7 de setembro de 2024

Foco no coletivo: Fraternidade


  Penso que o foco da Política precisa ser o dos interesses coletivos da sociedade, pois se for subordinado aos interesses pessoais de detentores do poder econômico e político, perde o sentido. Isto não significa tentar obliterar as aspirações individuais, como se isto fosse possível e desejável, pois não é. O processo deve ser  o de promover a convergência entre diferentes interesses individuais e coletivos  na direção de um bem comum.
  Para ser útil e exitosa, sob o prisma do que seria bom para todos – ou a absoluta maioria – e não apenas para alguns , a Política precisa ser orientada por princípios delimitadores do seu campo e forma de atuação. Destaco aqui o legado histórico do lema da Revolução Francesa : liberdade, fraternidade e igualdade. Em 1789, estes princípios afloraram com força no imaginário de libertários líderes franceses e de muita gente do povo . E se espraiaram  pelo mundo afora, principalmente no Ocidente, de predomínio da cultura judaico-cristã. Mas não  alcançaram a plenitude de um significado concreto e satisfatório para nós e nossos antepassados. Mesmo assim serviram como balizadores da progressiva construção política dos  regimes democráticos da contemporaneidade.
  Chiara Lubich , a fundadora do Movimento dos Focolares, esclareceu a realidade política  que refletia – e reflete ainda com fulgor – da não realização desse lema tão belo . Ainda nos tempos da Guerra Fria , ela diagnosticou com precisão que a parte do mundo sob a égide comunista primava pela defesa da igualdade coletiva, ao par que a parte capitalista se fundamentava no primado da liberdade individual. Porém a categoria da fraternidade estava esquecida ou num nível subalterno, tanto nos países sob a égide comunista, quanto na capitalista.  A Fraternidade,  na visão de Chiara , é como um amálgama para integrar liberdade e igualdade, e vice-versa. Não há como coexistirem liberdade e igualdade sem o significado de um ser sociopolítico fraterno, que associe e fortaleça ambas. Como uma coletividade poderia  atingir um nível satisfatório de equidade com liberdade ou de liberdade com equidade, sem a presença viva do sentimento e do compromisso de fraternidade ?
  Chiara Lubich foi além no seu postulado político e espiritual da importância da Fraternidade para a vida da sociedade organizada. Para ela, a fraternidade deve representar  o primado inspirador e condicionador da realização das aspirações individuais – e coletivas- da liberdade, como também da  igualdade social.
   A ferocidade atual da Política no nosso país – e em diversas outras nações – reflete nitidamente que a categoria política da Fraternidade tem perdido vigor nas últimas décadas. Tratar o adversário político como inimigo a ser eliminado é sintomático. Promover narrativas irreais como representação da “verdade” dos fatos também reflete que o fundamental valor da honestidade de propósitos está sendo ignorado,  na tentativa de impor uma forma ideológica de interpretar o mundo social , com uma visão paradoxalmente “libertária” e “totalitária”.
   Penso que precisamos muito nos livrar das amarras extremistas de qualquer matiz político, religioso, cultural ou ideológico, para podermos debater e encaminhar novamente a Política aos seus desígnios de solidária construção de uma sociedade mais justa e sustentável. Nessa direção, atuando para que a Fraternidade, como Chiara ensinou e continua a nos ensinar , seja de fato o princípio existencial inspirador e orientador da Política.

Luiz Castro

Advogado, professor e consultor

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