança comercial para quem sabe retomar a primazia da aliança comercial com nosso “irmão do Norte” hoje ocupado pela China.

Falando em irmão do Norte, não poderia deixar de fazer menção e render também homenagens ao Governador Amazonino Mendes que nos deixou aos 83 anos neste dia 12 de fevereiro. Gostasse ou não de seu jeito caboclo, por vezes até rude em momentos de tensão, ao tratar dos inúmeros desafios que só a política traz, este caboclo de Eirunepé, juntamente com Gilberto Mestrinho, tornou-se um símbolo, verdadeiro ícone da política e da sociedade amazonense.

Não há no presente de nosso Estado e porque não dizer nos últimos 40 anos quem não tenha uma história, um causo ou não tenha sido direta ou indiretamente atingido pelo legado do “Negão”, da Educação com seu marco mais significativo na UEA (Universidade do Estado do Amazonas), a Saúde, com os Hospitais Francisca Mendes, João Lúcio, 28 de Agosto, dentre tantos outros, além dos inúmeros CAICs e CAIMEs, sem esquecer do seu apreço pelos servidores públicos, muitas vezes resolvendo questões e impasses de maneira que só ele sabia fazer, estabilizando os temporários, bonificando os efetivos, implementando planos de trabalho e, até onde pode-se aferir, procurando cumprir com pagamentos em dia e manutenção de uma estrutura hábil a dar conta dos desafios.

Foi governador, prefeito e senador de todos e para todos os amazonenses, das zonas Norte e Leste, do tarumã e da Ponta Negra, do homem do interior, promovendo ciclos de revitalização econômica, emblemático em certa altura da história ao distribuir implementos agrícolas, dentre eles motosserras, o que lhe rendeu posteriormente críticas como sendo a favor do desmatamento.

Títulos e homenagens serão feitos certamente por todas as atuais lideranças políticas de nosso Estado, mas penso eu que é no coração do povo que o Negão vai receber o seu carinho mais precioso, homens e mulheres que viam nele uma luz, como de uma “poronga” em meio a escuridão da mata para esperar dias melhores. Resta saber quem serão os verdadeiros herdeiros deste legado, Amazonino se foi, cabe-nos dizer como em uma de suas músicas “até breve”, nós amazônidas sentiremos sua falta, quando a saudade apertar olharemos para aquilo que ele deixou, um amor profundo por esta terra presente inclusive em seu nome e obras. Descanse em paz Governador, muito obrigado por tudo.

Anderson Fonseca

Professor de Direito Constitucional. Advogado. Especialista em Comércio Exterior e ZFM

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