14 de setembro de 2024

‘2023 pode ser o ano da retomada’

O presidente executivo da Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos), José Jorge do Nascimento Júnior, espera que 2023 seja um ano de retomada. O polo eletroeletrônico, assim como o de bens de informática, foi um dos que mais cresceu durante os meses mais duros da pandemia. Mas, a partir de meados de 2021, com a vacinação em massa, o retorno dos serviços presenciais e o desenclausuramento da classe média, passou a derrapar nas vendas, diante da perda de poder de compra imposta pela escalada da inflação e dos juros. Em pleno ano de Copa, o subsetor ficou perto do zero a zero, sendo que produtos importantes de seu mix, como os condicionadores de ar, sofreram queda livre de produção e vendas. Diante disso, o dirigente avalia que o subsetor rever suas políticas industriais e buscar soluções para a retomada do consumo. Na conversa com o Jornal do Commercio, José Jorge do Nascimento Júnior fala também dos desafios e riscos em torno da reforma Tributária, e da contribuição do segmento para a ZFM, em termos de investimentos em P&D&I e ESG, 

Jornal do Commercio – Há um consenso de que, apesar de desafiador em muitas frentes, o ano passado acumulou ganhos com o arrefecimento da pandemia e um ensaio de retorno à vida normal. De que forma essa mudança de cenário está impactando no segmento que a entidade representa? 

José Jorge do Nascimento – A partir do surgimento da pandemia, a prioridade das nossas indústrias foi salvar vidas e trabalhar fortemente para que saíssemos dessa situação extremante infeliz e avassaladora. Com o isolamento social e as medidas de lockdown, a população buscou converter o ambiente do lar em um local bem mais confortável e adequado ao estudo, trabalho e lazer. Assim, eletroeletrônicos e eletrodomésticos tiveram suas vendas aumentadas em 2020 e até metade de 2021. O Brasil foi um dos poucos países que não tiveram problemas com desabastecimento, graças à forte indústria instalada aqui, que atendeu plenamente a demanda. Contudo, desde o segundo semestre de 2021 o setor apresenta indicadores com fortes quedas. Isso se deve a vários fatores como a grande retração no consumo causado pelos juros elevados, pressão inflacionária e o alto custo de produção no país. 

JC – O ano que se encerrou também foi de Copa, mas os números apurados pela Suframa até novembro apontam para resultado pouco acima do zero a zero para a produção de TVs, e negativo para os receptores de sinais para TVs. Como explicar esse resultado?

JJJ – Ano de Copa do Mundo sempre é de crescimento de vendas de áudio e vídeo, com destaque para os televisores. As indústrias, inclusive, utilizam o evento para grandes lançamentos de produtos ainda mais modernos e inovadores, buscando instigar o consumidor à adquirir um produto que lhe dê uma experiência única ao assistir os jogos e com preços promocionais. Ocorre que em 2022 a Copa foi realizada em novembro e dezembro, em períodos próximos à Black Friday e Natal, eventos onde as vendas de eletroeletrônicos são bem relevantes. Com isso, o consumidor optou em comprar não dois ou três televisores durante o ano, mas tão somente um, aproveitando as promoções ocorridas no fim do ano. Mesmo assim, vimos um crescimento nas vendas em outubro e novembro de cerca de 20%, quando comparado ao mesmo período de 2021.

JC – Outro carro-chefe do subsetor acumula desempenho ainda pior, para além de qualquer sazonalidade. As linhas de produção de condicionadores de ar do PIM, nas diversas modalidades de produto, registraram retração mês a mês em 2022. A que se deve isso?

JJJ – O mercado consumidor nacional é atendido plenamente pelas 14 indústrias instaladas na ZFM. São as maiores e mais importantes fabricantes do mundo, que ofertam aos brasileiros produtos inovadores, modernos e com grande eficiência energética. Mas, a venda está diretamente relacionada a fatores climáticos. Sudeste e Sul, onde estão localizados os maiores mercados consumidores, tiveram chuvas e frentes frias em dezembro, janeiro e fevereiro, fazendo com que as temperaturas não fossem tão elevadas. Além disso, os juros e o alto custo de produção no país dificultam a oferta de produtos com preços mais acessíveis. A política industrial para o ar-condicionado obriga a os fabricantes de bens finais a adquirir alguns componentes nacionais com sobrepreços bem acima dos importados. E, com os juros elevados, a massa do consumo se inviabiliza com as prestações dos financiamentos. Considerando que não podemos atuar no fator climático, há a necessidade urgente de uma revisão da política industrial e a busca de soluções para a retomada do consumo. 

JC – Quais são as expectativas da Eletros para o desempenho das linhas de produção da indústria eletroeletrônica, em 2023? 

JJJ – Nossa expectativa é que 2023 seja o ano da retomada do subsetor e, com isso, consigamos esperamos crescer em torno de 5% a 10% comparado a 2022. Esperamos que 2023 seja o ano de recuperação, do reaquecimento do setor eletroeletrônico e eletrodoméstico, com a implementação de políticas que induzam o consumo e tornem a cadeia de suprimentos mais competitiva para a produção dos produtos finais no país. 

JC – Já podemos antever quais serão as tendências dos novos produtos da indústria eletroeletrônica em 2023? Há estimativas de abertura de novas linhas de produção e/ou chegada de novos players do setor na Zona Franca de Manaus?

JJJ – A oferta de produtos modernos, eficientes e inovadores é uma constante no setor. O consumidor brasileiro terá, em breve, mais e mais produtos modernos, como condicionadores de ar com eficiência energética ainda maior; televisores com interatividade facilitada e maior qualidade de imagem e som; lavadoras de roupa e louça inteligentes; fogões e cooktops mais seguros e com designers modernos; e refrigeradores mais eficientes e inteligentes. Alguns destes produtos serão fabricados na Zona Franca de Manaus, e outros nos demais Estados do país. 

JC – Em 56 anos de existência, a ZFM enfrentou diversos desafios e a bola da vez ainda é a reforma Tributária. Que tipo de reforma a Eletros espera que o Congresso entregue ao país e quais suas expectativas em relação à tramitação da propositura? O senhor vê riscos para o modelo?

JJJ – O Congresso tem que estabelecer uma reforma que melhore a vida da população. E isso somente será alcançado se ela respeitar as particularidades de cada região, sem afugentar investimentos para outros países, ou estimular a migração de negócios de regiões mais pobres para as mais desenvolvidas. A reforma precisa também facilitar o dia a dia das atividades produtivas, estimular o empreendedorismo e a formalização de negócios, e estimular políticas de desenvolvimento regional eficientes, sem aumentar carga tributária. A ZFM se vê como ponto de atenção, por ser o mais bem sucedido projeto de desenvolvimento regional do país, referência mundial em geração de emprego de qualidade, investimento em P&D&I e preservação ambiental. Qualquer proposta que descontinue ou enfraqueça essa riqueza deve ser refutada com veemência. O governo federal e o Congresso pretendem aprovar a reforma Tributária ainda neste primeiro semestre, e este é outro ponto de atenção. A celeridade não pode se tornar um processo açodado que resulte em novo arcabouço tributário nacional equivocado. De toda forma, entendemos que até o fim de 2023 deveremos ter uma reforma Tributária estabelecida e que atenda plenamente as necessidades da ZFM e da população amazônica. 

JC – Qual é a importância e o volume de investimentos realizado pelo polo eletroeletrônico em novas tecnologias e processos produtivos em suas plantas de Manaus? Quais o senhor destacaria?

JJJ – Os investimentos em P&D na ZFM ultrapassam os R$ 2 bilhões e as empresas do setor eletroeletrônico do PIM respondem por mais de 85% desse investimento. Portanto, além do parque fabril em constante modernização, o setor eletroeletrônico tem como seu principal legado bilhões de reais em investimento na formação do capital intelectual da população do Amazonas e região. Importante ainda considerar que a Universidade do Estado do Amazonas é custeada 100% pelas empresas do Polo Industrial de Manaus, com destinação de percentuais dos seus faturamentos brutos para esta instituição. 

JC – O que o subsetor eletroeletrônico faz para trabalhar dentro do conceito ESG, no parque fabril de Manaus? O senhor poderia nos dar alguns exemplos?

JJJ – O conceito ESG é algo que vem sendo adotado por várias organizações no mundo e é muito particular de cada empresa. De toda forma, se hoje há uma preocupação mundial com a questão da governança, o lado social e o meio ambiente, podemos afirmar que a ZFM está na vanguarda. Desde sempre, para a obter incentivos fiscais, as empresas beneficiadas têm a obrigação de atender contrapartidas, como governança alinhada as boas práticas estabelecidas, benefícios sociais aos seus trabalhadores, reinvestimento de lucros na região e atendimento de normas ambientais, entre outras ações que evidenciam mais do que conceitos e teorias da ESG

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio

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