A recuperação da BR-319 ainda hoje divide opiniões sobre a sua importância para alavancar a economia dos Estados que formam a Amazônia Ocidental (Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia). Nos últimos 30 anos, as obras de revitalização da estrada empacaram por conta de entraves ambientais que tramitam nas esferas judiciais e nos órgãos de licenciamento.
Até quando? De um lado, estão os ambientalistas sob argumentos de que a rodovia é uma grande ameaça ao ecossistema (flora e fauna), destruindo mananciais e impactando também na vida de populações, dependentes desses recursos naturais para sobreviver por onde a rodovia margeia ao longo dos seus mais de 800 quilômetros, cujos trechos estão destruídos e tomados praticamente pelo mato, sem as mínimas condições de tráfego.
No outro viés, estão os defensores do desenvolvimento, argumentando que a BR-319 é fundamental para interligar a Amazônia Ocidental ao resto do país. E daí viria mais intercâmbio comercial, social e econômico com os outros Estados, gerando mais empregos e renda à população.
O próprio superintendente da Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus), Algacir Polsin, reconhece ser a estrada uma logística imprescindível para impulsionar a competitividade dos produtos fabricados no Amazonas.
“O asfaltamento da BR-319 permitirá o fim do isolamento e a real integração da Amazônia Ocidental ao restante do país, facilitando o fluxo logístico para os brasileiros que aqui vivem e para o Polo Industrial de Manaus”, disse o superintendente durante o seu pronunciamento em comemoração aos 54 anos do projeto ZFM (Zona Franca de Manaus), na última quinta-feira (25).
Na ocasião, a 296ª Reunião do CAS (Conselho Administrativo da Suframa) abriu as comemorações do aniversário da autarquia. Na primeira deliberação de 2021, foram aprovados 32 projetos industriais e de serviços, totalizando aproximadamente R$ 1,8 bilhão em novos investimentos e a previsão de geração de 1.297 empregos nos três primeiros anos de funcionamento do PIM (Polo Industrial de Manaus), segundo cálculos da Suframa.
De acordo com o superintendente, esse eixo estratégico sobre a importância da logística de escoamento dos produtos made in ZFM ficou muito bem evidenciado durante a recente crise de falta de oxigênio no Amazonas. “Todos têm que entender que a BR-319 é vital, de extrema importância, para toda a Amazônia Ocidental”, acrescenta Algacir Polsin.
As obras de revitalização das vias de acesso ao Distrito Industrial são outra grande estratégia para melhorar a logística da ZFM. Os recursos empregados são da ordem de R$ 156 milhões -R$ 136 milhões da Suframa e R$ 20 milhões da Prefeitura de Manaus.
Garantias
Recuperar a BR-319 é um compromisso de campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), segundo o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas. Ele ressalta que a estrada é considerada uma prioridade nacional, muito estratégica, e será um modelo de desenvolvimento sustentável. E garantiu que o governo federal está engajado nesse projeto.
“O presidente Bolsonaro prometeu dar uma solução para a estrada e agora está fazendo isso, por dever e justiça. Não faz sentido termos uma capital da pujança de Manaus que não esteja conectada com o restante do Brasil”, afirmou ele.
Hoje, estão pavimentados os 198 quilômetros iniciais e os 164 quilômetros finais da BR-319. Os trechos recebem manutenção de empresas contratadas pelo Dnit.
As obras no lote C, que vai do km 198 ao km 250, incluem serviços de drenagem e recuperação de áreas degradadas, além de instalação de travessias aéreas e subterrâneas para mitigar os impactos à fauna local.
Segundo o Ministério da Infraestrutura, a recuperação não implica em aumento de capacidade da rodovia, respeitando acordos ambientais e decisões judiciais anteriores.
O governo federal esperava dar início às obras em 2021 após a elaboração dos projetos básico e executivo pela empresa vencedora da licitação. Com o licenciamento ambiental do trecho do ‘meio’ concluído, estima-se que até 2022 haverá frentes de trabalho em toda a extensão da BR-319.
Mas a situação adversa que veio com a pandemia inviabiliza agora qualquer tentativa de obras na estrada, o que só deve mesmo acontecer a partir do próximo ano, isso se houver um alívio na crise sanitária que mergulhou o país num dos momentos mais difíceis de sua história econômica e social.
Licitação
Recentemente, saiu a licitação para a recuperação do ‘trecho do meio’, entre os quilômetros 250 e 655 da rodovia. A medida foi publicada no “Diário Oficial da União” para a contratação de uma empresa que será responsável pela elaboração do PBA (Plano Básico Ambiental) da BR-319.
Segundo o edital divulgado pelo governo federal, o vencedor da concorrência terá que fazer ainda o inventário florestal, o projeto arqueológico, desenvolver estudos de malária, executar campanhas de fauna, além de “demais obrigações ambientais necessárias para a obtenção da licença de instalação e da ASV (Autorização de Supressão de Vegetação) da extensão da área a ser recuperada.
O senador Eduardo Braga (MDB-AM), um dos parlamentares da bancada do Amazonas envolvidos na mobilização para o asfaltamento da estrada, comemora a iniciativa. “O sonho começa a se tornar realidade. Tantos anos de luta, mas que agora começam a dar resultado”, ressalta a liderança política.
O parlamentar avalia que a BR-319 é extremamente importante para alavancar o desenvolvimento econômico do Amazonas e dos outros Estados que formam a Amazônia Ocidental, por onde a estrada se estende e interliga a região ao resto do país.
“Mais do que uma estrada é um caminho de vitória e esperança para o nosso Amazonas. Essa é uma conquista de todos nós”, acrescentou Braga na ocasião da divulgação da licitação para a recuperação do ‘trecho do meio’ da rodovia.
O acordo fechado entre o Dnit com o consórcio de empresas Tecon/Ardo/RC prevê a elaboração dos projetos básico e executivo de engenharia e a realização de obras para a reconstrução dos quilômetros situados entre o trecho licitado.
O edital estima investimentos de R$ 165,7 milhões para as obras que devem ser realizadas em 1.080 dias, segundo cálculos do Dnit. Recentemente, foi fechado um contrato para a pavimentação do lote ‘Charlie’, situado entre os quilômetros 198 e 250 da BR-319.
O investimento nas obras é altíssimo. Segundo dados estatísticos do ano passado, cada quilômetro de pavimentação da rodovia BR-319 custará R$ 3 milhões, em média, chegando por volta dos R$ 1,2 bilhão necessários para a conclusão dos 400 quilômetros da rodovia federal.
Gargalos
O consultor e economista Ailson Resende, que presta serviços a empresas instaladas na ZFM, atribui a fuga de novos investimentos estrangeiros no Estado a esses gargalos existentes na logística para o escoamento dos produtos da região.
“Muitas multinacionais acabaram investindo no Sul, Sudeste e até no Nordeste. As empresas têm mais vantagem. Uma carga despachada de manhã já chega à tarde em seu destino”, acrescenta o especialista.
Outros agravantes são as péssimas condições das estradas brasileiras. Em geral, as transportadoras elevam ainda mais os preços dos fretes com o tráfego em condições adversas, o que gera maior consumo de combustível pelas empresas. Muitas vezes, o caminhão com uma carga de contêiner pode demorar até um mês em época de chuvas torrenciais, o que não acontece pelas vias de cabotagem e aérea.
O vice-presidente da Fieam (Federação das Indústrias do Estado do Amazonas), Nelson Azevedo, também compartilha do mesmo argumento. “A falta de uma logística bem estruturada é o principal gargalo que tira muito a competitividade das empresas do PIM. Estamos muito distante dos grandes centros consumidores”, diz ele.
Apesar disso, Azevedo avalia que ainda é mais vantajoso produzir sob o regime de incentivos fiscais do parque industrial de Manaus, apesar dos entraves logísticos, uma novela tão antiga que ainda está longe de ter um desfecho favorável. “Aqui possuímos a mesma tecnologia de ponta encontrada nos países mais desenvolvidos. E esse é o grande trunfo da ZFM”, salienta o empresário e líder industrial.
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