A obra do diplomata Gustavo Westmann, “Pela Democratização da Política Externa Brasileira”, publicada em 2023 pela Editora Contexto, emerge como uma reflexão oportuna, necessária e urgente sobre a inserção do Brasil no cenário internacional. A proposta central do autor é ampliar os horizontes dos instrumentos da política externa brasileira, promovendo uma maior inclusão de atores vis-à-vis a necessária democratização dos processos decisórios, isto é, observar a “política externa como política pública”.
Westmann contextualiza a política externa brasileira no quadro de uma ordem global em mutação. O autor destaca como o sistema internacional tem passado por profundas mudanças estruturais, caracterizadas pelo declínio da hegemonia unipolar dos Estados Unidos e pela ascensão de potências emergentes como China e Índia no mundo multipolar. Nesse contexto, o Brasil se encontra em uma posição estratégica, mas ainda enfrenta desafios para consolidar sua relevância no cenário internacional.
Fato é que “em um cenário ideal, sempre que é definida uma estratégia nacional, a política externa deveria assumir seus papéis, procurando mobilizar recursos externos para sua consecução, negociar apoio de outros países e da comunidade internacional aos objetivos acordados, e colocar o Brasil em processos internacionais que possam influenciar essa estratégia”. Na concepção do diplomata, compreender essas dinâmicas é essencial para reposicionar o país de forma mais assertiva no cenário global.
Um dos pilares da argumentação de Westmann é a conceituação da política externa como política pública. Para o autor, a condução da política externa não deve ser privilégio exclusivo de diplomatas e elites políticas insuladas nas engrenagens burocráticas do Estado brasileiro. Em vez disso, deve refletir os interesses da sociedade brasileira em toda a sua pluralidade, representatividade e contradições.
Nesse sentido, ele propõe a criação de mecanismos que ampliem substantivamente a participação popular e assegurem maior transparência nos processos decisórios, alinhando a agenda internacional do país com as demandas e prioridades da população.
Westmann argumenta que é imperativo incorporar novos atores políticos ao debate sobre a agenda internacional brasileira. Ele defende a inclusão das unidades subnacionais (estados e municípios), do setor empresarial, da academia, dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada no processo de monitoramento e formulação da política exterior.
Assim, é possível dizer, portanto, que “em uma era de democracia participativa, deliberativa e monitorada, a projeção externa do Brasil deve ser cada vez mais responsiva ao estabelecimento de padrões multissetoriais, ao engajamento não estatal em redes de políticas públicas, e ao monitoramento externo e independente. Isso inclui responsabilidades compartilhadas entre os setores público, privado e a sociedade civil, no desenvolvimento e na implementação da política externa”. Esse alargamento do leque de participantes, segundo o autor, traria maior legitimidade às decisões e fortaleceria a projeção internacional do Brasil.
No penúltimo capítulo, “Brasil, eterno país do futuro?”, o autor faz uma análise crítica do famoso clichê que há décadas acompanha a história nacional. Westmann explora como essa narrativa tem sido usada para justificar tanto otimismo exacerbado quanto inércia em relação às reformas necessárias para o país assumir definitivamente um papel mais protagonista no sistema internacional. Ele conclama a sociedade brasileira a superar essa mentalidade melancólica e a adotar uma postura mais enérgica e pragmática diante dos desafios nacionais e internacionais.
O livro culmina em uma agenda para a democratização da política externa. Westmann sugere a implementação de consultas públicas, audiências no Congresso Nacional e a criação de conselhos participativos como formas de democratizar os meios de ação da diplomacia brasileira. Ele também enfatiza a importância de educar a população sobre questões internacionais para fomentar um engajamento mais qualificado no debate público sobre relações internacionais e política externa brasileira.
“Pela Democratização da Política Externa Brasileira” é uma obra atual que desafia o status quo burocrático e propõe uma visão mais inclusiva e participativa para a diplomacia brasileira. Westmann não apenas diagnostica os problemas presentes, mas também oferece soluções concretas, tornando sua obra uma leitura indispensável para acadêmicos, políticos, empresários, ativistas, militares, diplomatas e todos aqueles interessados no presente e no futuro do Brasil no enigmático cenário internacional.
*é cientista político