Dr. Kaoru Ishikawa, referência mundial em qualidade, uma vez afirmou que ela começa e termina com a educação, então o artigo questiona o papel do cidadão, lembra o Dia Internacional da Educação, e lista causas que impedem o Brasil de ter uma Educação de Qualidade.
Provavelmente maioria acredita que a educação seja importante para o desenvolvimento de um país. Então como cidad(ã)o consciente, quando foi a última vez no trabalho, na universidade, na escola ou na sua comunidade, que estimulaste um debate sério sobre o Dia Internacional da Educação, celebrada ontem (24/01) pela ONU?
Se a resposta lhe traz orgulho, parabéns, continue assim, mas ao olhar ao nosso redor, há muita gente que, mesmo achando a Educação importante, não conhece a data comemorativa, nem faz nada de concreto para refletir com as demais pessoas sobre o assunto. Acreditar é muito cômodo, difícil é ajudar a coletividade a refletir, propor, acompanhar e cobrar das nossas autoridades, por políticas públicas eficazes para melhorar continuamente a qualidade da educação em nossa cidade, estado e país.
O Dia Internacional da Educação foi criado pela ONU em 03/12/18 e nesta página <https://bit.ly/3H2rIXo>, dedicada ao 24/01/23, a ONU nos lembra que a Educação deve ser priorizada para acelerar o progresso de todos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, em um cenário de recessão global, desigualdade crescente e crise climática.
Ela nos lembra que 1) Educação é um direito humano; 2) é a chave para o desenvolvimento sustentável; 3) 244 milhões de crianças e adolescentes no mundo estão fora das escolas; 4) 617 milhões de crianças e adolescentes não sabem ler nem fazer cálculos básicos de matemática etc.
Além disso, a Educação é a mola mestra para melhorar a produtividade, competitividade e qualidade de vida da população, com vários casos de sucesso envolvendo países que outrora tinham problemas com a pobreza, mas que hoje gozam de um padrão de vida acima da média global, tais como Arábia Saudita, Luxemburgo, Noruega, Brunei, Cingapura, Coreia do Sul, Irlanda, Japão, Suíça e Qatar. E se esses países conseguiram, por que nós não conseguimos evoluir positivamente? As respostas não são simples, mas começaria com essas causas, a saber:
1ª) as elites não priorizam a Educação
Desde quando Cabral chegou, já se foram 523 anos. Historicamente, tivemos 308 anos de completo apagão educacional, sem escolas, universidades, bibliotecas, livros para educar e emancipar os brasileiros, significando 59% de nosso tempo jogado fora. E esse desperdício intelectual não foi acidental, foi intencional, praticado tanto pela elite portuguesa quanto pela brasileira, que na época esteve a serviço de maximizar os lucros para a coroa.
Ao ler os Capítulos 22 e 23 do livro “História da Riqueza no Brasil <https://bit.ly/3GRbDnq>, o autor, Dr. Caldeira, aborda sobre a escassez de letrados no Brasil por mais de três séculos, como resultante de uma política metropolitana de associar a proibição de impressoras e de escolas superiores, impedindo que brasileiros conhecessem a si mesmos e avaliassem o seu potencial depois da descoberta do ouro. Como resultado, o autor aponta que, em 1800, entre 1% a 2% dos brasileiros sabiam ler, enquanto que nos EUA, esse % chegava a 70% da população adulta masculina.
Apesar dos avanços obtidos desde a chegada de João VI, em 1808, ainda sofremos com elites que chegam ao poder, não para fazer uma verdadeira revolução qualitativa na forma de governar, mas para tirar o maior proveito do Estado, e isso não tem ideologia, bastando olhar os estragos das últimas administrações.
2ª) Má administração pública
Um dos princípios da boa administração é colocar as pessoas certas no lugar certo, priorizando a educação e experiência comprovados ao longo do tempo. E o que temos visto, por exemplo, na maior pasta que comanda a educação, o MEC, é que esse princípio não é praticado, gerando falta de oportunidade para as mulheres talentosas, para os concursados competentes, bem como alta rotatividade, excesso de disfunções burocráticas, descontinuidade, ineficiência, confusão etc.
Para ilustrar, fiz um estudo envolvendo o perfil de cada ministro do MEC nomeado pelos presidentes nos últimos 37 anos, desde 15/03/85 até 31/12/22, e aqui <https://bit.ly/3QWIOum> há a planilha com os dados, as fontes e os resultados comentados abaixo:
2.1) Não há tratamento justo entre homens e mulheres. equidade de gênero, para liderar o MEC, refletindo uma elite extremamente machista, seja ela da esquerda, centro ou direita. Todos os ministros são homens! Se formos até a Era Vargas, apenas uma mulher assumiu o MEC, a professora e advogada Esther Ferraz, por 934 dias, durante o governo do João Figueredo.
2.2) profissionais concursados que possuem boa educação e ampla experiência no MEC, são ignorados, pois o cargo é entregue para pessoas de fora. Além disso, 46% dos que comandaram a pasta são políticos aliados do presidente de plantão.
2.3) Nenhum indicado tem graduação em Educação. E 42% dos Ministros não tinham experiência sólida em gerenciar uma organização educacional.
2.4 Há alta rotatividade no MEC, pois em 37 anos, já foram 26 ministros, enquanto no mesmo período, foram apenas seis na Arábia Saudita, oito em Brunei, onze em Cingapura, e catorze nos EUA.
Os governos com menos rotatividade foram a 1ª e 2ª administração de FHC, tendo como Ministro o Dr. Paulo Renato Souza, com 2992 dias a frente do MEC, bem como o 2º Governo Lula, tendo Dr. Haddad. Por outro lado, os piores foram o 2º governo de Dilma/Temer com sete ministros, trocados em média a cada 243 dias, bem como o de Bolsonaro, com cinco ministros trocados em média a cada 288 dias, com o militar Carlos Decotelli, sendo o Ministro com o menor tempo (6 dias) no MEC.
3ª) Alta corrupção e impunidade
O setor educacional sofre de casos de corrupção, deste a simples cola, até fraudes acadêmicas, TCCs, Dissertações ou Teses com alto índice de plágio, com autoridades nomeadas mentindo em seus currículos. Licitações viciadas para favorecer os governantes, obras superfaturadas, ressaltando casos de irregularidades envolvendo construção de creches com recursos do FNDE. Esquema que fecha escolas que funcionam em imóveis alugados com valores baixos, para que seu código seja transferido para um prédio com aluguel muito mais caro, a partir de um contrato milionário de longo prazo, assinado sem licitação. Professores ou funcionários “fantasmas” que recebem sem trabalhar etc. Essas práticas se perpetuam sem a devida punição, a partir da nomeação de profissionais políticos em cargos chaves, ora para advogar, blindar ou para desviar recursos do erário.
Infelizmente, a educação pública com qualidade em nosso país é uma utopia, só acontecerá quando tivermos lideranças com visão de futuro e efetivamente preocupadas em emancipar a população, a partir de boas práticas de gestão, transparência, valorização dos professores, bem como forte combate à corrupção e à impunidade.