22 de novembro de 2024

STF e a possibilidade de aproveitamento de créditos da Zona Franca de Manaus

Em setembro último foram rejeitados os Embargos de Declaração propostos pelo Estado de São Paulo na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 1004, ajuizada pelo Estado do Amazonas em 2022 para contestar decisões administrativas tributárias realizadas pelo Estado de São Paulo, que desconsideravam créditos de ICMS relativos a mercadorias da Zona Franca de Manaus (ZFM) beneficiadas por incentivos fiscais. A principal discussão envolvia a validade desses incentivos fiscais sem a aprovação do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária).

O STF decidiu o mérito da ADPF com base no artigo 15 da Lei Complementar 24/1975, declarando que os incentivos fiscais concedidos pelo Estado do Amazonas às indústrias instaladas na ZFM não precisam de aprovação prévia do Confaz. O tribunal declarou inconstitucionais os atos administrativos do Fisco paulista que haviam suprimido esses créditos de ICMS, garantindo, assim, que outros estados da federação também não possam invalidar os benefícios fiscais concedidos na ZFM. A decisão protege a segurança jurídica dos investimentos na região e preserva o modelo econômico da ZFM, significando uma grande vitória para a ZFM em termos práticos, já que protege as relações econômicas realizadas pelas empresas sediadas neste âmbito geográfico com outras regiões do país.

Esta ADPF tem relação intrínseca com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 4832, proposta, desta vez, pelo Estado de São Paulo, buscando que fosse afirmada a necessidade de prévia autorização do Confaz para a concessão de incentivos fiscais pelo Estado do Amazonas e argumentando que a ausência desta autorização violaria o pacto federativo e a uniformidade tributária nacional. O STF, no entanto, decidiu no mesmo sentido daquele julgado proferido na ADPF 1004, afirmando que os benefícios concedidos à ZFM são excepcionais e, por serem previstos no próprio texto constitucional, independem da validação pelo Confaz, em consonância com a LC 24/1975.

Ambos os casos envolvem a mesma controvérsia: a validade de incentivos fiscais concedidos pelo Estado do Amazonas à ZFM sem a necessidade de aprovação pelo Confaz. A ADPF 1004 foi uma ação subsequente à ADI 4832, justificada pelo comportamento da administração fiscal do Estado de São Paulo – o Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) –, que, após a derrota na ADI, tentou suspender o uso dos créditos de ICMS por meio de autuações fiscais. A decisão da ADPF 1004 reforçou o entendimento já estabelecido pelos Ministros do STF na ADI 4832, de que os benefícios fiscais da ZFM são válidos e não necessitam de qualquer intervenção do Confaz​.

Nos Embargos de Declaração julgados em setembro último, o Estado de São Paulo pretendeu – em linhas gerais – impor uma ressalva à decisão de mérito que invalidou as autuações fiscais impostas pela administração fiscal paulista aos créditos derivados da ZFM, além de requerer uma modulação temporal dos efeitos desta decisão, para uma suposta adaptação do Fisco paulista à decisão de mérito. Contudo, o fisco paulista deixou de considerar neste pedido que a decisão do STF reflete um posicionamento determinado previamente na Constituição Federal, que, portanto, já garantia – ao menos desde 1988 – o livre aproveitamento de créditos pelos contribuintes que realizam suas operações no âmbito da ZFM como decorrência lógica dos incentivos fiscais constantes do Decreto-lei n. 288/1969, indiscutivelmente recepcionados pela própria Constituição Federal.

O ponto observado pelo STF no julgamento dos Embargos foi o de que, em se tratando de mera declaração de regra constitucional pré-estabelecida – a manutenção do aproveitamento de créditos –, o comportamento do fisco paulista se fundamenta em narrativa própria, individual e exclusiva, sem anteparo no ordenamento constitucional e, portanto, sem motivação nacional que viabilizasse a necessidade de modulação de efeitos. Em outras palavras, o novo posicionamento da administração paulista, no sentido de vetar o aproveitamento de créditos em relação à operações derivadas da ZFM partiu de uma interpretação personalizada sobre a atividade e a extensão do modelo, em uma franca, insistente e descabida continuidade ao ataque – já rotineiro – ao sistema constitucional de tributação da Zona Franca de Manaus, que reflete, em verdade e em último grau, mais uma busca pela hegemonia regional, em detrimento do princípio básico de uniformização econômica das regiões brasileiras, sustentado há mais de 36 anos pela Constituição Federal.

Enfim, para que as empresas sejam beneficiadas com os incentivos fiscais e os créditos de ICMS estabelecidos nos julgados da ADPF 1004 e da ADI 4832, é necessário que cumpram certos requisitos, que envolvem tanto aspectos legais quanto operacionais, como a localização no âmbito geográfico da Zona Franca de Manaus; a realização de operações com mercadorias enquadradas nas regras de incentivos fiscais da área; a comprovação de origem das mercadorias no polo industrial de Manaus; o registro, a validação e a correta escrituração dos créditos de ICMS, conforme a legislação federal e local, do Estado do Amazonas.

Redação

Jornal mais tradicional do Estado do Amazonas, em atividade desde 1904 de forma contínua.

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