O renomado neurocientista português Antônio Damásio alerta sobre os riscos do uso abusivo da internet na conformação cerebral das pessoas. Além disso, afirma que o atual ambiente de agressividade e intolerância, de polarização extremada das opiniões, também é impulsionado nas redes sociais, como uma ameaça crescente contra o convívio respeitoso e pacífico entre as pessoas. Além dele, vários outros reconhecidos estudiosos, da psicologia, da ciência política, da psiquiatria, da filosofia, da espiritualidade e de outros ramos do saber, identificam que os danos comportamentais causados pelo uso exagerado e distorcido das redes sociais, prejudica muito as crianças, os adolescentes e os próprios adultos. Estes alertas precisam ganhar maior repercussão entre todos os que vivenciam os valores do amor, do respeito, da justiça, da cooperação e da responsabilidade social. As mudanças velozes provocadas pelas inovações tecnológicas devem ser mais bem acompanhadas, compreendidas e orientadas por seres humanos que não “abram mão” de sua própria humanidade.
É possível reconhecer diversos danos causados pelo uso abusivo das redes sociais. Podemos iniciar pelo tempo e energia excessivos dispendidos por cada indivíduo nas redes sociais. Os relacionamentos pessoais, presenciais, vívidos, são substituídos pelas relações virtuais. A comunicação mais ampla entre as pessoas passa para um segundo plano. Deixa-se de valorizar a comunicação interpessoal direta mais profunda, do olho no olho, que inclui gestos, atitudes mais flexíveis e pacíficas, para colocar no seu lugar a troca escrita de mensagens e a leitura e absorção de uma quantidade imensa de informações, muitas delas distorcidas e malévolas. Narrativas sobre a realidade se tornam progressivamente mais fortes do que a capacidade própria de interpretar a realidade. E quando essas narrativas conseguem capturar o imaginário das pessoas -muitas delas movidas por decepções compreensíveis, mas mal canalizadas- induzem gente de boa índole a atitudes agressivas que podem extrapolar o chamado mundo virtual para o mundo real. A violência pode se tornar física.
Há diversos prejuízos, além do empobrecimento das relações interpessoais. Diminui o tempo disponível para boas leituras em prol de informação “fast-food”, de fácil ingestão, mas causadoras de verdadeiras indigestões mentais e muito mal-estar. A capacidade de interpretação de contexto se acentua quando as pessoas caem na arapuca de “satanizar” opiniões e visões diferentes das suas e de “endeusar” suas próprias convicções, como se estas pudessem substituir o mundo real.
Na ambiência sociocultural observa-se que as defesas ideológicas se tornam cada vez mais “supra lógicas”. Ou seja, o non sense parece virar bom senso. O extremismo supera a empatia. A prática do ódio aos oponentes se camufla de amor à Pátria, à Liberdade e até a Deus! Mas como é possível considerar a supressão da capacidade de ser misericordioso, de ser afetuoso, de ser respeitoso, de ser solidário como um ato de amor? Certamente não foi isso que Jesus nos ensinou no Evangelho…Suas lições parecem ficar soterradas pelas avalanches de mensagens de raiva e de prepotência na internet.
Ainda, as tão propaladas fake News se tornam corriqueiras e há uma forte corrente de opinião de que sejam apenas uma forma legítima de expressão. Mas o que acontece de fato é uma inversão de valores absurda: mentiras no lugar da verdade, como se fossem verdade. Mas não são. Defender uma causa política ou um credo religioso não justifica mentir e ainda defender a enganação. Para atacar os adversários vale tudo, até mentir e enganar? A ética é jogada na lata de lixo e substituída por um mecanismo deplorável de difamações, mentiras, ameaças…
Neste espaço de escrita, faço apenas uma breve descrição de alguns dos problemas derivados do uso excessivo das redes sociais. Há diversos outros males associados, como os jogos violentos que podem levar à morte de seus praticantes, a pornografia, a pedofilia, os golpes virtuais, os assédios, os tráficos de pessoa etc. Evidencia-se que o abuso de internet estimula a prática de diversas perversidades, vitimando pessoas inocentes. Como ensina a sabedoria popular: o caminho do inferno pode estar cheio de boas intenções.
Em suma: penso que devemos nos posicionar melhor como sociedade diante desta grande ameaça de perder nosso próprio senso identitário de seres humanos com corpo e alma, mente e coração, razão e sentimentos. Necessitamos urgente de mais estudos científicos, maior reflexão filosófica e ética. Mais amor. Menos ódio. Mais espiritualidade.