O Polo Industrial da Zona Franca de Manaus precisa avançar na diversificação e adensamento produtivo de que é capaz. Alertas é o que não faltam. Precisa, porém, seguir no fortalecimento do protagonismo de sua representação de classe e, se for o caso, recorrer aos mandamentos constitucionais para que os benefícios financeiros recolhidos pela Indústria sejam alocados em diversificação e adensamento da atividade econômica, sempre com baixo carbono, a favor da população vitimada pelas atividades ilegais na Amazônia, do clima e da reputação do programa ZFM?
Por ALFREDO LOPES – Coluna follow-up – BrasilAmazoniaAgora
Um alvoroço tomou conta nos portais de notícia da floresta neste Maio Amarelo de violência no trânsito de veículos e de pessoas. Na agitada metropolis manauara, não mais que de repente, foi decretado um ‘salve-se quem puder”, pela confusão formada com a leitura de orelhada do Relatório do Banco Mundial, publicado há duas semanas. desperdiçamos críticas pontuais ao programa Zona Franca de Manaus, sua comprovada ineficiência no trato das mazelas sociais, crônicas e reincidentes. Curiosamente muitos insistem em chamar de modelo ZFM, uma presunção imodesta que ignora as dificuldades na distribuição da riqueza para o tecido social. Uma cidade com altos indicadores de riqueza exportada para os cofres federais e que insiste em aceitar que aqui restem apenas migalhas do banquete fiscal.
À ineficácia coletiva de assimilar questionamentos, temos que adicionar nossa conivência ancestral com a desordem socioeconômica estabelecida. Parece que não dói. Mas a ninguém interessa produzir riqueza e não enxergar sua aplicação social. Quem espera – no sentido da passividade conivente – não verá o dia em que o país amenize sua compulsão fiscal, ou pelo menos reconheça o dever da contrapartida de serviço público de melhor qualidade à cidadania. O alarido que virou algazarra se deu por conta da “pouca eficiência da ZFM”? Os técnicos do Banco Mundial, sem perceber, impuseram-nos uma carapuça, que bem poderíamos assimilar e transformar num debate aberto e proativo que insistimos em protelar. Por que não nos movimentamos a exigir direitos, por exemplo, de balizamento das hidrovias regionais, se nos negam direitos de conexões terrestres? Cada governo que entra desenvolve uma narrativa de justificativa para não recuperar as duas rodovias federais do Estado. Por que aceitamos?
Faltou uma leitura mais acurada do Relatório – por sinal, extremamente denso – no lugar das bravatas habituais e quixotescas que costumam encobrir comodismos estruturais. Estamos correndo o sério risco de validação do “ouvi falar”, ou seja, “li no Instagram”, como fonte procedente no trato das informações relevantes para a manutenção dos pilares que sustentam a economia do Amazonas. Somos ineficientes, por exemplo, na reclamação da infraestrutura a que temos direito com o volume de recursos que o Amazonas recolhe à Receita. Por que não seguir a destinação deste dinheiro? Aqui, certamente, não é aplicado. Por que não acionar o estatuto constitucional que recomenda a redução da pobreza com sua aplicação, pois se trata de riqueza gerada por contrapartida fiscal?
Optamos pela ineficiência quando transformamos em balela a proteção florestal “indiretamente propiciada pela economia da ZFM” Enquanto gritamos por décadas que o Amazonas mantinha intacta 97% de sua cobertura vegetal, contamos com o apoio de organismos internacionais preocupados com a mudança climática. A OMC e a UE nos viram como economia harmonizada com a ecologia. Quando, porém, o país quis fazer da Amazônia um grande roçado, como denunciou a CNI, suspendendo a fiscalização e incentivando o desmatamento, batemos palmas mitológicas, e se quer, identificamos, nos famosos decretos federais, a intenção de desconstruir o polo industrial de Manaus.
Fomos ineficazes em compreender que o Relatório, simplesmente, apontou nossa contribuição ao agravamento da crise climática, na omissão coletiva frente às implicações do desmatamento que pode comprometer a economia do Centro Oeste com uma nova crise hídrica. Ou seja, em lugar de organizar o mercado de carbono e precificar os serviços ambientais da floresta em pé, prestados pelo Amazonas, ficamos omissos diante da expansão das áreas de pastagem, com a remoção dos ecossistemas naturais. Remover a floresta é contribuir com a desertificação de regiões de mananciais. O Rio Grande do Sul não é alcançado pelos rios voadores há mais de uma década. E o agronegócio está ameaçado com as sequelas do El Niño este ano.
E o que pede o Banco Mundial? Nada além do que algumas reformas estruturais, entre elas, a questão dos transportes, que poderia agregar um crescimento sustentável de 38% de nossa economia, atingida mortalmente pela logística do descaso. Os gargalos de produtividade não são prerrogativa sombrias apenas da ZFM. E tem jeito se considerarmos os recursos tecnológicos já disponíveis na logistica mundial. O Polo Industrial da Zona Franca de Manaus precisa avançar na diversificação e adensamento produtivo de que é capaz. Alertas é o que não faltam. Precisa, porém, seguir no fortalecimento do protagonismo de sua entidade de classe e, se for o caso, recorrer aos mandamentos constitucionais para que os benefícios financeiros recolhidos pela Indústria sejam alocados em diversificação e adensamento da atividade econômica, sempre com baixo carbono, a favor da população vitimada pelas atividades ilegais, do clima e da reputação do programa ZFM?
(*) Alfredo é filósofo, escritor, autor de 11 títulos sobre a Amazônia, consultor do CIEAM, editor da Coluna Follow-up e do portal BrasilAmazoniaAgora