Marco Dassori
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O varejo amazonense entrou no segundo semestre com o pé esquerdo, apesar das medidas federais de injeção extra e da redução dos tributos sobre os combustíveis. O setor encolheu 1,5%, na variação mensal dessazonalizada de julho, sendo este o terceiro resultado negativo seguido nesse tipo de comparação, embora o recuo tenha ficado menor do que o verificado em junho (-2,2%). O confronto com o mesmo mês de 2021 mostrou retrocesso pelo quarto mês consecutivo, com queda de 3,2% nas vendas. O setor ainda conseguiu se segurar no acumulado do ano (+3,1%), mas não no dos últimos 12 meses (-1,7%), a despeito da fraca base de comparação.
Os dados da média nacional (-1,4%, -0,3%, +1,4% e -0,9%, respectivamente) não foram melhores, sendo que a maior parte das unidades federativas ficou no vermelho. Em todo o país, nove dos dez segmentos do comércio entraram no campo negativo, puxados principalmente pelas divisões de tecido vestuário e calçados, assim como móveis e eletrodomésticos. Nem mesmo supermercados e drogarias conseguiram sustentar as vendas. Em sintonia com os cortes tributários federais e estaduais sobre a gasolina, a única alta veio do varejo de combustíveis e lubrificantes. Os números acenderam um sinal amarelo na CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) que revisou suas projeções do ano para baixo.
No Amazonas, em sintonia com o aumento dos juros e das taxas de endividamento, subsetores dependentes de crédito, como os de veículos, de autopeças e de material de construção, tiveram desempenho ainda pior e não conseguiram agregar crescimento ao volume global comercializado pelo varejo amazonense. A inflação, por outro lado, seguiu inflando artificialmente o faturamento das empresas, ao mesmo tempo em que contribuiu para inibir as vendas, inclusive de itens básicos ao consumidor. É o que revelam os dados da PMC (Pesquisa Mensal do Comércio), divulgada pelo IBGE, nesta quarta (14).
O varejo só conseguiu crescer em sete das 27 unidades federativas brasileiras, na variação mensal. Os melhores desempenhos vieram de Mato Grosso (+3,5%), Paraná (+1,7%) e Amapá (+1,5%). No extremo oposto, Bahia, Rio de Janeiro (ambos com -3,1%), Maranhão (-2,8%) e Distrito Federal (-2,5%) tiveram os piores números. Com o decréscimo renovado de 1,5%, o Amazonas caiu da 15ª para 16ª colocação, empatando com a Paraíba.
A despeito da retração de 3,2% em relação a julho de 2021, o Estado subiu do 24º para o 14º lugar do ranking nacional do IBGE, e empatou com o Piauí. Roraima (+10,1%) e Rondônia protagonizaram os vértices de uma lista com 20 quedas. No acumulado de janeiro a julho (+4,3%), o comércio amazonense subiu caiu da oitava para a nona colocação, em um rol iniciado pelo Mato Grosso (+6,2%) e encerrado por Pernambuco (-5,3%).
Receita e crédito
Vitaminada novamente pela inflação, a receita nominal foi melhor em todas as comparações de longo prazo. A queda na variação mensal de julho foi de 1,5%. Em relação ao mesmo mês do ano passado, houve elevação de 2,8%, a despeito do recuo efetivo das vendas. Os acumulados do ano (+10,9%) e dos últimos 12 meses (+7,8%) seguiram no azul e também foram mais generosos. O Amazonas ficou atrás da média nacional (-1,6%, +10,3%, +15,9% e +12,7%, na ordem) em praticamente todas as comparações.
Em todo o Brasil, o comércio foi depreciado em quase todas as atividades, entre junho e julho. As piores influências vieram de tecidos, vestuário e calçados (-17,1%), mas se disseminaram também nos segmentos de móveis e eletrodomésticos (-3%); livros, jornais, revistas e papelaria (-2%); equipamentos e material para escritório informática e comunicação (-1,5%); artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria (-1,4%); hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (-0,6%); e artigos de uso pessoal e doméstico (-0,5%). Apenas combustíveis e lubrificantes (+12,2%) cresceram.
Em razão do tamanho da amostragem, o IBGE ainda não segmenta o desempenho do comércio no Amazonas. Sabe-se apenas que, assim como ocorrido na média nacional, o varejo ampliado local, que inclui veículos e material de construção, teve desempenho ainda pior. Houve queda de 1% entre junho e julho, e tombo de 4,2% na variação anual. O acumulado do ano subiu 1,35%, mas a performance seguiu negativa em 12 meses (-3,4%).
O supervisor de disseminação de informações do IBGE-AM, Adjalma Nogueira Jaques, reforçou à reportagem do Jornal do Commercio que o comércio do Amazonas apresentou queda de vendas em quatro dos sete meses iniciais de 2022. O pesquisador salienta que esse não é um problema exclusivo do Amazonas, já que a maior parte dos Estados colheu números negativos, mas acrescenta que a pesquisa indica mais oscilações nos próximos meses, apesar da relativa recuperação do mercado de trabalho.
“As vendas do comércio ampliado sofreram quedas ainda mais acentuadas no mês, indicando que seus produtos tiverem suas vendas num patamar ainda menor. Os indicadores no ano e nos últimos 12 meses estão na descendente. Além disso, a média móvel trimestral também está negativa. Tudo isso colabora para que o cenário dos próximos meses não seja favorável. O otimismo fica por conta da melhora na taxa de desocupação que pode favorecer as vendas do comércio”, analisou.
“Passos lentos”
O presidente da assembleia geral da ACA (Associação Comercial do Estado do Amazonas), Ataliba David Antonio Filho, avalia que o recuo consecutivo experimentado pelo setor se deve especialmente ao “período conturbado” da política, que acabaria inibindo investimentos em um “quadro de incertezas”. “Além disso, nossa matriz rodoviária é dependente do diesel e essa pequena redução nos preços não gerou efeitos significativos. Acho que, pelo menos por mais dois meses seguidos, o mercado caminhará a passos lentos, até haver uma normalização do ambiente politico”, ponderou.
O presidente em exercício da Fecomercio-AM (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Amazonas), Aderson Frota, concorda que os dados retratam um “momento difícil” para a economia. “Aumento dos preços de commodities, de fretes e operações portuárias deflagraram esta crise. Isso obrigou o Banco Central a aumentar juros, acarretando em mais endividamento das famílias e negativação do consumidor. Mas, com a inflação em queda, aumento dos empregos e estabilidade da economia, me parece que em mais três ou quatro meses o comércio se recupera”, arrematou.
Boxe ou coordenada: CNC revisa crescimento do setor para baixo
O recuo no volume de vendas do varejo em praticamente todo o país fez a CNC revisar para baixo suas projeções para o desempenho do setor neste ano e já aguarda um crescimento de apenas 1,3% – e não mais de 1,7%. Em comunicado à imprensa, a entidade diz que espera que o consumidor sinta o “aperto monetário” no quarto trimestre, especialmente por conta do aumento da inflação.
A entidade ressalva, contudo, que o cenário de curto prazo segue positivo, com a retomada dos níveis de ocupação e a desaceleração da inflação. A CNC estima que os recursos oriundos da ampliação temporária do Auxílio Brasil têm potencial para impactar as vendas do setor em R$ 16,3 bilhões até o fim deste ano, que terá também “eventos extraordinários” com potencial de aquecimento, como a chegada do 5G e a Copa do Mundo.