14 de setembro de 2024

Lula pisa em ovos com pressão mundial sobre a Amazônia

A Amazônia ficou mais sob os holofotes da comunidade internacional após o assassinato de Dom Phillips e de Bruno Pereira, na região do Vale do Javari, no município de Atalaia do Norte (distante quase 1.150 quilômetros de Manaus). O jornalista e o indigenista foram emboscados e mortos. Tiveram ainda seus corpos desmembrados. E seus restos mortais foram enterrados na floresta.

Tanta barbárie, que aconteceu no ano passado, repercutiu mundialmente. Agora, a grave crise humanitária envolvendo índios Yanomami, em Roraima, deixa mais evidente o consenso de um suposto descaso do governo anterior com os povos originários da região, algo que frequentemente é alardeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Hoje, Lula está encurralado, pisando em ovos, e busca passar uma imagem de que o Brasil se volta para cumprir o compromisso em defesa do meio ambiente e das comunidades indígenas.

Mesmo desconfiados, países de primeiro mundo apostam em uma inversão do atual cenário negativo em relação a muitas etnias. E ainda pela falta de seriedade na preservação do mais rico bioma existente no planeta.

Logo no início do governo Lula, foi reativado o Fundo Amazônia, suspenso anteriormente sob a alegação de que não foram cumpridas medidas de proteção ambiental. São milhões de dólares que deixaram de ser enviados para a região. E outros alegam que esses recursos não são destinados quando chegam às mãos de lideranças envolvidas na defesa da biodiversidade.

Na semana passada, Lula foi convidado a sentar à mesa de negociação, condição fundamental para a manutenção de aportes financeiros a projetos de sustentabilidade na Amazônia brasileira.

Organizações internacionais como a Survival International cobraram ação emergencial para debelar a crise que atinge os Yonamami. A Human Rights Watch defendeu o restabelecimento do Estado de direito na Amazônia, protegendo diversas etnias que têm seus territórios invadidos pelo crime organizado.

Um texto divulgado pelo Survival International foi contundente. Acusou o governo do ex-presidente de Jair Bolsonaro (PL) pela grave situação enfrentada pelos índios em Roraima. “Ele desmantelou o serviço de saúde indígena, aplaudiu a expansão de garimpos em territórios indígenas e ignorou os apelos desesperados de organizações indígenas, da Survival e de muitos outros quando a escala da crise ficou clara”, afirma a publicação da Ong.

A organização também culpa ainda os garimpeiros pelo desastre. “A crise de saúde catastrófica e sem precedentes que envolve o povo Yanomami é um genocídio que estava em andamento há anos”, acrescenta o texto.

Porém, lideranças do governo venezuelano contestam essas afirmações, garantindo que os índios em situação de penúria em Roraima são originários da Venezuela, onde Yanomami também vivem, sendo uma responsabilidade daquele país vizinho

A Survival pediu, ainda, ao governo Lula a implementação urgente de uma lista de pontos para conter a crise, que incluem a expulsão dos garimpeiros, o envio de equipes médicas, a investigação sobre quem lucra com o garimpo ilegal, o combate ao narcotráfico e a proteção das terras indígenas.

Lula demonstra ser sensível à causa, assumindo compromissos com as entidades internacionais de lutar para inverter o cenário de guerra em Roraima, com idosos e crianças morrendo de doenças e desnutrição.

“Como meus governos anteriores, vou tratar os índios como eles merecem, dando uma efetiva assistência em todas as áreas, principalmente na saúde, protegendo ainda suas terras e combatendo o crime organizado”, disse o presidente diante da comunidade internacional.

Pressionado por países da Europa e pelos Estados Unidos, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que é uma obrigação do Brasil esclarecer o caso envolvendo a morte de Dom Phillips e de Bruno Pereira. E também de proteger o ambiente.

“Ainda falta darmos uma resposta com maior veracidade sobre uma barbárie que aconteceu na segunda maior reserva indígena do Brasil. E vamos fechar o cerco contra o crime organizado que se aproveita da pouca presença do poder público na região”, afirmou ele.

Divergências

O antropólogo Osnaldo Militão, que não esconde a sua preferência por Bolsonaro, disse que o atual governo investe em amealhar lucro político com o que considera um “alarde insensato e tendencioso” sobre a situação em Roraima.

“Muitos procuram bombardear cada vez mais o último governo. Essa esquerda que aí está só pretende queimar mais  a imagem de Bolsonaro. Na realidade, os índios sempre foram relegados a segundo plano em qualquer governo que ocupou o  Planalto”, contesta. “São comunistas que querem continuar roubando o erário público, enganando a população”, acrescenta o especialista.

Maior terra indígena do País, o território Yanomami foi demarcado em 1992 e fica nas florestas de Roraima e Amazonas, próximo à fronteira com a Venezuela.

A região virou terra dominada por garimpeiros a partir de 2016 – a Hutukara Associação Yanomami estima que existam atualmente 20 mil garimpeiros dentro da TI Yanomami agindo com financiamento do crime organizado e tráfico de drogas. Segundo a entidade, o garimpo cresceu 3.350% no local de 2016 a 2020.

O Ministério dos Povos Indígenas informou que 99 crianças yanomami, de idades entre um e quatro anos, morreram em 2022 em razão dos impactos do garimpo ilegal. As causas das mortes foram desnutrição, diarreia, pneumonia e outras doenças.

Segundo o MPF (Ministério Público Federal), mais da metade das crianças sofre de desnutrição, sendo que nas comunidades mais isoladas, esse índice chega a 80%. Em menos de dois anos, ocorreram 44 mil casos de malária no território Yanomami, que abriga 28 mil indígenas.

Marcelo Peres

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