Dos inúmeros textos publicados por conta da noite natalina, escolhemos este intitulado “Os nove convidados do Natal” da autoria de Leandro Karnal publicado no livro “O Mundo Como Eu Vejo”, a saber. A maior festa do Ocidente é o Natal e as pessoas adoram o príodo mesmo não sendo religiosas. Há os que ficam deprimidos e apresentam até raiva diante da festa. São os que mais sofrem pois sua ira é de uma falta, uma resistência que move o mundo inerior. Cheguei a encontrar uma pessoa que, toda noite no dia 24 de dezembro, ia até o túmulo da mãe e ficava sobre ele. Disse-lhe: das pessoas que conheço, você é a que mais valoriza o Natal. Nunca conheci alguém indiferente. A data de hoje é como o anúncio dos Borge em Star Trek: resistir é inútil …
O Natal envolve nove personagens. Cada uma tem um significado nos presépios de nossos lares. A primeira é o aniversariante, causa da festa. É um menino e, como toda criança, tem o dever de zerar o mau humor e restaurar a esperança. Sim, você adulto comom eu, tem o direito ao azedume e ao descrédito. Nossa biografia nossos erros possibilitam a consciência de que não valemos a pena mesmo. Crianças surgem como tábula rasa, um novo caderno aguardando a escrita. O menino da Manjedoura, como toda criança, proclama que o mundo recomeça com ele
A segunda personagem é Maria, mãe e muher. Jovem adolescente ainda , vive o incômodo de uma gestação, pouco dinheiro, acomodação improvisada e ter de cumprir uma ordem governamental sobre um resseamento. Para teólogos, crendo ela gerou quem a criou. Para outros, é o mais próximo que teremos do amor incondicional: a mãe que aposta em carregar um ser por nove e meses e fazer o milagre do nascimento. A esperança é o menimo e o amor extraordinário é a mulher-mãe. Todos fomos bebês; algumas foram mães, qualquer um pode volltar a ter esperança.
A terceira personagem é José, o carpinteiro. Sente-se protetor de um mistério que transcende e o excede. Aceita a gravidez sem causa como aceitará o exílio com a pequena e sagrada família. Traz o trabaho, a proteção, a misão de apoio e a vocação de entgega. É homem capaz de ouvir a intuição de sonhos. Aceita ser testemunha e controlar a vaidade. Como cantava Georges Moustaki, foi você, José, quem escolheu Maria e seu filho de tão estranhas ideias.
A quarta personagem é, na realidade, um grupo de gente simples: pastores. Interrompem o trabalho e fazem uma pausa teológica. São os primeiros a saber do primeiro Natal. São pobres testemunhas. Receberam uma mensagem da quinta personagem: o grupo de anjos que proclama glória a Deus nas alturas e paz na Terra para os homens de boa vontade. A Biblia desconfia um pouco dos agricultores e exalta pastores, desde Caim e Abel. No topo dos seres criados e na base da pirâmide social há alegria pelo ocorrido. Do mais alto ao mais baixo, o mistério do Deus-menino exalta a noitr fria e significativa. A manjedoura celebra a vida e integra seres humanos e mensageiros divinos.
A sexta personagem simboliza a humanidade. São sábios, magos, posteriormente tornados três reis. Na tradição medieval, um é branco, outro negro e o terceiro parece mais oriental. Grão Vasco, no começo do século XVI, pôs um índio no lugar deste ùltimo. Traduzem a boa-nova para todos, a novidade de um Salvador. Carregam três presentes simbólicos para o menino e para nós: ouro porque ele e nós podemos ser reis; mirra porque todos morreremos e este é o produto para acompanhar o defunto. Por fim, trazem insenso porque o menino é Deus. Baltazar, Melquior e Gaspar são nossos procuradores. A epifania humana é divina.
A sétima personagem é outro grupo. Nada falam, apenas aquecem o infante. S;ão vacas e burros próximos ao berço improvisado. Também há ovelhas trazidas pelo grupo da quarta personagem. Depois despontam camelos, dromedários, associados à viagem dos sábios reis. São convidados úteis e silenciosos. Integram a natureza e os animais à noite que Jesus escolheu, Foram criados antes dos homens e existem há mais tempo. Toda a vida celebra a vida.
A oitava personagem é má. Representa o poder ressentido, o medo corrupto e invejoso. Trata-se de Herodes, que não se aproxima da cena, mas ronda o presépio. O puro amor de Jesus, Maria e José, a simplicidade dos pastores, a humildade angelical, a busca de sabedoria dos magos e a ação generosa dos animais devem encontrar o plano político e a violência. Como hoje, o Estado corrupto mata crianças e só se preocupa consigo. Os primeiros a morrerem por Jesus serão os santos inocentes assassinados pelo medo do tirano.
A nona personagem é das mais interessasntes. Quando você olha um quadro como a Adoração dos Magos, de Leonardo da Vince ou quando visita o extraordinário presépio napolitano do Museu de Arte Sacra de São Paulo, ela está lá, a personagem não retratada: nós. Somos a testemunha invisível da cena descrita em Lucas. Somos a plateia-alvo da cena e da missão do menino. Somos a nona personagem que pode aprender com José, com Maria ou até com Herodes. Podemos ter a humildade do menino sobre a palha ou a maldade dos soldados executando inocentes. Somos parte do drama e temos escolha sempre.
Hoje terei o primeiro Natal sem minha mãe. Foi ela que me ensinou o amor à festa. Passo adiante o que recebi com tanta generosidade. Boas Festas para todos os filhos e para todas as mães e que, ao menos nesta noite feliz, haja paz na Terra. Como eu disse no ano passado, ningúem é obrigado a ser feliz hoje. Igualmente, ninguém é obrigado a ficar deprimido. Que as crianças nos eduquem e nos permitam ter esperança. Feliz Natal!
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É advogado (OAB/AM 436). Cursou Direito, Comunicação Social (Jornalismo), Contabilidade, Oratória, Lecionou História, Articulista. Contato @jackmonthadvogados.com.br.
