Não bastasse a série de sofrimentos que o coronavírus causa a boa parte de pessoas que o contraem, outra boa parte dessas pessoas, quando se vêem livre dele, ainda podem ficar com terríveis sequelas deixadas pelo inimigo mortal. É a denominada síndrome pós-covid-19, condição inflamatória difusa e multissistêmica associada a problemas no sistema nervoso central e músculo esquelético, que podem causar fadiga intensa, dor crônica, fraqueza muscular, dificuldade para respirar e déficits cognitivos, e levar meses para serem sanados. Para explicar melhor sobre como tratar a síndrome pós-covid-19, o Jornal do Commercio ouviu a fisioterapeuta Cláudia Simone Costa da Silva. Desde o surgimento da síndrome, logo após o fim dos primeiros casos da doença em Manaus, começaram a aparecer os primeiros pacientes com o problema em sua clínica Beleza Viva Personal Studio, @belezavivamanaus.
Jornal do Commercio: O que é a fisioterapia pós-covid?
Cláudia Simone: A fisioterapia contribui para evitar complicações cardiorrespiratórias e motoras em indivíduos hospitalizados, bem como recupera a funcionalidade, principalmente da capacidade pulmonar e aeróbica daqueles que tiveram a doença. Ainda não há estudos conclusivos sobre a extensão das sequelas da covid-19, porém, uma parcela significativa dos doentes recuperados continua necessitando de assistência fisioterapêutica após a alta hospitalar.
JC: Quais as sequelas mais comuns nos pacientes que a tem procurado?
CS: Redução da capacidade pulmonar, dores musculares e articulares, alterações neurológicas como perda de equilíbrio e sensibilidade, e fraqueza muscular generalizada com sensação de fadiga têm sido observadas mesmo entre os pacientes que não evoluíram para quadro críticos, evidenciando a necessidade de acompanhamento após a desospitalização. Nos casos mais graves, é possível que haja sequelas permanentes, como a fibrose pulmonar, uma doença crônica caracterizada pela formação de cicatrizes no tecido pulmonar.
JC: O tratamento é o mesmo para cada problema, ou existem vários tipos?
CS: O tratamento é feito após o fisioterapeuta realizar uma avaliação completa e elaborar um plano de tratamento individualizado e progressivo, com um olhar sobre a recuperação da funcionalidade do paciente, podendo ser feito de forma remota ou não, e sempre visando a recuperação da aptidão física, melhora da falta de ar, da fraqueza muscular, restabelecimento da massa muscular, incluindo músculos respiratórios.
JC: As sequelas têm cura, ou serão crônicas?
CS: Por se tratar de uma doença ainda pouco conhecida pela comunidade científica, alguns profissionais pontuam que não é possível determinar um prazo específico para a sua duração. Ainda não dá para afirmar o tempo de recuperação dos pacientes. Os idosos e portadores de doenças cardiovasculares e cerebrovasculares preexistentes, geralmente necessitam de uma reabilitação mais prolongada.
JC: Essas sequelas são características de pessoas que já tinham algum tipo de comorbidade, ou pessoas saudáveis podem ficar com elas, também?
CS: As sequelas podem surgir tanto em pacientes com comodidades quanto em pacientes saudáveis. Acompanhei o caso de um paciente jovem que teve miocardite associada à covid-19, seguida de uma insuficiência cardíaca. Tem paciente jovem, com nenhuma comorbidade, entre 30 e 40 anos que, quatro meses depois da doença, evoluiu para uma síndrome de cansaço crônico, fadiga e mal estar. Ainda há casos de pacientes que, cinco meses depois da contaminação, não recuperaram 100% do olfato. A depender do grau e do tempo que estas sequelas estão presentes, uma parte volta, outra não. Quem tem fibrose pulmonar e insuficiência cardíaca, não se recupera.
JC: O que causa essas sequelas, seria alguma lesão no sistema nervoso central?
CS: Já se tem mais clareza sobre como a doença se manifesta em órgãos como o coração, os pulmões e os rins. Mas hoje, passado o susto inicial da explosão de casos, o principal foco de dúvidas da medicina diz respeito às consequências para o sistema nervoso, que coordena o comportamento, as funções vitais, os reflexos e os movimentos. No mundo, há relatos de pacientes que, mesmo após a infecção, tiveram dores intensas de cabeça (cefaléia), epilepsia, complicações de AVE (Acidente Vascular Encefálico) e, em situações mais raras, síndrome de Guillain-Barré. Isso fora a perda do olfato e do paladar, bastante frequentes. O impacto do novo coronavírus no sistema nervoso é incerto. Alguns estudos para entender esses efeitos estão sendo realizados. Isso ainda é muito desconhecido.
JC: Qual o tempo de tratamento até o paciente ficar curado?
CS: O período para a reabilitação varia conforme o paciente. A ideia inicial da sessão de fisioterapia prevê 10, 20 ou 30 sessões, entre avaliação, atendimentos e reavaliação. Essas sessões podem ocorrer entre duas a três vezes na semana, de acordo com a disponibilidade do paciente. Precisamos respeitar a resposta do paciente, porque no início ele cansa muito fácil, tem fadiga. Pessoas com condições mais graves, como AVC, também demandam mais tempo.