Você já comeu ariá, ou mesmo sabe o que é ariá? Pois a oportunidade de conhecê-lo é hoje, 16, às 17h, no restaurante Caxiri, localizado no Largo de São Sebastião, com o lançamento do livro ‘Ariá – um alimento de memória afetiva’, publicado pelas editoras Valer e do Inpa, e escrito por Eli Minev-Benzecry, de apenas 17 anos.
O ariá (Goeppertia allouia) é um tubérculo amazônico cultivado há milhares de anos por comunidades indígenas. É uma planta com alto valor nutricional e uma história rica, que conecta ciência, tradição e afeto em muitas famílias, que o consumiram no passado.
“Escolhi o ariá porque ele representa exatamente isso: uma ponte entre gerações e culturas. É um alimento ancestral, que pode inspirar soluções para o futuro, sobretudo na segurança alimentar da Amazônia”, falou Eli.
Eli conheceu o ariá há apenas dois anos, através das histórias contadas por sua avó, dona Nora. Foi quando soube se tratar de um alimento comum, há décadas, em Manaus, e que hoje, praticamente sumiu das feiras e mercados.
“Apesar de o ariá fazer parte da memória afetiva da minha família, ele já era uma raridade nas feiras e mercados quando eu nasci. Minha avó lembra com carinho de quando meu bisavô, Samuel Benchimol, comprava o tubérculo nas feiras de Manaus e era servido cozido, como acompanhamento das refeições”, contou.
“A primeira vez que ouvi falar do ariá eu tinha 15 anos. Quando comentei com minha avó, ela se encheu de nostalgia e começou a compartilhar lembranças. Ao experimentá-lo, achei incrível: tem uma textura crocante, lembra batata, mas é um pouco adocicado. Fiquei pensando como um alimento tão bom pode ter sumido do nosso dia a dia”, lamentou.
Dona Nora recorda do ariá como algo comum nas refeições de sua infância, em Manaus, quando a cidade ainda mantinha uma relação mais próxima com a floresta. Na casa dela, a comida regional sempre teve protagonismo.

Grupo diverso
O livro foi construído de forma colaborativa, reunindo um grupo diverso de coautores (Ruby Vargas-Isla, Laura Leite, Silvio Barreto, Tyson Ferreira-Sateré, Marly Lima, Bosco Gordiano, Maiana Lago, Atmam Batista, Ariel Blind, Ana Carla Bruno, ilustrado por Hadna Abreu, com organização da pesquisadora do Inpa, Noemia Ishikawa). São pesquisadores, estudiosos da sociobiodiversidade amazônica, chefs, jovens cientistas e lideranças indígenas que enriqueceram cada capítulo com suas experiências e saberes.
“A ideia nasceu a partir de um projeto científico que iniciei no segundo ano do Ensino Médio, com a orientação das pesquisadoras Noêmia Ishikawa e Ruby Vargas Isla. A partir de então tive o privilégio de trabalhar com um grupo extraordinário de coautores”, lembrou Eli.
A proposta inicial do grupo era estudar o ariá como uma alternativa para a segurança alimentar na Amazônia.
“Mas logo percebemos que, para que ele voltasse à mesa das famílias, era preciso que as pessoas o conhecessem, o reconhecessem e se reconectassem com ele. E não havia forma mais completa de apresentar tudo o que descobrimos, de dados científicos a memórias afetivas, do que por meio de um livro. Esse projeto me ensinou algo essencial: a Amazônia não precisa de soluções importadas, mas de escuta, pertencimento e inovação com base nos saberes locais”, afirmou.

Uma raridade
Hoje, o ariá ainda não aparece nas prateleiras dos grandes supermercados, mas pode ser encontrado em algumas feiras tradicionais da cidade.
“Também vem sendo reintroduzido por meio de iniciativas como hortas urbanas e agroflorestas. Já existem plantios em bairros como Tarumã, Adrianópolis e Parque das Tribos. Além disso, o Inpa mantém uma coleção com 23 variedades de ariá no seu Banco de Germoplasma, ajudando a preservar e fortalecer a presença desse alimento na região”, revelou.
“Essas memórias, e a ausência do ariá na mesa dos manauaras, me despertaram uma pergunta incômoda: por que tantos ingredientes tradicionais, como o ariá, deixaram de fazer parte do nosso dia a dia? Como é possível que, mesmo vivendo em uma das regiões mais biodiversas do planeta, tantas pessoas ainda enfrentem insegurança alimentar? Foi nesse contraste, entre abundância e escassez, lembrança e esquecimento, que surgiu a vontade de resgatar o ariá”, informou.
O livro tem tradução para o povo tukano, do alto rio Negro, e traz receitas com o tubérculo.
“É importante notar a composição multicultural e multidisciplinar dos participantes e a primeira autoria de um jovem autor, Eli Minev-Benzecry, que tem 17 anos, evidenciando mais um traço da singularidade deste livro”, disse Neiza Teixeira, coordenadora editorial da Valer.
“Através deste livro, esperamos inspirar uma nova apreciação pelo ariá e, mais amplamente, pelos alimentos e práticas culturais que são fundamentais para as comunidades da Amazônia”, concluiu Henrique Pereira, diretor do Inpa.
