Testes e retestes relacionais

Em: 14 de abril de 2025

A ideia de relação, nos esforços de geração de tecnologia, é sinônima de impacto. Um componente tem relação com outro quando nele causa impacto, de maneira que a expressão “relação de causa-efeito” é tomada como pleonasmo vicioso, uma vez que, se causa algum efeito, há relação ali. As tecnologias podem ser vistas, como consequência, como um sucedâneo de causas-efeitos, de sorte que um primeiro componente causa efeito em outro que, por sua vez, causará efeito em um terceiro e assim sucessivamente, até que a tecnologia entregue os benefícios que dela se esperam. Os benefícios, portanto, em última instância, são o impacto final que a tecnologia causa. Embora os impactos relacionais sejam mais visíveis nos protótipos de tipo processual, eles estão presentes em todos os demais, desde os protótipos conceituais aos ambientais. Por essa razão, é fundamental que as relações sejam testadas e retestadas, para que se tenha a garantia de que as integrações previstas entre as peças, subcomponentes, componentes e partes da tecnologia estejam presentes.
O ponto de partida dos protótipos relacionais é a ideia de que o todo é um conjunto de partes. Essas partes podem ser vistas como estruturantes (em termos de peças físicas individuais) ou procedurais (como as etapas de um processo). Cada peça ou etapa é pensada para funcionar de determinada forma para que possa produzir determinado resultado (descritos nos protótipos funcionais). Os protótipos relacionais focam o valor de uma peça sobre o componente de que faz parte, como um parafuso, arruela e porca na amarração de uma peça mecânica. Os testes desses protótipos relacionais têm como finalidade ter a garantia de que a amarração está sendo feita de forma adequada, sem sobrecarregar nenhuma das peças. A amarração é a relação do conjunto de parafuso, arruela e porca com a peça que devem prender por um determinado tempo ou por uma determinada quantidade de operações sob determinadas condições. A amarração e a peça amarrada, por sua vez, fazem parte de um subcomponente e funcionam como se fossem um elemento que deve gerar impacto sobre pelo menos outro subcomponente, como controlar os giros desse componente por determinado tempo ou quantidade de operações. Esse controle de giros deve ser testado e retestado, até que os parâmetros do protótipo estejam garantidos em suas operações.
Certa vez um grupo de alunos resolveu criar uma cartilha digital para que os funcionários do setor de logística de um grupo de empresas varejistas pudessem ter os conhecimentos mínimos para realizarem suas atividades a contento. Dividiram o sistema de produção em seis etapas: 1) diagnóstico funcional, 2) planejamento do conteúdo, 3) redação do conteúdo, edição do protótipo, testes do protótipo e transferência da tecnologia. A primeira etapa determinava a elaboração da segunda que, por sua vez, definia a forma mais adequada de redação do conteúdo, que determinava a edição mais adequada do protótipo e assim sucessivamente. Os testes relacionais de cada etapa da tecnologia consistiram na análise do problema e suas causas, na primeira etapa, feito através de um diagrama de Ishikawa, para que a equipe tivesse uma imagem real do conteúdo da tecnologia de autocapacitação. A segunda etapa, feito sobre o diagnóstico recebido, foi executado com a escolha da extensão e profundidade de cada esquema relacional do diagnóstico, cujo teste relacional se concentrou na quantidade de conteúdo para cada esquema do diagrama de Ishikawa e, para cada conteúdo, o nível de profundidade que poderia ser absorvido pela cognição dos funcionários, de maneira que retratasse com fidelidade a necessidade a ser suprida. Na terceira etapa foi feita a redação dos conteúdos, testando-se a quantidade de capítulos, parágrafos em cada capítulo e os exemplos ilustradores de cada conteúdo. Na quarta etapa foram elaborados dois protótipos para o teste do conteúdo, além da clareza dos exemplos e a capacidade das figuras em retratar cada exemplo, de maneira que o impacto cognitivo fosse o maior possível. Na quinta etapa foram testados e retestados, ajustados e reajustados, o grau de aprendizado obtido com os protótipos, assim como a usabilidade, atratividade, tempo de aprendizado e outros indicadores de impacto da tecnologia. Na última etapa, foram testados e retestados os impactos da tecnologia em termos de custos, disponibilização, duração da disponibilização e outros aspectos.
Os testes e retestes relacionais cumprem um importante papel na garantia da validade e da fidedignidade das tecnologias. A validade diz respeito ao fato de que o artefato vai produzir e entregar os resultados prometidos para os seus clientes, usuários e consumidores. Por exemplo, tecnologias de monitoramento de temperatura têm que entregar as medidas corretas em graus, que é a forma adequada de mensuração, e não em quilos ou metros. A fidedignidade é a garantia de que as medidas serão feitas sempre da mesma forma, com os mesmos critérios, de maneira que não haja variação dos procedimentos e tampouco nos resultados que serão entregues. Os testes e retestes dos protótipos relacionais apresentam essa preocupação a partir de cada peça de cada subcomponente até as maiores partes que finalizam o artefato tecnológico. Validade e fidedignidade, portanto, são os focos dos protótipos relacionais, fundamentais não apenas para a acreditação, mas fundamentalmente para o cumprimento de requisitos posteriores de registro de propriedade intelectual.
Os testes e retestes relacionais visam, em última análise a integridade funcional da tecnologia sob geração. É durante a fase de prototipagem que a integridade é trabalhada, desde os subcomponentes mais básicos, em uma concepção bottom-up, até que sejam alcançados os níveis mais elevados e visíveis do artefato. Os testes de integração bottom-down têm como finalidade a garantia das entregas que a tecnologia fará aos seus públicos-alvos, enquanto os testes bottom-up representam as garantias de seu funcionamento interno. Esses testes podem ser feitos simultaneamente pela equipe de prototipagem e pelos auditores de qualidade, para aferição relacional antes da entrega para estágios mais avançados de geração tecnológica. À medida que se avança na aprovação dos testes, avança-se também na finalização da tecnologia.

Daniel Nascimento

É Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)
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