Os testes de qualidade

Em: 12 de maio de 2025

A qualidade faz parte do rol de aspectos das tecnologias que precisam ser testados e retestados continuamente até que o protótipo possa ser considerado aprovado. Isso significa que todas as tecnologias, obrigatoriamente, precisam passar pelos crivos dos testes de qualidades por uma razão muito simples: são eles os primeiros que vão aferir se a tecnologia está ou não em conformidade com aquilo que dela se espera. Qualidade, portanto, pode ser definida simplesmente como adequação com determinados aspectos previamente conhecidos e determinados. A primeira conformidade, então, é com relação às necessidades e expectativa dos indivíduos e organizações que compõem o seu público-alvo. Conhecer essas necessidades e expectativas e suas respectivas categorias de análise é fundamental para que não se caia no erro comum de imaginar que a equipe de cientistas que criam a tecnologia sabem o que o público-alvo devem querer. A qualidade trata de aspectos bem definidos, como é o caso dos textos de uma cartilha digital para crianças, que deve medir os tamanhos das fontes, as cores, a altura entre linhas, a distância entre palavras e assim por diante.
A segunda consideração que deve ser feita é em relação às naturezas dos testes de qualidade. Muita gente imagina, erroneamente, que qualidade é algo que não pode ser traduzida em números ou que nada tem a ver com quantificação. É o contrário. É preciso que haja a quantificação para que o resultado obtido possa ser comparado com um determinado padrão. Por exemplo, se o tamanho da fonte de um texto tem que variar entre 14 e 18, esses dois números expressam o limite inferior e superior, respectivamente, da qualidade esperada para esse quesito. É preciso fazer a mensuração, que é tirar a medida do tamanho da fonte utilizada no protótipo, e comparar o resultado da medida com o padrão. Se estiver abaixo ou acima de 14 e 18, está em desconformidade; se estiver nesse intervalo, está em conformidade. Estar ou não em conformidade com o padrão é a maneira através da qual os cientistas apontam a qualidade, de maneira que ter qualidade é estar dentro dos padrões previamente definidos.
Os testes de qualidade dos protótipos procuram avaliar o quanto está em conformidade, por exemplo, com as características físicas, químicas, biológicas e sensoriais definidas em lei ou esperadas pelo público-alvo. Sim, é isso mesmo: muitos dos atributos que uma tecnologia deve apresentar é especificada por lei, principalmente aquelas que podem causar danos às pessoas, animais e ao meio ambiente. Os testes de qualidade verificam se a futura tecnologia atende aos padrões estabelecidos. Cada padrão geralmente recebe um nome genérico (que os cientistas chamam de dimensões analíticas), que representam um conjunto de testes menores (que são chamados de categorias analíticas). São os resultados de cada um de todos os testes que compõem uma dimensão que vão gerar o resultado para ela. Tome como exemplo a dimensão analítica “durabilidade” do teste de qualidade de um protótipo, medida através dos testes “operação sob humidade”, “operação sob calor extremo”, “operação sob frio extremo”, “tempo de operação” e “quantidade de operação”. Cada um desses cinco testes deve apresentar um padrão que vai apontar os resultados que cada um deles deve apresentar para aferir a qualidade da “durabilidade”. Cada resultado vai ser em forma de palavra “conformidade” ou “desconformidade”, o que é uma qualidade, mas ela é consequência de uma mensuração, que nada mais é do que a obtenção de um número que vai ser comparado com outro.
O que os testes de qualidade medem, de forma bem específica? Resposta: características, atributos do protótipo. Da mesma forma o tamanho das letras de uma cartilha digital é uma característica desse produto tecnológico, o alcance do sinal de radiofrequência também o é, assim como a proporção total de alunos aprovados / total de alunos de uma turma. Como a quantidade e os tipos de características das coisas são quase impossíveis de serem listadas, é necessário que os atributos de qualidade sejam criados em conformidade com as necessidades e expectativas do público-alvo (clientes, consumidores e usuários), assim como outros aspectos fundamentais, como as formas de apresentação, funcionalidade e acessibilidade do protótipo, sem deixar de considerar aspectos mercadológicos e logísticos. Tudo isso faz parte do rol de características de qualidade que podem ou não ser incorporadas nos testes relativos a determinado protótipo.
Uma forma interessante de se identificar os atributos de qualidade de um protótipo é fazer uma lista de tudo o que afeta a capacidade do artefato para atender à necessidade para a qual ele foi planejado. Entram nessa lista diversos tipos e quantidades de atributos, tais como condição física, função, durabilidade, confiabilidade, desempenho, adequação, reparo, precisão, estética, facilidade de uso, vantagens e desvantagens em relação aos concorrentes, preço de aquisição, preço de venda, custo unitário, custo variável, número de defeitos por milhão, tempo máximo para responder a demandas dos clientes e assim por diante. Note, mais uma vez, que essa lista é inimaginável, mas todo protótipo deve ter a sua, porque não há tecnologia que não apresente aspectos que não a afetem. Disso advém que, se uma tecnologia foi colocada no mercado ou transferida para o seu cliente sem a aferição de sua qualidade, é provável que problemas futuros ocorrerão. Do ponto de vista técnico da geração tecnológica, uma tecnologia sem testes de qualidade ainda é um protótipo.
Os testes de qualidade, infelizmente, ainda não fazem parte do cotidiano das equipes que produzem tecnologias nos ambientes acadêmicos. E isso talvez explique o elevado número de protótipos que fracassam ainda dentro dos laboratórios, servindo, no máximo, para a obtenção de notas para desempenho escolar. Os testes de qualidade, se compreendidos e feitos, proporcionam essa possibilidade extraordinária de se ir além das obrigações acadêmicas, adentrando os meandros desafiadores do mercado que, se bem-sucedida, poderá auferir lucros e vantagens de diversas formas. Afinal, de que outra maneira os inventores teriam a garantia de que suas invenções realmente servem para aquilo que eles têm em mente?

Daniel Nascimento

É Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)
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