22 de novembro de 2024

Protótipos relacionais

Daniel Nascimento-e-Silva, PhD

Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

Quase sempre as tecnologias são artefatos de vários componentes. Computadores, aparelhos celulares, softwares, aplicativos, processos de obtenção de princípios ativos de vegetais e minerais, sequências didáticas, naves espaciais e inúmeros outros exemplos chegam a ser constituídos de milhares e até milhões de componentes, se forem computadas individualmente, por exemplo, as minúsculas peças de uma placa eletrônica que compõem uma espaçonave. Esses inúmeros constituintes são, gradativamente, organizados em pequenos conjuntos que, por sua vez, vão dar forma a conjuntos maiores, até que uma parte ou componente estrutural ou processual do protótipo possa ser materializado. É fundamental que se compreenda, contudo, que esse processo organizativo não é aleatório. Pelo menos uma relação de causa-efeito precisa fundamentar o acoplamento das peças para a composição de uma estrutura tecnológica maior. Por sua vez, a estrutura tecnológica resultante passará a ser a “peça” que será acoplada a outras para formar a estrutura tecnológica seguinte, cada vez mais complexa. Para a prototipagem relacional, algumas considerações precisam ser conhecidas.

A primeira consideração é que os protótipos relacionais são sempre elaborados com base em protótipos estruturais ou processuais. A diferença entre os protótipos estruturais e processuais e os relacionais é que os estruturais mostram onde cada componente precisa estar e os processuais apontam as sequências dos processos, enquanto os relacionais têm o desafio de apontar justamente os impactos que cada componente ou processo causará em pelo menos um outro. Por exemplo, uma sequência didática que tem a coleta de dados como etapa tem como etapa posterior a análise dos dados coletados, de maneira que os dados coletados precisam estar de acordo com os requisitos que a análise de dados requer. Consequentemente, no protótipo relacional é necessário que sejam apontados os requisitos que a coleta de dados precisa seguir para que a análise possa ser realizada. De forma semelhante, a análise dos dados precisa ser feita em conformidade com os requisitos da organização de dados, etapa posterior.

Quando se trata de prototipagem relacional baseada em protótipos estruturais, o que se deve apontar é justamente o efeito que a etapa anterior precisa provocar na etapa posterior. Pode acontecer, e isso é muito comum, que uma peça seja acoplada a várias outras para que um movimento, força ou trabalho possa ser executado. Cada peça vai cumprir uma função (descrita nos protótipos funcionais), que, associada às funções das outras, vai provocar uma ação sobre outro conjunto ou componente do artefato que se pretende construir. Essa ação precisa ser conhecida, descrita e representada esquematicamente de alguma forma. Pode ocorrer, também, que um conjunto de mecanismos sejam associados para provocar outra ação sobre outros componentes, o que exigem também a representação dessas relações. O que queremos dizer é que toda ação sobre outra parte ou componente do artefato precisa ser representado para que possa ser materializada no protótipo físico, real.

A segunda consideração é relativa à forma de impacto. O impacto pode ser de diversas forma, muitas vezes divididos em categorias. Há, por exemplo, os impactos físicos, que podem ser divididos em sonoros, temperaturas, eólicos etc. A prototipagem, além de dizer que o componente A provocará um impacto sonoro no componente B para que B possa atuar sobre C, precisa muitas vezes especificar a magnitude do impacto, como quilograma-Força, ou intensidade do som, medido em decibéis. Se o impacto for em termos de transmissão de informação, não basta que no protótipo relacional seja especificado o tipo de relação. É fundamental que haja a definição da forma de impacto. Tome-se o exemplo de uma tecnologia que mede o Índice de Massa Corporal (IMC) a partir das informações da altura, idade e peso. Cada componente, individualmente, mede cada um desses parâmetros. Na prototipagem, deve-se representar o mecanismo de geração do IMC recebe a informação de cada componente (e sua informação) e as transforma em número. E, para cada componente deve ser especificada a informação a ser gerada, como ela vai ser transferida e como o componente receptor vai processar as informações para transformá-las no IMC.

A terceira consideração é que os benefícios que a tecnologia precisa gerar são a consequência de uma sequência relacional do tipo causa-efeito. Essa sequência começa com os acoplamentos das peças menores para a conformação de um conjunto ou mecanismo primário. Pode acontecer de uma tecnologia ser composta apenas de mecanismos primários, mas o mais comum é que haja a necessidade de mecanismos secundários, que nada mais são que conjuntos de mecanismos primários, para a geração de alguma força ou impacto sobre pelo menos outro conjunto. Tecnologias muito complexas exigem mecanismos de ordens elevadas. E todas elas precisam ser decompostas esquematicamente, peça por peça, mecanismo por mecanismo, até a geração dos benefícios que a tecnologia futura pretende entregar. Esse esquema representacional é o que chamamos de prototipagem ou planta relacional, onde é mostrado a) o acoplamento de cada peça com outra, cada mecanismo com outro e b) os efeitos que precisam ser provocados.

Os protótipos relacionais podem ser tomados como descrição de como os processos e os artefatos tecnológicos funcionam interna e externamente. A representação interna auxilia os cientistas nos testes/retestes e ajustes/reajustes dos protótipos durante a fase de prototipagem; a representação externa visa garantir aos públicos-alvos e usuários os benefícios que suprirão suas necessidades e servirão como base para a avaliação do desempenho da tecnologia.

Daniel Nascimento

É Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

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