Após três anos e meio de pandemia do novo coronavírus, dois indicadores econômicos devem permanecer no radar dos varejistas durante todo o ano de 2023: inflação e juros.
Cenário traçado por Fábio Bentes, economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio), revela um ano nada favorável aos negócios e ao consumo.
O ano começou com expectativa de alta da inflação. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), do IBGE, de trinta dias encerrado em 15 de janeiro, bateu em 0,55%.
Os setores que mais contribuíram para essa alta de preços foram comunicação (2,37%), saúde e cuidados pessoais (1,10%) e alimentos e bebidas, 0,55%.
“O processo de desaceleração de preços verificado no terceiro trimestre do ano passado ficou para trás. A inflação voltou, e em ritmo preocupante”, diz Bentes.
A alta de preços preocupa, de acordo com ele, porque tudo indica que o novo governo deve manter uma política fiscal expansionista, com menos compromissos com cortes de gastos.
“Isso faz com que as expectativas de inflação subam. Há seis semanas a projeção de inflação para este ano, que hoje está em 5,48%, está em alta”, diz.
Essa projeção está acima do teto, 4,75%, e do centro da meta, de 3,5%. “Há dois anos há descumprimento do teto e da meta de inflação”.
JUROS
Com inflação em alta, afirma ele, as expectativas para a taxa básica de juros (Selic), hoje de 13,75%, também são de alta.
A última projeção do Relatório Focus, que reúne estimativas do mercado financeiro, é de uma Selic de 12,5% para este ano.
“Com este cenário, um processo para estimular a economia por meio de crédito fica bem mais difícil, pelo menos na primeira metade deste ano”, afirma.
Como consequência, diz, o varejo brasileiro deve crescer menos de 1% neste ano, ou 0,8%, de acordo com a sua projeção.
Para o economista da CNC, a taxa de juros média para o consumidor, que hoje é de 59% ao ano, deve subir para 76% neste ano.
Hoje, a maior taxa de financiamento para o consumidor é cobrada no parcelamento do cartão de crédito, de 180% ao ano, segundo último dado do BC (Banco Central). “Uma dívida de R$ 1.000, com esta taxa de juros, sobe para R$ 2.800”, diz Bentes.
Nas modalidades de crédito pessoal, aquisição de veículos, e financiamento de outros bens, as taxas são de 44,5%, 27,7% e 78,9%, respectivamente, ao ano, de acordo com dados do BC.
INADIMPLÊNCIA
Com essas taxas de financiamento, Bentes recomenda que os lojistas prestem mais atenção nos atrasos de pagamentos dos clientes.
“Inflação e juros altos devem pressionar os indicadores de inadimplência”.
Em novembro do ano passado, a taxa média de inadimplência no país era de 5,9% nos atrasos acima de 90 dias, a maior taxa desde janeiro de 2017, de acordo com o BC.
Um mercado de trabalho em expansão, afirma Bentes, poderia contribuir para a melhora desse cenário. “Mas não podemos contar com isso em um ano em que a expectativa é de um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) menor do que 1%”.
Para a equipe econômica da CNC, a taxa de desemprego no país deve fechar 2022 em 9,5% e, neste ano, em 8,2%. “Portanto, não será um ano fácil”.
BOLSA FAMÍLIA
O Bolsa Família, recursos que o governo dará para as famílias mais pobres, na avaliação do economista, deve ter efeito limitado na economia. “Não são recursos capazes de fazer o consumo bombar”.
O economista da CNC recomenda aos lojistas adequar o mix de produtos, considerando um mercado de trabalho mais fraco e uma taxa de inadimplência mais pressionada.
“Na medida do possível, o melhor é depender menos de crédito na hora de vender e de comprar. Se precisar de recursos para capital de giro, é bom fazer pesquisa entre os bancos”.
O e-commerce, que foi a boia de salvação de muitos lojistas, especialmente durante a fase mais crítica da pandemia, diz, deve ser considerado por lojistas de todos os portes.
“O varejista deve continuar apostando no e-commerce, mesmo considerando o que aconteceu com a Lojas Americanas. Outros players devem assumir”.