A retomada do otimismo segue em passos lentos no comércio de Manaus. Os dados locais do Icec (Índice de Confiança do Empresário do Comércio), levantados pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) confirmam uma quarta e tímida subida no humor dos empresários, em sentido contrário ao da média nacional. Houve melhora na percepção da conjuntura econômica atual e nas expectativas, com maior intenção de contratar e investir. Mas, em sintonia com a seca e as oscilações nas vendas, a insatisfação com o nível dos estoques se aprofundou e a situação da empresa passou a ser foco de preocupações maiores.
Manaus aparece na sondagem com 113,9 pontos, sendo que valores acima de 100 pontos indicam satisfação. O otimismo é maior nas empresas com mais de 50 funcionários e que vendem bens duráveis. O indicador avançou apenas 1,7% em relação a julho de 2023 (112 pontos), embora ainda esteja 17,3% abaixo da marca do mesmo mês de 2022 (137,8 pontos). Mesmo com a melhora, a pontuação ainda está atrás do dado de março (120,5 pontos). Na média brasileira (113,1 pontos), o indicador caiu 0,7% no mês, após a breve recuperação de agosto. Em relação a setembro do ano passado, o recuo chegou a 9,9%.
Nos últimos meses, o Icec vem reagindo de forma gradual a outras pesquisas da CNC. O indicador de ICF (Intenção de Consumo das Famílias) confirmou sua 15ª alta mensal, alavancado pela melhora nas percepções do consumidor de baixa renda sobre renda e emprego, em detrimento da disposição de adquirir bens duráveis. Já a Peic (Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor) confirma que os níveis de endividamento (83,5% ou 548.209) e inadimplência (37,2% ou 244.154) das famílias da cidade ainda se mantêm elevados, embora tenham declinado pelo quinto mês seguido.
Empregos e investimentos
Seis dos nove subcomponentes do indicador de confiança do comerciante mostraram recuperação em Manaus, mas um deles ainda se mantém no nível de insatisfação. A melhora mais acentuada vem da expectativa da economia brasileira (+5,3% e 104,7 pontos), mas os indicadores de contratação de funcionários (+3,9% e 145,7 pontos) e de nível de investimentos dos lojistas (+2,7% e 123,6 pontos), assim como as avaliações sobre as perspectivas para o comércio (+2,9% e 167,6 pontos) e a conjuntura econômica atual (+2,5% e 104,7 pontos) também ficaram acima da média do I local.
Uma melhora mais modesta na percepção dos empresários locais em relação ao momento atual do setor (+1,6% e 132 pontos). Em contraste, o pessimismo foi uma marca no que se refere ao entendimento dos comerciantes da capital amazonense sobre a situação atual (-2,6% e 140,4 pontos) e a expectativas (-0,3% e 173,3 pontos) de suas respectivas empresas. Em mês de piora das mudanças climáticas e agravamento da vazante, a situação atual dos estoques (-0,8% e 93,5 pontos) seguiu como foco de insatisfação.
A maioria dos varejistas locais passou a considerar que a economia “piorou um pouco” (33%), embora os que dizem que “piorou muito” (32,6%) estejam logo atrás. Na outra ponta estão os que apontam que a economia “melhorou um pouco” (26,3%) e que “melhorou muito” (8,2%). A visão predominante dos empresários da capital amazonense ainda é de melhora relativa para o setor (30,8%) e para a empresa (35,8%).
A pesquisa mostra um panorama melhor para as expectativas de um futuro que teima em ficar longe. A avaliação geral é que a economia brasileira vai “melhorar muito” (41,4%) ou, ao menos, “melhorar um pouco” (31,6%). Os grupos de comerciantes que cravam que vai “piorar muito” (13,1%) ou que vai “piorar um pouco” (13,8%) continuam cadentes. As projeções empresariais que pesam mais para o setor e para os estabelecimentos também são de progressos mais significativos (47,3% e 49,9%, na ordem).
Em sintonia com o novo aumento no subindicador de contratação de funcionários, a parte majoritária dos lojistas ainda aponta que seus quadros devem “aumentar pouco” (48,1%). A parcela dos que dizem que pode “reduzir um pouco” caiu para 23,4%. As projeções predominantes para investimentos são de que serão “um pouco maior” (32,1%), seguidas pelos que dizem que serão “um pouco menor” (27,5%). A situação dos estoques piorou e somente 62,6% dos comerciantes dizem que está “adequado”. Outros 22,8% informam que está acima do ideal e 13,9% apontam que está abaixo dessa marca.
Seca e frete
O presidente em exercício da Fecomércio-AM, Aderson Frota, concorda que a confiança do setor vem avançando. Mas, reforça que esse progresso é “muito pequeno”, diante dos problemas que o setor vem enfrentando desde o ano passado, e que tendem a tomar uma “conformação diferente”, diante do “momento muito difícil” criado pela seca mais severa deste ano. No entendimento do dirigente, a estiagem tende a dificultar mais o abastecimento do comércio de Manaus e puxar o índice de confiança “muito para baixo”, dentro de um mês ou um mês e meio.
“Sempre considero que o segundo semestre é o melhor momento para retomada, quando os comerciantes estão mais propícios para contratar. Ocorre que vivemos um momento atípico. O abastecimento está sendo praticamente colocado em xeque, com novos e significativos aumentos nos preços dos fretes. Temos ainda os engasgos dos navios, que chegam a Manaus com 50% a menos de contêineres. A Opep está com intenções de elevar o preço do barril para US$ 100, o que significa dizer que os combustíveis, fretes e operações portuárias aumentarão. Por outro lado, ainda temos um consumidor sem crédito e muito negativado”, lamentou.
Crédito e “alavancagens”
Em texto divulgado pela assessoria de imprensa da CNC, o presidente da entidade, José Roberto Tadros, voltou a expressar preocupação. “Apesar da chegada de datas importantes para o comércio, como Dia das Crianças, Black Friday e Natal, o cenário no varejo ainda é de cautela, por conta da alavancagem e até da situação de inadimplência enfrentada por uma parte das empresas, limitando investimentos”, alertou. Ainda assim, o dirigente lembra que a CNC prevê ligeira alta nas vendas do setor, de 2%, em 2023.
A economista responsável pela análise da pesquisa, Izis Ferreira, pontua que o otimismo do varejo brasileiro vem sendo erodido na base anual desde janeiro, com piora intensificada no segundo trimestre. “Com maior dificuldade de ampliar vendas, esses negócios precisaram recorrer com mais frequência a liquidações, ofertas, e outras estratégias de venda”, destacou. “As operações dos negócios, de forma geral, ainda sofrem para impulsionar as vendas, principalmente nos segmentos mais dependentes das vendas a prazo. A alta alavancagem das empresas é outro ponto de atenção”, finalizou.