22 de novembro de 2024

IoT: a onda que Manaus e outras cidades precisam surfar

O artigo aborda sobre o distanciamento do poder público em relação à população e mostra como aproximá-los com a modernização do Estado, boas práticas e uso do que há de melhor em tecnologias como a Internet das Coisas.

Manaus é uma das capitais que mais gera riquezas no Brasil, porém não vemos essa “prosperidade” transformar-se em soluções para resolver uma miríade de problemas crônicos que vêm assolando sua população. Lamentavelmente, aqui e em muitas cidades, há um histórico distanciamento entre os eleitos e a população, sendo esta lembrada apenas nas eleições. E a falta de engajamento efetivo da população no processo de gestão da cidade é fruto de uma cultura arcaica, viciada nos seguintes modus operandi:

1) falta de políticas de Estado com visão de longo prazo. Na prática, impera a política de curto prazo para tirar o maior proveito do erário, beneficiando políticos, empresários e seus parceiros.

2) o apanágio, com o Estado capturado por interesses de grupos privilegiados (clãs familiares) em detrimento do interesse público.

3) o populismo que vê a população como mera beneficiária passiva, e não como protagonista ou parte ativa da gestão. Exemplo é o Bolsa Família, programa caro (mais de R$ 600 bi orçados deste 2003) que insufla estatísticas, não emancipa maioria dos pobres, pois não ataca as causas da pobreza, uma forma de controle social, verdadeira usina de fazer votos para os populistas.

4) processos decisórios com pouca transparência ou participação social, abrindo margem para desvios de conduta, corrupção e impunidade, e isso não tem ideologia, basta lembrar do contrabando na polícia do Exército, esquema do PC Farias, anões do orçamento, compra de votos, mensalão, petrolão, triplex, orçamento secreto, rachadinhas, funcionários fantasmas, caso das jóias, envolvimento com traficantes ou milicianos etc.

5) baixa modernização do Estado.

Nossa cidade tem inúmeros problemas, os quais se agravam por conta dessas práticas perniciosas. Assim, se ensejamos realmente mudar para melhor, é preciso pensar longo prazo, modernizar o estado, combater essas práticas, reduzir a burocracia, adotar uma gestão pública com base na ciência, em evidências, amparadas por tecnologias que permitam ampliar a transparência e a participação efetiva do(a) cidadã(o) no processo de solução dos principais problemas da cidade.

Esse engajamento pode se dar por meio da rotação contínua do ciclo PECAC (Planejar, o Executar, o Checar, o Agir e o Celebrar), uma metodologia adaptada do PDCA, bastante usada na indústria. 

No Planejamento participativo, realiza-se um diagnóstico junto à população para ouvir suas demandas, identificar problemas e suas causas, além de levantar soluções e prioridades. Essa escuta cidadã embasa: a) o mapeamento de boas práticas de cidades modelo similares, que já resolveram questões parecidas; b) a elaboração de um programa com projetos prioritários; c) a alocação de recursos públicos nessas iniciativas; d) a atualização de leis e regulamentos; e) a criação de uma estrutura de governança transparente, permitindo que a sociedade acompanhe os projetos e dados da cidade, colaborando nas demais fases

Na Execução, o poder público pode desenvolver soluções tecnológicas como plataformas digitais e aplicativos para implementar as ações com todos os envolvidos (Secretarias, Fundações, Empresas, Universidades, Startups, ONGs, Escolas, Imprensa etc), mantendo canais abertos de comunicação com a população.

Na Checagem, avaliam-se as ações do Programa e seus projetos, identificando melhorias e boas práticas, por meio de workshops, pesquisas, assembleias e outros métodos participativos. No Agir, corrigem-se os erros e documentam-se as boas práticas. E na Celebração, realizam-se eventos para mostrar resultados, disseminar boas práticas e reconhecer contribuições de organizações e pessoas.

Essas fases vão além das simples consultas públicas, pois incentivam a cooperação e engajamento da população, colaborando para uma gestão participativa de fato.

Apesar de parecer um delírio, é possível criar cidades com gestão participativa e tecnologias que melhorem a vida dos cidadãos e o meio ambiente. É preciso ter mente aberta e estudar exemplos mundo afora, como Amsterdã, Cingapura, Montreal, Londres e outras que adotaram Big Data, IoT e IA com resultados reais.

Para contribuir, divulgo um resultado parcial de um amplo diagnóstico envolvendo 12 perguntas e que será publicado em breve na Revista Científica PEEJ Computer Science (Conceito A1), o qual ouviu cerca de 1308 moradores de Manaus. Em uma das perguntas, foram listados 17 problemas ambientais e solicitado aos respondentes que escolhessem os cinco que mais lhe incomodavam em Manaus.

Como resultado, descobriu-se que os três maiores problemas são aumento da poluição dos igarapés/rios, aumento do acúmulo de lixo nas ruas, e arborização urbana insuficiente, ou seja, árvores sem manutenção, empreendimentos urbanos implantados sem arborização adequada etc.

Cidades como Cingapura, Amsterdã e Madri adotam redes de sensores de IoT para medir qualidade da água em tempo real. Os dados são analisados por algoritmos para detectar fontes de poluição com rapidez e precisão, a fim de subsidiar a tomada de decisão e ações dos gestores da cidade. Em Cingapura, essa tecnologia ajudou a reduzir níveis de coliformes fecais nos rios em 65% de 2012 a 2020. Assim, o sensoriamento por IoT é um caminho para Manaus melhorar seus igarapés.

Em relação aos dois primeiros problemas já escrevi artigos no JCAM <http://tinyurl.com/5n8cd456 e http://tinyurl.com/d3cdyyc6> com reflexões e recomendações sobre como enfrentá-los. Sobre arborização insuficiente, já foram publicados seis artigos <http://tinyurl.com/5y72x7py; http://tinyurl.com/yc2faxx5; http://tinyurl.com/dv9bw6f5; http://tinyurl.com/4fnm65ks; http://tinyurl.com/bdfbdpwk e http://tinyurl.com/4uub8esa> contendo recomendações para o poder municipal a partir boas práticas identificadas em cidades consideradas modelos em cuidar bem do seu ativo verde.

Finalmente, há numerosos casos de sucessos que ilustram como tecnologias, incluindo Open Data, Big Data, Computação em Nuvem, IoT e IA aprimoram a gestão e engajam a população. Manaus, como outras cidades, precisa se modernizar, se adaptar a essas inovações. Ao surfar nestas soluções, a cidade tem o potencial de unir os principais atores e se tornar líder em serviços inteligentes, conectados e mais sustentáveis para seus cidadãos.

Jonas Gomes

Prof. Dr. Jonas Gomes da Silva - Professor Associado do Dep. de Engenharia de Produção com Pós Doutorado iniciado no ano de 2020 em Inovação pela Escola de Negócios da Universidade de Manchester. E-mail: [email protected].

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