Sobre a guerra, a silvinita, a economia e soberania

Em: 5 de março de 2022

A guerra entre Rússia e Ucrânia trouxe à baila questões muito importantes, como a garantia do princípio internacional de soberania das nações -que está sendo desrespeitado -, os direitos humanos  da população civil ucraniana -e também dos refugiados -e as sequelas advindas das medidas econômicas de retaliação  ao país agressor.

Nos aspectos econômicos tem se destacado a vulnerabilidade energética de diversos países europeus, com destaque para a Alemanha, quanto ao fornecimento de petróleo e, principalmente, de gás oriundo da Rússia. No caso, os países europeus tendem a enfrentar uma grave crise de energia se o conflito perdurar muito tempo, dentre outros efeitos negativos que os boicotes, inclusive do sistema de pagamentos interbancários, podem causar, não somente para Europa, mas para países de outros continentes, inclusive na América Latina.

No caso do Brasil, a mais grave ameaça está centrada no provável impedimento de importação da Rússia e da Bielorrússia, de fertilizantes fundamentais para o agronegócio, com destaque para o potássio. 

Pode-se dizer –sem medo de errar –que a atual gestão federal piorou o que já era muito ruim nos governos anteriores; todos desprezaram o imenso potencial de produção de fertilizantes em território nacional. A situação específica de dependência do fosfato tende a ser amenizada com novos investimentos empresariais, como a exploração de um grande veio mineral no Rio Grande do Sul. Mas o nitrogênio e o potássio, continuam, como se diz popularmente, a “ver navios”, no caso estrangeiros, lotados de fertilizantes importados, com evasão de divisas e de empregos que poderiam e deveriam ser gerados no nosso país. Reitere-se que a visão privatista da Petrobras, que iniciou no governo Temer e se ampliou na gestão do atual presidente, é responsável pela diminuição da produção dos fertilizantes à base de nitrogênio. Nesse sentido, o atual governo fechou a Fafen, no Paraná, e não concluiu uma outra planta já iniciada no Mato Grosso do Sul, fazendo com que aumentasse ainda mais nossa dependência do nitrogênio oriundo do exterior. 

Já no caso do potássio trata-se de mais uma triste faceta de um país “que dorme em berço esplêndido”, porque uma imensa jazida inexplorada se encontra no subsolo do Estado do Amazonas, se estendendo desde o município de Autazes até Borba! Somente essa jazida, se devidamente explorada, poderá suprir mais de 50% das necessidades de potássio do Brasil! A Petrobras dormitou décadas em cima dessa riqueza, sem o devido interesse estratégico de explorar a silvinita e produzir potássio no nosso Estado, apesar de ter ciência do imenso potencial e de possuir uma área para a produção deste minério, a “Fazendinha”, situada em Autazes. O governo federal, por sucessivas administrações, que perpassaram inclusive os governos do PT, não se interessou por viabilizar a exploração da silvinita no Amazonas e até dificultou as tentativas da iniciativa privada de fazê-lo. Ainda em 2008,  a empresa canadense que pleiteava a exploração de silvinita foi impedida de iniciar os investimentos por conta de óbices do governo federal para que a iniciativa privada fizesse o que o próprio governo, por meio da Petrobras, deixou de fazer. No caso, financiamentos do BNDES para investimentos em infraestrutura de outros países foram priorizados, em detrimento de investimentos prioritários no nosso próprio país.

Interessante destacar a lentidão do processo de licenciamento da exploração da área que a Potássio do Amazonas adquiriu em Autazes. Este licenciamento depende de consulta pública com os indígenas que residem no entorno da sua propriedade, conforme estipulado em convenção internacional da OIT, da qual o país é signatário. E isso vem se arrastando há anos, o que pode e deve ser agilizado, com o devido acompanhamento do Ministério Público Federal. Já está mais do que na hora de viabilizar esta consulta e garantir a exploração da silvinita em Autazes, bem como a agilização do mesmo processo na região de Silves/Itapiranga/Itacoatiara. Outrossim, é oportuno destacar que é inverídica a afirmativa presidencial de que é necessária liberar a mineração em terras indígenas para viabilizar a produção de potássio, pois a maior parte deste minério se encontra fora de reservas indígenas. A consulta a estas populações é apenas um requisito legal a ser cumprido, não um impedimento. Cabe o bom senso de todas as partes envolvidas, para que se viabilize uma grande produção de silvinita e, consequentemente de potássio, no nosso país… Lembrando que há um horizonte de 5 anos de efetivo investimento exploratório para que a produção de potássio se torne realidade. Ou seja, ainda teremos de “amargar” por vários anos nossa excessiva dependência de importação deste insumo, buscando alternativas imediatas no Canadá e outros países, para suprir as necessidades do agronegócio e boa parte da agricultura familiar e evitar o colapso produtivo. 

Destaque-se a absurda posição de dependência externa do Brasil -grande exportador de produtos agrícolas -dos fertilizantes importados, pois só produzimos cerca de 15% da necessidade do país! A falta de visão estratégica de sucessivos governos federais, inclusive o atual, nos levou a esta lamentável situação de dependência externa, num segmento tão importante da economia, responsável por alimentar os brasileiros e ainda gerar divisas para nosso país. O mais triste é que não faltaram falácias e justificativas ideológicas para esta terrível omissão, fossem de governos autointitulados de esquerda, de centro ou de direita. O fato é a falta de verdadeiro patriotismo, que compromete nossa própria economia e a soberania do Brasil. 

É indispensável que os brasileiros percebam a tempo que tanto visões estadistas quanto visões privatistas não geram resultados efetivos para nosso país, se o primado não for da ética do bem coletivo, da valorização dos nossos ativos, da geração de emprego e renda e da proteção dos interesses nacionais. É indispensável mudar. Com  fé, coragem e esperança, é possível!

Luiz Castro

Advogado, professor e consultor
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