No topo do Monte Roraima

Em: 18 de janeiro de 2024

No dia 10 encerramos a matéria ‘No rastro de Macunaíma’ com o engenheiro civil Leandro Cesar Pereira partindo de Manaus rumo ao Monte Roraima e ele, que faz essas viagens pelos locais mais inóspitos da América do Sul há uns 20 anos jamais imaginou que essa seria uma de suas maiores e mais difíceis aventuras.

“Levei dois dias de Manaus até Pacaraima, em Roraima, cidade que fica na fronteira com a Venezuela. De lá segui por 90 km numa estrada de asfalto e mais 23 km de pista muito ruim até chegar a Paraitepuy, um vilarejo bem pequeno onde vivem cerca de 400 pessoas, nas proximidades do Monte Roraima. São indígenas, que habitam aquela região há séculos, mas eles não gostam de ser chamados de indígenas. Preferem que os chamemos de nativos. Lá eu deixei minha moto”, contou.

Entre os habitantes de Paraitepuy muitos se especializaram em ser guias para levar os interessados até o alto do Monte Roraima.

“Fui em busca do mais experiente, o Sr. Otílio, um simpático velhinho 1,5 ano mais novo do que eu. Os guias cobram R$ 200 por dia. Quando disse para o Sr. Otílio a quantidade de coisas que pretendia levar na subida, ele indagou: tu é doido, é? Só depois entendi seu espanto. No primeiro dia, saímos cedinho para uma caminhada de 10 km subindo e descendo montanhas, e atravessando riachos. Cheguei ao primeiro ponto base exausto”, lembrou.

“No segundo dia tinha bolhas nos pés e tive que enfrentar um trecho de 18 km com subidas fortes e Sol escaldante. Mesmo bebendo muita água, comecei a ficar desidratado. Cheguei ao segundo ponto base dizendo: não vou conseguir”, falou.

Pouco a pouco

“O terceiro dia foi o pior de todos. 5 km de subida extremamente íngreme, utilizando mãos e pés com muito equilíbrio. Falei ao Sr. Otílio que não iria conseguir e ele apenas respondeu: pouco a pouco. Entendi o seu recado. Botei as mãos pro céu e agradeci a Deus por ter chegado até ali, depois encostei as mãos no imenso paredão do Monte Roraima. Meus pés estavam arrebentados, todos os meus músculos e tendões doíam, mas passo a passo ia seguindo no rumo do topo. Ficava lembrando nos dois dias em que atravessava a BR-319 e se eu conseguir lá, conseguiria aqui”, revelou.

No quarto dia, finalmente o topo. Pelo seu conhecimento em rochas, Leandro deduziu que o Monte Roraima está ali, intacto, há milhões de anos somente sofrendo ação das chuvas, do Sol, do frio e do vento. Lá no alto existem vários pontos com vistas fantásticas. E o topo não é plano, como aparece nas fotos composto por rochas irregulares e sedimentares. Existe ainda, próximo, o Monte Maverick.

“Depois de três dias tomei um banho, no que eles chamam de jacuzzi, depois armamos a barraca dentro dos ‘hotéis’, cavernas pequenas, médias e grandes, que eu notei serem de formação recente, pois não possuem estalagmites e estalactites. Ficamos lá em cima por um dia e duas noites, e andei por vários pontos existentes no topo do Monte”, informou.        

No quinto dia, o retorno, 23 km.

“No sexto dia já estava sem força e resistência. Vinha praticamente me arrastando. Estava com muita fome, pois nessa jornada levara apenas dois pacotes de Sucrilhos, quatro latas de sardinhas, três laranjas, cinco maçãs, um saquinho de nozes, um pacote de bolachas recheadas, doze bananas e seis chocolates”, listou.

Não subiria novamente

De volta a Paraitepuy o imenso cansaço de Leandro se misturou à conquista de seu objetivo.

“O Sr. Otílio me convidou para almoçar com ele e o agradeci bastante pelo seu conselho do ‘pouco a pouco’, que me valeu muito e ele nunca reclamou dos diversos pedidos de paradas para descanso que eu fiz ao longo da jornada. Deixo aqui um singelo conselho: se programe, treine, se prepare para os desafios que desejar enfrentar e saiba que sempre haverá pessoas que te ajudarão a chegar ao topo”, ensinou.

Leandro notou que em toda a trilha até chegar ao topo do Monte Roraima não há lixo de tipo algum. Os nativos recolhem qualquer material que tenha sido deixado pelos turistas, que também são orientados a não deixar resíduos sólidos na região. Há ainda os guardas-parque que vigiam tudo e todos.

“Já sofri muito em viagens por BRs, como a 230 (Transamazônica) e a 319, mas nunca enfrentei tamanha dificuldade física como na subida ao Monte Roraima. Essa aventura foi além do esperado. Sinceramente, não subiria novamente o Monte. Foi muito prazerosa a conquista, mas o sofrimento foi imenso e me mostrou o quanto somos pequenos quando nos vemos diante daquela imensidão de rocha com milhões de anos”, finalizou.

Na publicação dessa matéria Leandro já terá passado por Manaus, atravessado a BR-319 e estará a caminho de Brusque para acrescentar mais uma viagem ao seu currículo de aventureiro.

***

Evaldo Ferreira

é repórter do Jornal do Commercio
Pesquisar