24 de novembro de 2024

Estiagem derrete confiança dos comerciantes de Manaus, aponta pesquisa CNC/Fecomércio-AM

A seca e as perspectivas de desabastecimento nas festas de fim de ano derreteram o otimismo do comércio de Manaus, em outubro. Os dados locais do Icec (Índice de Confiança do Empresário do Comércio), levantados pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) aponta uma queda mensal e anual no indicador mais severa do que o registrado na média nacional, após quatro meses seguidos de altas tímidas. A piora foi puxada principalmente pela percepção sobre as condições atuais do setor e a saúde da empresa, mas também contaminou as expectativas.

Manaus aparece com 107,6 pontos no levantamento, sendo que valores acima de 100 pontos ainda indicam satisfação. O indicador retrocedeu 5,5% em relação a setembro de 2023 (113,9 pontos) e apresentou o segundo menor escore do ano. O recuo em relação à marca do mesmo mês de 2022 (142,5 pontos) foi de 24,5%. A queda do otimismo é maior nas empresas com mais de 50 funcionários e que vendem bens duráveis. Na média brasileira (112,8 pontos), o indicador também andou para trás, mas deu menos passos: caiu 3%, na variação mensal, e 13,1%, em relação a outubro do ano passado.

A inflexão negativa do ICEC ocorre no mesmo mês em que o indicador do ICF (Intenção de Consumo das Famílias), da mesma CNC, confirmou sua 16ª alta mensal, sendo alavancado única exclusivamente pelo consumidor com até dez salários mínimos de renda familiar e uma leve melhora no acesso ao crédito e disposição de adquirir bens duráveis. Já a Peic (Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor), que também é medida pela entidade, indicou o sexto declínio no nível de endividamento, que corresponde a 80,7% das famílias manauenses (ou 531.021). Mas, a inadimplência sofreu repique e subiu para 37,6% (247.184). 

Empregos e investimentos

Oito dos nove subcomponentes do indicador de confiança do comerciante derreteram em Manaus, sendo que cinco deles já estão no nível de insatisfação. A piora mais acentuada vem das percepções dos comerciantes sobre as condições atuais do setor (-13,6% e 74,6 pontos), da empresa (-10,4% e 94,3 pontos) e da economia brasileira (-8,3% e 66,3 pontos). Os estoques, que já eram fonte de insatisfação frequente nos levantamentos anteriores declinaram 6,9%, para 84,9 pontos, em sintonia com o nó logístico proporcionado pela vazante histórica. 

O pessimismo contaminou a visão de médio prazo, embora o patamar ainda seja de confiança, nesses casos. O ICEC aponta que outros decréscimos significativos no humor dos lojistas manauenses vieram das expetativas do comercio (-4% e 141,8 pontos), da economia brasileira (-3,9% e 131,8 pontos) e das empresas locais (-3,6% e 150,9 pontos). Mas, apenas o indicador de contratação de funcionários registrou uma tímida alta de 0,6% (126,9 pontos), enquanto o nível de investimentos dos lojistas sinaliza caiu 5,4% (97,2 pontos). 

A maioria dos varejistas locais passou a considerar que a economia “piorou muito” (38,5%), com aqueles que dizem que “piorou um pouco” (30,4%) logo atrás. Na outra ponta estão os que apontam que a economia “melhorou um pouco” (22,5%) e que “melhorou muito” (8,7%). A visão predominante dos empresários do comércio da capital amazonense a respeito do setor também passou a ser de piora extrema (32,7%), mas a estimativa média para as empresas ainda é de melhora relativa (34,3%). 

Apesar dos recuos, a pesquisa ainda mostra um panorama melhor para as expectativas de um futuro que teima em ficar longe. A avaliação geral é que a economia brasileira vai “melhorar muito” (41,5%) ou, ao menos, “melhorar um pouco” (29%). Os grupos de comerciantes que cravam que vai “piorar muito” (19%) ou que vai “piorar um pouco” (10,4%) ganharam mais adeptos. As projeções empresariais que pesam mais para o comércio e para os estabelecimentos também são de progressos mais significativos (43,3% e 47,8%, na ordem). 

Em sintonia com o novo e tímido aumento do subindicador de contratação de funcionários, a parte majoritária dos lojistas aponta que seus quadros devem “aumentar pouco” (48,8%). A parcela dos que dizem que pode “reduzir um pouco” caiu para 22,4%. Em contraste, as visões predominantes para o investimento são de ele que pode ser “um pouco menor” (31,4%) ou “um pouco maior” (27,8%). A situação dos estoques piorou e somente 57,7% dos comerciantes dizem que está “adequado”. Outros 27,8% informam que está acima do ideal – em função de vendas fracas – e 12,7% apontam que está abaixo dessa marca – em virtude da estiagem.

Estiagem e endividamento

O presidente em exercício da Fecomercio-AM, Aderson Frota, assinala que os números de Manaus caíram principalmente em função de todas as ocorrências em torno da seca, que dificultaram a vida do comerciante da capital. “O varejo e a indústria dependem muito da cabotagem. Precisaríamos de outras opções para superar essa dificuldade de ancoragem de navios na cidade. Mas, nosso rodofluvial só tem uma perna, que é a de Belém, subindo o Rio Amazonas. Essas dificuldades de tempo e custo são muito grandes. Estamos na expectativa de que esse quadro se reverta. Se tivermos uma recuperação do rio Madeira, teremos pelo menos um alívio”, ponderou.

Em texto divulgado pela assessoria de imprensa da CNC, o presidente da entidade, José Roberto Tadros, a retração registrada pelo ICEC nacional foi a mais intensa desde o começo do ano, e preocupa por ocorrer em um momento que antecede datas importantes para o comércio. “O setor sentiu a desaceleração da atividade econômica, tendo uma margem de lucro mais apertada, além de a alavancagem e a inadimplência empresarial estarem em níveis mais altos, o que desafia a gestão de caixa”, alertou.

No mesmo texto, a economista responsável pela análise da pesquisa, Izis Ferreira, cita dados do Banco Central e aponta que a inadimplência acima de 90 dias nas linhas de crédito com recursos livres das pessoas jurídicas cresce “de forma acelerada” desde a segunda metade de 2022 e já atingiu o maior percentual desde agosto de 2018. “Apesar do maior faturamento esperado nas festas de fim de ano, a desaceleração do varejo, com acirramento da gestão financeira das empresas, e um consumidor mais cauteloso, contribuem para que o comerciante entre no último trimestre com menos disposição para contratar e ampliar estoques”, concluiu.

Marco Dassori

É repórter do Jornal do Commercio

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