O Melô do Cara Coroa (3)

Em: 21 de janeiro de 2022

Resultou da consulta à psicoterapeuta, promovida pelo parceiro Arduo Consent, segundo posto no texto anterior (2), de saída um diagnóstico de possível caso de ninfomania traduzido pela obsessão por admiração a parceiros humildes, de baixo intelecto e sofrível visual, uma forma de assim se impor mais facilmente pela consulente, que atende como Belinha Capitu, um comportamento de longa data desde os 14 anos quando se deu o estupro caseiro.

É que surpreendido pela revelação da recente gravidez, ao nosso idoso e novel Casanova restava-lhe salvar o romance, se quisesse, seguindo o aconselhamento da médica traduzido pela formalização da relação amorosa, implicando, sem necessariamente casamento, montar para o casal uma residência de preferência vistosa, ornada com móveis de estilo e o mais cabível, até porque eis que um filho estava a caminho, fato, aliás, que muito inspirou a recomendação. Uma nova vida…

Feito isso, mais adiante pregou a médica, ao lado de tudo, que os anseios da companheira fossem encaminhados para outras direções, ou atrações que a livrariam daquela obsessão nefasta. Talvez um curso superior, ou mesmo de idiomas, aulas de boas maneiras, de instrumento musical, ou canto, mesmo a formação de um grupo de amigas voltadas para ginástica com os aparelho de exercícios dispostos na casa, além do uso de uma piscina, além de jogos de cartas ou equivalentes, sobretudo frequência a uma igreja e oitiva de sermões marcantes. Assim foi feito. Ademais, o registro cotidiano no diário, nos sinceros termos que em seguida seriam postos verbalmente para acompanhamento pela doutora. 

Queda-se ela: assim é que chega outro dia. Mais uma volta para casa, o trabalho de cozinhar, a mesa posta e o casal reunido em torno dela, orando a Deus pelos dias que estão sendo vividos. Após o jantar, cada um segue para o seu canto. Ele vai para o escritório doméstico a cuidar do trabalho que costuma trazer. Ela trata de deixar a cozinha limpa, a casa pronta, as anotações para a empregada que amanhã chegará bem cedo. Foi-se deitar.

Anota mais: “Durante estes meses, houve momentos em que me senti muito bem, apesar da barriga que vai se avolumando. Acho que a minha vida faz sentido, que esse é o papel do ser humano na Terra. Sinto que somos um exemplo de felicidade para a vizinhança. Mas, de repente, sem nenhuma explicação razoável, entro no chuveiro e caio em prantos. Choro no banho porque assim meus soluços não serão ouvidos e a enfrentar a pergunta que mais detesto ouvir: Está tudo bem com você? Sim, porque não estaria? Há algo de errado na minha vida? Nada. Apenas a noite que me apavora. Deito-me sozinha. Meu maravilhoso parceiro é idoso. Há muito que não me procura, mesmo quando a barriga não havia crescido tanto…” E pensa mais: “Fantasias do que poderia ter sido. O desejo de aventuras não realizadas.”

A doutora diagnosticou que tudo faz parte de um processo em andamento e quando se der o parto, um forte período se instalará na vida da paciente, tornando-a normal ou tranquila, isso ao lado do que já foi feito como amparo.  Por ora há o relato de que em alguns dias, embora poucos felizmente, em que ela fica se perguntando se deveria ir até um hospital psiquiátrico procurar ajuda. O que a impede de fazer isso é a adiantada gravidez e a desilusão que causaria ao seu companheiro além de aborrecer a médica. Decidiu trocar ideias com uma amiga que chamou pra almoçar. Sucede, é uma pessoa que toma antidepressivos, solução que não lhe interessava abordar, achando que está perto da doença, não querendo aceitar isso. É certo que a tragédia alheia sempre ajuda a diminuir o nosso sofrimento, concluiu. (Continua).  

Bosco Jackmonth

* É advogado de empresas (OAB/AM 436). Contato: [email protected]
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