“O decidir”

Em: 12 de agosto de 2022

Cora Coralina foi uma mulher sábia. Escritora, poeta, uma pessoa generosa e de fé, bastante corajosa nas suas atitudes. Teve uma vida difícil, árdua, com muitos sofrimentos, mas não desistiu de lutar por seus sonhos. Uma mulher do Brasil profundo, das terras goianas, nascida, “vivida” e “morrida” na velha Casa das Pedras, em cima do Rio Vermelho, na cidade de Goiás Velho. Anos atrás tive a oportunidade de visitar essa moradia rústica e bonita, tornada Museu Cora Coralina, onde ainda estão sua escrivaninha, o armário com vestidos antigos, os móveis de madeira, o fogão de lenha, os utensílios e as panelas nas quais ela cozinhava e preparava comidas típicas e deliciosos doces. Para mim, ela foi uma das mulheres brasileiras mais admiráveis, que nos ensinou lições que precisam ser aprendidas e não esquecidas. Verso, prosa, beleza e filosofia. Exemplo de vida de amor e poesia.

Dentre vários ensinamentos valiosos, Cora Coralina dizia que “na vida, o mais importante é o decidir”. De fato, cabe nessa frase preciosa, o sentido pleno de sermos humanos e capazes de definir nosso próprio caminho na existência. O livre arbítrio de decidir o que fazemos da própria vida, na própria vida. Uma decisão de verdade, a de agir, na direção que escolhemos. Assumir riscos faz parte disso. Coragem de decidir nossos caminhos ou nossa própria forma de caminhar, como dizia o poeta Thiago de Melo. Ou seja, Cora Coralina afirmava uma verdade simples, que pode ser obscurecida pelo medo de agir, pela omissão, pela outra face de nossa capacidade consciente, que é a de nos comportarmos como vegetais inconscientes, deixando-nos levar como no ditado popular do “Maria vai com as outras”, sem assumirmos nosso protagonismo na vida. Neste caso, o vitimismo daqueles que buscam desculpas por não tentar, por desistir antes de agir, por temer viver os riscos da vida como desafios que são. 

Como todo ser humano tive e tenho minhas limitações e imperfeições. E cometi erros por conta de nem sempre fazer as avaliações corretas sobre as situações em que estive envolvido. Mesmo assim, desde cedo aprendi intuitivamente a verdade de decidir como agir, buscando estar em sintonia com meus princípios e valores. Nem sempre fiquei satisfeito com o resultado de minhas decisões, mas as tomei de boa fé. Ao sair jovem de São Paulo intuía que minha vida mudaria depois que viesse para a Amazônia. Esta vontade de escolher meu destino, exercendo minha liberdade de decidir, foi uma característica da maioria dos jovens de minha geração. A maioria de nós decidia espontaneamente ir à luta, não depender de sustento dos pais vida afora, de fazer as próprias escolhas do presente para o futuro. Hoje, olhando para trás, observando o que passou e vislumbrando o futuro, agradeço a Deus por ter me protegido de tantos perigos ao longo da vida. Das picadas de cobra que me livrei ou dos antídotos de amor e de perdão para os ataques venenosos de pessoas de má índole. Assim fui e assim sou.

Por essas e outras aprecio tanto Cora Coralina. Ela me aponta o Caminho, da maneira da sábia brasileira que bem pode ser facho de luz para as sucessivas gerações do nosso povo. Cheiro de terra, gosto de comida do fogão de lenha, frescor das águas, casas da história antiga, caminhos de pedras e de flores. Ela decidiu ser ela mesma. Eu busco fazer o mesmo.

Obrigado, Deus! Obrigado, Cora!

        Vamos em frente.

Luiz Castro

Advogado, professor e consultor
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