Na próxima segunda-feira (3), a imprensa escrita amazonense tem dois motivos para lembrar. É o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa e os 170 anos da fundação do primeiro jornal do Amazonas, o ‘Cinco de Setembro’, cujo número 1 circulou nesta data, em 1851.
O ‘Cinco de Setembro’ pertencia ao tenente Manoel da Silva Ramos e o nome é uma homenagem à data de quando, em 1850, o Amazonas foi elevado à categoria de província, ou seja, passou a ser independente política e administrativamente do Pará.
Até onde se sabe, não existe mais nenhum exemplar de nenhuma das edições do ‘Cinco de Setembro’, mas é quase certo, conforme veremos adiante, que o seu tamanho era o de um tablóide, tinha duas folhas com quatro páginas impressas somente com letras, pois a utilização de ilustrações e fotos (estas, inventadas em 1839) ainda teria que aguardar por mais algumas décadas. Também a tiragem é desconhecida. Na época a população da Barra do Rio Negro (futura Manaus), era de aproximadamente quatro mil pessoas, e a maioria deveria ser analfabeta, porém, a minoria era bastante ativa, consumindo avidamente as notícias publicadas, afinal, imagine o quão era moderno para aquele tempo um jornal circulando pela cidade encravada em meio à densa e isolada floresta. Quem lia, repassava as notícias para quem não sabia ler.
Mas o nome ‘Cinco de Setembro’ não demorou muito no alto do impresso. Apenas oito meses e quatro dias depois, em 7 de janeiro de 1852, eis que o jornal de Silva Ramos mudou o nome para ‘A Estrella do Amazonas’.
Veio de Belém
A mudança de nome foi uma homenagem à província do Amazonas, instalada no dia 1º de janeiro daquele ano, e à posse do primeiro presidente, João Batista de Figueiredo Tenreiro Aranha.
Um único exemplar do número 1 do ‘A Estrella do Amazonas’ pertence ao acervo da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Como este jornal foi a continuação do ‘Cinco de Setembro’, conclui-se que aquele seguia os mesmos moldes do ‘A Estrella’, em tamanho, número de folhas e páginas, circulando às quartas-feiras.
Da mesma forma como os jornais de hoje, o ‘A Estrella’ era vendido, bem como também eram vendidas assinaturas e anúncios, conforme o aviso seguinte, em grafia da época, em destaque logo abaixo do título do jornal
“O ‘A Estrella do Amazonas’, publica-se todas as Quartas-feiras, e para Ella subscreve-se na sua typographia na rua Formoza caza nº __: o preço da assignatura he de 28 réis por trimestre, pagos no recebimento do 1º número de cada trimestre; as folhas avulsas custarão 200 réis; cada linha de avisos 100 réis, e sendo para assignante, até 20 linhas grátis, e d’ahi para cima 80 réis”.
A rua Formoza é hoje a Theodoreto Souto, no Centro.
Assim como o presidente Tenreiro Aranha, Silva Ramos era paraense e chegou à Barra do Rio Negro em princípios de 1851. Na capital paraense havia trabalhado na tipografia de Honório José dos Santos. Veio para Manaus a bordo de uma embarcação pertencente ao comerciante Henrique Antony, trazendo uma pequena tipografia, já com a intenção de rodar um jornal.
Apenas nome de rua
Tão logo chegou à cidade da Barra, Silva Ramos requereu a sua nomeação para fiscal da Câmara Municipal, juntamente com Manoel Vicente Barbosa de Oliveira e Raymundo Luiz de Souza. Naquele tempo o cargo de fiscal tinha grande importância, abrangendo relevante multiplicidade de atribuições. Em sessão da Câmara, de 3 de abril de 1851, sob a presidência de José Antônio de Oliveira Horta, foram lidos os três requerimentos e, depois, postos em discussão e votação, tendo sido o escolhido, Manoel da Silva Ramos, empossado no cargo no dia seguinte. Um mês depois ele fez circular o ‘Cinco de Setembro’ impresso na pequena tipografia que trouxera.
O jornal parece ter-lhe dado prestígio tanto que, em 16 de agosto daquele ano, foi nomeado procurador da Câmara, acumulando o cargo com o de fiscal. Como procurador, ficou até 29 de outubro.
Em 7 de janeiro o ‘Cinco de Setembro’ mudou de nome e um mês depois, em 6 de fevereiro, a presidência da Câmara criou a função de feitor, para dirigir os trabalhos mandados executar pela casa, e eis que Silva Ramos foi ocupar o cargo, ainda que não recebesse nada para tal
Em 3 de março de 1852 o paraense se demitiu do cargo de fiscal e, em 7 de janeiro de 1853 prestou juramento para exercer o cargo de 3º juiz de paz, eleito por grande maioria de votos. Em 7 de julho de 1854 Silva Ramos agora fazia juramento para vereador suplente.
Em princípio de 1857, passou a propriedade e direção do ‘A Estrella do Amazonas’ para seu irmão Francisco José da Silva Ramos e, em novembro daquele ano, assumiu a vara de juiz de paz da, então, Manaus. Ele ainda tinha a patente de tenente da Guarda Nacional.
Morreu dez anos depois de ter sido o pioneiro da imprensa escrita do Amazonas, em 4 de março de 1861. Uma rua do Centro o homenageia.
O primeiro editorial
A seguir, o primeiro editorial, em grafia da época, escrito por Silva Ramos para ‘A Estrella do Amazonas’.
“Havendo o patriotismo dos Representantes da Nação presenteado ao Povo Amazoniense com a lei nº 582 de 5 de Setembro de 1850, tomamol-a para título do nosso periódico; mas agora, que, com a posse do Exmo. Sr. Prezidente Aranha e a installação da Província, huma nova Estrella appareceu no Diadema Imperial, para, sem inveja das demais, enriquecel-o; entendemos dever mudar o título desta folha para o de – Estrella do Amazonas.
A nossa marcha será a mesma que até agora temos seguido; esforçando-nos quanto em nossas forças couber para tornar instructivas e úteis as publicações que fizermos.
Contamos com a coadjuvação dos bravos Amazonienses, e esperamos merecer a alta proteção do Exmo. Governo da Província, sem o que não poderemos continuar. Valha isto de prospecto, ou d’avizo”.
O Jornal do Commercio seria fundado 53 anos depois, em 2 de janeiro de 1904, por Joaquim Rocha dos Santos, outro pioneiro e visionário, e até hoje se mantém como o mais antigo, em circulação, na Amazônia.
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