O governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), divulgou, ontem, um vídeo nas redes sociais descartando a possibilidade de decretar ‘lockdown’ para prevenir uma possível segunda onda de Covid-19 no Estado. O anúncio veio em seguida à sugestão do prefeito de Manaus, Arthur Neto (PSDB|), de decretar a paralisação total das atividades econômicas devido ao aumento da pandemia de novo coronavírus no Estado.
“A pandemia ainda preocupa, mas o cenário atual não se compara ao quadro dos meses de abril e maio, quando o Estado viveu o pico da doença”, afirmou Wilson Lima. Segundo o governador, o Amazonas é hoje referência no combate à Covid-19.
“Nem passa pela minha cabeça a possibilidade de lockdown, de fechar tudo aqui. Fomos o primeiro Estado a liberar as aulas do ensino médio, e amanhã (hoje) nós estaremos retornando as aulas”, disse o governador.
Também em vídeo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criticou, na terça-feira (28), Arthur Neto que defendeu a decretação de ‘lockdown’ pelo governo do Amazonas para prevenir uma segunda onda de coronavírus.
“A gente vê agora absurdos. O prefeito de Manaus falando que está esperando uma sugestão do governador para decretar o lockdown. Cara, essa política já acabou”, protestou o presidente.
No vídeo, o presidente não esconde a sua indignação com a proposta de Arthur Neto e de outras lideranças nacionais que defendem medidas mais radicais para controlar a pandemia no País. “Eu falei lá embaixo que estava errada essa política. Está dando tudo certo o que eu falei, não tenho bola de cristal não, um pouco de raciocínio, um pouco disso tudo e coragem para decidir”, acrescentou Bolsonaro.
Na publicação, o governador Wilson Lima disse reconhecer o esforço do povo amazonense no combate ao novo coronavírus em parceria com as autoridades de saúde. Ele destacou a retomada segura das atividades econômicas e fez um apelo aos amazonenses para que mantenham os cuidados de prevenção contra a Covid-19, como uso de máscara e o respeito ao distanciamento social.
“O que nós temos é que olhar para a frente, é trabalhar para retomar, de forma segura, as atividades econômicas e voltar à normalidade de nossas vidas. Aí eu aproveito para fazer aqui um apelo àqueles que, por algum motivo ou alguma razão, relaxaram nas medidas. Meu amigo, faça sua parte, evita aglomerações, usa máscara, álcool em gel, toma todas as medidas para proteger você e a sua família”, afirma o governador.
Até o fechamento desta edição, a assessoria de Arthur Neto não havia enviado uma resposta do prefeito sobre as declarações do presidente Jair Bolsonaro. E também sobre a decisão do governador Wilson Lima.
Isolamento social funciona?
Com o aumento dos casos de Covid-19 devido a aglomerações, o governador do Estado decretou a suspensão do funcionamento, por 30 dias, de bares e casas de shows e outros eventos que reúnam grande número de pessoas na capital.
Segundo o prefeito Arthur Neto, o ‘lockdown’ é necessário para frear o avanço da pandemia no Estado, que começa a registrar um aumento nos novos casos de novo coronavírus. Nos últimos dois meses, a doença arrefeceu no Amazonas, mas voltou novamente a crescer.
Nos últimos boletins divulgados pelo consórcio nacional de imprensa, o Amazonas aparece no ranking dos Estados onde a pandemia de novo coronavírus vem se expandindo de novo. A expansão chegou a mais de 67%, com média de nove mortes por dia, segundo a publicação.
Para o presidente do CRM-AM (Conselho Regional de Medicina do Amazonas), José Bernardes Sobrinho, o isolamento social não funciona junto às classes menos favorecidas. E impedir que a atividade econômica paralise totalmente e proibir que as pessoas trabalhem, corram atrás da sobrevivência, é decretar “morrer de fome”.
“Como se isolar numa casa só de um cômodo, onde vivem dez pessoas ou mais. Se uma pega a doença, todos vão se contaminar”, diz o médico. Sobrinho ressalta que é praticamente impossível manter uma família só com o auxílio emergencial de R$ 600. E que a população de menor renda tem que buscar outras atividades para a sobrevivência básica – como o comércio informal que se vê nas ruas.
Ao contrário, ele ressalta que a população brasileira mais abastada pode ficar reclusa por meses e até anos porque não fará diferença. “Essas pessoas têm dinheiro e como se sustentar. E não vai faltar alimentos em casa, como acontece com os mais pobres”, salienta o médico.
O cientista Jesem Orellana, da Fundação Oswaldo Cruz-Fiocruz Amazônia, afirmou que o Amazonas já vive uma segunda onda de Covid-19. E que também é necessário um ‘lockdown’ para frear o avanço do novo coronavírus no Estado.
No início de agosto, Lucas Ferrante, doutorando do programa de Biologia (Ecologia) do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), também alertou que o Amazonas passaria pela segunda onda de coronavírus, em um artigo publicado na revista científica ‘Nature Medicine’.
“Avisamos sobre a segunda onda em Manaus desde o dia 7 de agosto. E apontamos inconsistências graves nos boletins diários da Fundação de Vigilância em Saúde. Fica clara nesse momento a necessidade de tomar medidas mais rígidas de isolamento social e também a suspensão das aulas presenciais”, disse Ferrante. Mas as autoridades de saúde do governo do Amazonas contestam esses dados dos dois cientistas, garantindo que a pandemia está controlada no Estado.